São Paulo, sábado, 26 de outubro de 2002

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"NO RETROVISOR"

Espetáculo conta com Marcelo Serrado e Otávio Muller no elenco e está em cartaz no teatro Augusta

Paiva resgata a dignidade de uma geração

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
O ator Marcelo Serrado em cena do espetáculo "No Retrovisor"


SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"No Retrovisor" é o retrato de uma geração que, por hesitar se entrava à esquerda ou à direita, manteve os olhos no retrovisor e enfiou o carro no caminhão de lixo parado da História. Marcelo Rubens Paiva é porta-voz desde 1982, quando escreveu "Feliz Ano Velho", transformando o relato autobiográfico do garoto que se tornou paraplégico no emblema de uma juventude de quem a ditadura tirou o chão, assassinou os pais e condenou ao não esquecimento.
Com esta peça, agora presta contas de erros e acertos, para um novo recomeço. A peça narra o reencontro de Marcos e Ney, que eram atores alternativos nos anos 80 e agora se enquadraram. Ney (Marcelo Serrado), após um acidente de carro, fica cego, e supera a perda do futuro utópico com a fama de cantor comercial.
Marcos (Otávio Muller) se manteve fiel aos felizes anos velhos e não consegue ficar feliz, mesmo tendo se casado com a musa da dupla, com quem tem um filho.
O conflito não é maniqueísta: Paiva expõe dúvidas, e não certezas. O que poderia haver de excessivo nas referências de época se torna contagiante pelo endosso apaixonado de Muller, com a entrega de um garoto dublando um disco e reinventando seu quarto em palco.
O cinismo de Serrado, que ironiza sua deficiência (Paiva não precisa ser politicamente correto) tem como contraponto um comovente relato da sobrevivência no hospital. Em ambos os casos, a luz de Wagner Pinto, que cria como por uma câmera subjetiva o ofuscamento do show e a solidão do escuro, e a direção de Mauro Mendonça Filho, que transforma em jogo de cabra-cega o amargo desencontro dos amigos, contribuem para evitar que o texto caia em um espetáculo assertivo demais, ou autodepreciativo.
As falhas do espetáculo se justificam pela urgência do momento histórico em que acontece a montagem. Não foi perdida a geração de 62. A peça termina com Marcos apresentando ao seu filho a rua. Não quer segurança, pois ainda é cedo: a geração de Marcelo Rubens Paiva está pronta para assumir suas funções.

No Retrovisor


    
Direção: Mauro Mendonça Filho
Com: Marcelo Serrado e Otávio Muller
Onde: teatro Augusta (r. Augusta, 943, Consolação, região central, tel. 3151-4141)
Quando: sex., às 22h, sáb., às 20h e 22h, e dom., às 19h; até 22/12
Quanto: de R$ 30 a R$ 35





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