São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

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Crítica/artes plásticas

Obra de Trockel dá novo significado a objetos do cotidiano doméstico feminino

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

A exposição da artista Rosemarie Trockel, no Paço das Artes, é modelo de política cultural de um país.
Organizada pelo Instituto de Relações Culturais Internacionais da Alemanha (IFA), a mostra circula pelo mundo desde 2003, com 70 obras adquiridas pela própria instituição, o que é, sem dúvida, uma forma de incentivo à produção.
Não são apenas pequenas obras, mas trabalhos que dão conta da poética da artista, que trabalha com variados suportes e distintas formas de produção.
Nascida em 1952, Rosemarie Trockel é uma das artistas contemporâneas alemãs mais representativas, que iniciou carreira em meados dos anos 1970.
Ela tem como marca de sua produção a re-significação do uso de objetos cotidianos, particularmente do universo doméstico feminino.
Chapas de fogão, lãs para costura, roupas ou ovos são alguns dos elementos que constituem as obras da artista. Os trabalhos não caem num feminismo militante, mas se tornam um aporte crítico ao universo masculino da arte, especialmente o ambiente alemão dos anos 80, dominado por nomes como Gerhard Richter, Sigmar Polker e Georg Baselitz.
Tão seca e, às vezes, mais rígida que a obra dos colegas masculinos, a obra de Trockel mostra que a arte produzida por uma mulher pode apontar para questões femininas sem, no entanto, se transformar num panfleto redutor.
Suas peças escultóricas com chapas de fogão, que participam da mostra no Paço, produzem um intenso diálogo com o minimalismo norte-americano de forma um tanto sarcástica.
Já a peça-chave da exposição, "Máquina de Pintura", de 1990, é composta por uma engenhoca que se parece bastante com um tear, e aponta, por um lado, para um fazer artesanal vinculado ao universo feminino, ao mesmo tempo em que busca questionar a autoria de uma obra, já que estão expostas sete pinturas realizadas pela máquina.
Dessa forma, Trockel ironiza o próprio fazer artístico por meio de elementos femininos.
As diversas possibilidades de criação são, aliás, uma obsessão visível da artista na exposição.
Há fotografias, pinturas, desenhos, gravuras, esculturas e vídeos (sem um espaço adequado para serem apreciados, é bom que se diga), que atestam o alto grau de experimentação de Trockel. Esses trabalhos abrangem um amplo período, sendo os mais antigos desenhos dos anos 80 e os mais recentes, impressões em plexiglas (um tipo de acrílico), que parecem tecidos esgarçados, novamente o uso do universo feminino.
Ao apostar na mostra monográfica de Trockel, o IFA, que já trouxe também exposições de Baselitz e Richter, evita o geocentrismo de exposições que visam tratar de uma arte nacional, ao mesmo tempo em que, ao abordar a produção de uma artista, acaba apontando para questões culturais do país, como afinal foi o feminismo dos anos 70 e 80 na Alemanha, que gerou importantes expoentes em outras áreas, como a coreógrafa Pina Bausch.


ROSEMARIE TROCKEL    
Onde:
Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária; tel. 3814-4832)
Quando: de ter. a sex., das 11h30 às 19h, sáb. e dom., das 12h30 às 17h30; até 25/2
Quanto: entrada franca


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