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ERUDITO
Sob regência de Yuri Temirkanov, a Filarmônica de São Petersburgo toca compositores russos na Sala São Paulo
Profundezas, garoas, excessos e um inglês
ARTHUR NESTROVSKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
O melhor veio no fim. Bem
no fim: nos últimos compassos da "Sinfonia Patética", de
Tchaikovski (1840-93), com as
cordas graves se perdendo em
profundezas. Foi pouco, mas o
bastante para registrar na memória o som da Filarmônica de São
Petersburgo, que tocou sexta-feira passada, na Sala São Paulo, sob
a regência de Yuri Temirkanov.
A pronúncia correta é "Temir-kánov". E ele não estava lá de
muito bom humor. Mesmo assim, foi, como sempre, um prazer
de se ver, discreto, sem maneirismos, exercendo controle total sobre a música sem se sobrepor a
ela. Mas não estava muito feliz -
com uma justificativa. O programa abriu com o "Prelúdio" do terceiro ato da ópera "Lohengrin",
de Wagner (1813-83), que dura
dois minutos e pouco. Bum! Acabou. E a platéia ficou sem saber o
que fazer. Quando as palmas vieram, era tarde. Estragaram a noite
de Temirkanov, que perdeu a
vontade de reger para nós.
Em 1998, quando os russos tocaram no teatro Cultura Artística,
era possível escrever que "o prazer que essa orquestra demonstra
em fazer música é algo de impressionante", e que ela "deixou a platéia a meio palmo do chão". Dessa
vez, o grande momento foi mesmo palmos adentro, nos fundos
infinitos de Tchaikovski. E depois
no bis, a nona variação ("Nimrod") das "Enigma Variations" de
Edward Elgar (1857-1934). Estranhas artes de um inglês: rasgou
corações dentro e fora do palco. E
isso depois de Tchaikovski!
E de Prokofiev. O prodigioso
"Concerto para Piano e Orquestra
nš 2" é de 1913, mesmo ano da
"Sagração da Primavera" de Stravinski, de "Jeux" de Debussy e do
primeiro volume de "Em Busca
do Tempo Perdido" de Proust.
Prokofiev estava com 22 anos, e se
permitia excessos de forma e sentido, que logo -no "Concerto nš
3", por exemplo, que será tocado
hoje à noite- aprenderia a moldar. (E o que não aprendeu foi
obrigado, depois de 1917; mas isso
é outra história, que no caso de
Prokofiev parece especialmente
cheia de ambiguidades.)
O "Concerto nš 2" é daquelas
peças que deixam os dedos da
gente doendo, só de ver. O solista
Alexander Toradze -nascido na
Geórgia (ex-União Soviética),
mas radicado nos Estados Unidos
há quase 20 anos- tocou tudo
com segurança e afinco. Teve vários momentos bonitos, de uma
música sonhadora, garoenta, alternando-se com as formidáveis
cadências. Curioso: tudo somado,
a música não teve peso. Ou melhor: não deixou peso. Espantou.
E foi.
No terceiro movimento da "Patética", a Filarmônica deu seu
show, claro.
Resumo não exatamente da
ópera: foi um bom concerto, de
uma venerável e poderosa orquestra, mas não um concerto
inspirado. 1998: "espetakularski".
2002: bonski. É a vida. Começos,
meios, começos, sem fim.
Filarmônica de São Petersburgo
Programa: Mussorgski e Prokofiev
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes,
s/nš, centro, tel. 3337-5414)
Quando: hoje, às 21h
Quanto: de R$ 120 a R$ 290, tel. 3258-3344 (Cultura Artística)
Patrocinadores: Bovespa, Telefonica e
Votorantim
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