Em "Às Favas com os Escrúpulos", dramaturgo narra ruína de um senador

Inspiração para o texto foi o romance entre Zélia Cardoso de Mello e ex-ministro da Justiça durante o governo Fernando Collor

GUSTAVO FIORATTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Não é só o título "Às Favas com os Escrúpulos" que assume um tom de desabafo. Escrita por Juca de Oliveira e dirigida por Jô Soares, a montagem, que estréia amanhã no teatro Raul Cortez, discute a falta de ética que "dá no saco" do autor, como ele mesmo diz. Juca também integra o elenco da peça, ao lado de Bibi Ferreira, retomando sua velha fórmula de tratar assuntos políticos com humor popular.
"O riso é uma armadilha na qual você apreende o espectador", diz Juca, ao explicar suas estratégias para abordar a falta de valores morais entre brasileiros de toda espécie, mas principalmente entre políticos.
Assunto de sua preferência, o universo de deputados, senadores e presidentes já foi pauta de outros textos seus, como "A Flor do Meu Bem Querer" e "Caixa Dois".
"Os escritores escrevem sobre coisas que os chateiam, e o problema da falta de ética no Brasil é o que me cansa", diz.
"Será que um dia vamos ter de mandar os escrúpulos às favas, de verdade?"
Quem verbaliza esse mesmo desabafo, na peça, é a mulher de um senador interpretado por Juca, Lucila (Bibi Ferreira), que pensa viver ao lado de um homem íntegro. A personagem se dá conta de que está errada ao descobrir que o marido mantém relações com uma secretária de seu gabinete (Adriane Galisteu). Seu neto, espécie de hacker, ajuda a desvendar outros mistérios. Em clima de thriller, a investigação vai resultar em outras descobertas.
Como de costume, Juca escreve uma trama com referências claras ao mundo político estampado nos jornais. Desta vez, a história, encomendada por Bibi, veio "num estalo": "Minha inspiração foi aquele episódio da revelação do namoro da [ex-ministra da Fazenda] Zélia Cardoso de Mello com o [ex-ministro da Justiça] Bernardo Cabral", conta Juca. O romance entre os ministros, com Collor na Presidência, veio à tona depois de um baile, cujos convidados presenciaram uma calorosa dança do casal ao som de "Besame Mucho".
Para dar ritmo à história, Jô Soares entra com a mão de um "diretor totalmente influenciado pelo cinema", segundo palavras do próprio. "Muitos objetos em cena, cortes rápidos e mesmo as trocas dos seis cenários dão uma agilidade à peça que é mais comum ver na telona", conta.