São Paulo, sábado, 17 de julho de 2004

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"GALERIA METRÓPOLE"

Espetáculo reivindica respeito e apoio a sonhos e desejos

SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"Galeria" Metrópole é peça com uma causa: é essa sua força e sua fraqueza. Terceira peça a integrar o projeto da Cia. Casa da Comédia "Painel de Histórias Não Oficiais de São Paulo", endossado oficialmente pela Lei do Fomento, busca resgatar com orgulho a memória de um ponto de referência gay da cidade.
À medida que a causa gay vem sendo assimilada com crescente naturalidade, é interessante constatar como as "gays plays", subgênero que também se instituiu com o movimento, começam a se diversificar.
Ao lado da idéia de transgressão, de desafio à moral estabelecida pela opção sexual majoritária, que pode atingir alto vôo poético nos textos de Newton Moreno, por exemplo; e do homossexualismo como apenas um detalhe em uma história de amor para todos os públicos, como em "Norma", de Tônio Carvalho, Mario Viana aborda a questão por um viés importante e inovador: o direito do gay enquanto cidadão.
Na trama, Afonso, o tio sexagenário há muitos anos expulso da família por sua opção gay, tem um encontro com sua sobrinha Lúcia, que acaba de ser expulsa pela mesma razão e que quer lhe apresentar sua namorada.
A peça consegue romper o maniqueísmo gays oprimidos versus heterossexuais opressores em muitos momentos. Temperando o tema principal, há o choque entre gerações: o gay sexagenário acha vulgar se assumir; revela igualmente um preconceito contra o homossexualismo feminino, ilustrando o fato incômodo de que pertencer a uma minoria não garante a solidariedade a outras.
A trama, no entanto, cedo demais ganha um foco único: Lúcia convida seu tio para a Parada Gay, este reluta, e nesse conflito se perde toda a hora do almoço. A unidade de tempo e espaço é quebrada por flashbacks, mas também por dois fantasmas, em realismo fantástico: Nenzinho, o companheiro de vida toda, e Renato, o grande amor de sua vida.
A insistência nos mesmos efeitos acaba condenando o diretor Paulo Capovilla a uma repetição de marcas: Nenzinho sai e volta toda vez que é mencionado, Lúcia se levanta para argumentos inflamados, para voltar ao banco e colher uma confidência do tio, e luz e cenário podem apenas correr atrás para dar conta dos recortes.
Rubens de Falco empresta todo seu carisma e técnica para tornar Afonso tocante em suas contradições. Rosaly Papadopol, que faz Lúcia, e sobretudo Priscilla Carvalho, sua namorada, sucumbem no entanto ao tom unívoco, na difícil tarefa de ser porta-voz do autor. Fernando Neves, no contraponto cômico, cede muitas vezes a um caricato contraproducente à causa do espetáculo.
A peça estreou às vésperas da Parada Gay e chegou, na primeira semana, a fazer sessões extras. Tendo passado o evento, com o enorme sucesso que se sabe, pode se ter a impressão que é um panfleto bem distribuído, que cumpriu sua função. No entanto, sua causa é maior. A reivindicação de que a cidade respeite e endosse os sonhos e desejos de cada indivíduo diz respeito a todos.


Galeria Metrópole
Direção: Paulo Capovilla
Com: Rubens de Falco, Rosaly Papadopol, Priscilla Carvalho
Onde: teatro dos Arcos (r. Jandaia, 218, tel. 3101-7802)
Quando: de qui. a sáb., às 21h; dom., às 20h; até 25 de julho
Quanto: R$ 10



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