|
Próximo Texto | Índice
Ensaio de orquestra
Em tom de crítica social, "Música e Fantasia" satiriza o clássico da animação "Fantasia", de Walt Disney
IRINEU FRANCO PERPETUO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O italiano Bruno Bozzetto, 65,
tinha dois anos de idade quando
Walt Disney (1901-1966) realizou
sua célebre mistura de música
clássica e desenho animado em
"Fantasia" (1940).
Depois de ter visto 11 vezes o filme, que despertou seu gosto pela
música de concerto, Bozzetto realizou, em 1976, "Música e Fantasia" ("Allegro Non Troppo"), que
estréia hoje em São Paulo e foi
vendido como "a resposta italiana" ao clássico norte-americano.
Conhecido na Itália como o
criador do "Signor Rossi" -um
homem comum de meia-idade-
e pela laureada série de TV "La
Famiglia Spaghetti", Bozzetto experimenta hoje técnicas de animação por computador. Nessa linha, sua produção recente destaca "Europe & Italy", que satiriza
as diferenças de costumes entre os
italianos e demais membros da
União Européia. Ele falou à Folha
por e-mail sobre seu filme.
Folha - Como nasceu a idéia de
"Música e Fantasia"?
Bruno Bozzetto - Nasceu enquanto eu escutava "Bolero" de
Ravel. Imaginei uma marcha inexorável para a evolução, com as
personagens que mudavam continuamente. Propus a idéia aos
meus colaboradores daquela época, e todos se entusiasmaram. Como grande admirador de "Fantasia", pensei em refazer uma "Fantasia" muitos anos depois e com
uma visão moderna.
Folha - Como você escolheu os
trechos musicais?
Bozzetto - Ouvindo muitos trechos e escolhendo aqueles que me
faziam nascer imagens visuais.
Alguns trechos não foram concedidos pelos editores, porque eles
temiam que eu fosse ridicularizar
a música. Às vezes, das primeiras
notas, nascia uma bela história,
mas, depois, a música andava na
direção errada com relação à história que eu tinha em mente e então era obrigado a descartá-la.
Folha - Por que satirizar "Fantasia" de Disney?
Bozzetto - Porque amei muito
esse filme, que fez com que me
enamorasse da música clássica.
Antes, definia o clássico como
"música dos mortos", talvez porque me recordasse a música que
ouvia na igreja quando criança. A
idéia pareceu-me original e inteligente e também me permitiu realizar os curtas que sempre tive como a melhor forma de expressão
do desenho animado.
Folha - Que tipo de comparação é
possível fazer entre "Fantasia" e
"Música e Fantasia"?
Bozzetto - "Fantasia" e "Música"
são dois filmes diferentes, porque
me esforcei em contar histórias
com começo e fim, enquanto em
"Fantasia" (à exceção do quadro
"Aprendiz de Feiticeiro") era privilegiada a parte estética. Não gostei de "Fantasia 2000" porque o
achei um pouco frio e destacado
do espírito da música. O quadro
"Os Pinheiros de Roma", de Ottorino Respighi, com as baleias que
voam, parece-me fora de lugar.
Folha - "Música" tem relações
com "Ensaio de Orquestra", filmado depois de seu filme por Federico
Fellini (1920-1993)?
Bozzetto - Não acho. Como Fellini fez depois, a pergunta deveria
ser feita a ele. Alguns críticos
acharam nas sequências com os
atores um espírito felliniano, mas
não estou de acordo, mesmo adorando Fellini como diretor.
Folha - Seria justo dizer que "Fantasia" é para crianças e "Música e
Fantasia" é para adultos?
Bozzetto - Não. Assisti a muitas
projeções de "Fantasia" nas quais
as crianças se aborreciam e queriam sair do cinema.
Próximo Texto: Crítica: Longa desmistifica universo dos concertos Índice
|