UOL


São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TEATRO

Núcleo Bartolomeu injeta cultura urbana em peça

"Acordei que Sonhava" leva resistência do hip hop ao Masp

Jane Stakflett/Divulgação
Estela Lapponi (dir.) e Patrick Toosey em cena de "Acordei que Sonhava", do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos


VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Espaço cativo da Feira de Antiguidades aos domingos, o vão livre do Masp, na av. Paulista, abriga hoje uma das pesquisas mais recentes e inovadoras dos palcos paulistanos: a fusão do hip hop com o teatro, ou vice-versa.
O Núcleo Bartolomeu de Depoimentos faz apresentação única de "Acordei que Sonhava", visita ao clássico do espanhol Calderón de la Barca (1600-81) com a perspectiva da cultura urbana.
Sob o mote "Natal É Vão", o grupo aproveita as vésperas da data e o encontro em plena av. Paulista para estabelecer contraponto ao consumismo e solidão.
A peça do século 17 narra a história do príncipe Segismundo, "exilado do mundo" até a vida adulta. Quem o manda para a prisão é o rei Basílio, alertado por oráculos de que traria desgraças.
Anos depois, o pai tem uma crise de consciência e dá nova chance a Segismundo. O herdeiro, enfim, é retirado do calabouço e induzido a acreditar que tudo não passou de ilusão.
Na versão do Núcleo Bartolomeu, esse alheamento imposto da realidade e as consequentes revolta e resistência de Segismundo colam com consciência e atitude, palavras caras ao grupo.
"O destino de Segismundo pode ser uma metáfora sobre o povo brasileiro aprisionado na ignorância", afirma a atriz e diretora Claudia Schapira.
Da primeira temporada, num galpão da Funarte, às apresentações ao ar livre no centro e na periferia de São Paulo, sempre neste ano, o teatro hip hop tornou-se sinônimo de intervenção, eixo do projeto Urgência nas Ruas!
O DJ Eugênio Lima, que assina a direção musical do espetáculo, posiciona-se em sua pick-up e faz a trilha ao vivo, revezando também a figura do narrador.
Um ator ou atriz-MC (mestre de cerimônia) intervém em vários momentos, opção brechtiana que, em suma, pede distanciamento e interferência do espectador sobre o que é representado. Foi um pouco assim também na primeira montagem do grupo, "Bartolomeu, Que Será que Nele Deu?" (2001), que tratava da opressão do trabalho nas sociedades capitalistas. Era dirigida por Georgette Fadel, da Cia. São Jorge de Variedades (outro núcleo que assume o fazer teatral como risco e há pouco levou "As Bastianas" para um albergue).
O grafite que domina o cenário (Júlio Docjsar), o diálogo com o vídeo ao vivo e a pulsação sonora do rap são aliados dos artistas que o Núcleo Bartolomeu reivindica como "agentes da história", "poetas das contradições humanas" que urgem na vida urbana.
Com três indicações ao Prêmio Shell de 2003, o Núcleo Bartolomeu integra o Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo.

ACORDEI QUE SONHAVA. Com: Núcleo Bartolomeu de Depoimentos (Roberta Estrela D'Alva, Paula Preta, Luaa Gabanini e outros). Onde: vão livre do Masp (av. Paulista, 1.578). Quando: hoje, às 19h. Quanto: grátis.


Texto Anterior: Artes cênicas: Catedral da Sé abriga "Auto da Esperança"
Próximo Texto: Mostra de dramaturgia: Ciclo teatral do Sesi chega ao fim com humor e despretensão
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.