|
Texto Anterior | Índice
"LUDWIG E AS IRMÃS"
Montagem de Thomas Bernhard aborrece pelo anticonvencional
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
O grande inimigo do teatro
é o tédio. Não por ser produto de consumo, que deve buscar a
novidade até o blefe, mas por ser
serviço público, capaz de promover uma outra percepção do cotidiano, o teatro que não chega à
platéia está morto, por melhores
que sejam suas intenções.
Pois o tédio como fracasso da
arte é justamente o tema de "Ludwig e as Irmãs", de Thomas Bernhard, um provocador tornado
clássico. A trama é rala: as irmãs
de Wittgenstein, atrizes medíocres, tiram o filósofo do hospício
para o conforto do lar. Em vez de
ficar grato, este se revolta contra o
convencionalismo do cotidiano.
Duas longas cenas nas quais as
personagens desfiam longas considerações capazes de levar perigosamente ao tédio metalinguístico. Por coincidência, este mesmo
texto foi montado no recente Festival de Curitiba por Luciano Alabarse, dentro de uma estética naturalista que, embora incomodasse pelo convencionalismo, era eficaz para que se entendesse a revolta do protagonista.
Agora, esta montagem paulista
parte da estratégia oposta: escolhe
"não conceder ao prosaico" ao
adotar cenário explicitamente falso, com referências aos telões pintados de feira, atrás dos quais se
posa para fotos grotescas, referência talvez ao esquematismo com
que o texto caracteriza as irmãs.
Os atores se dirigem ao público,
seguindo uma marcação repetitiva que caracteriza mais as personagens que as situações, explicitando o artificialismo da representação teatral. É a novidade-blefe do anticonvencional sistemático, que leva ao tédio com a
mesma eficiência que o convencional. Talvez seja essa mesma a
intenção do diretor: denunciar
um esnobe artificialismo em voga
no teatro europeu. Mas, como o
faz para platéia brasileira, em
princípio alheia a essas preocupações, cai no esnobismo também.
Mas seu erro principal não é esse. A montagem naufraga quando
propõe o desafio de caracterizar
más atrizes a atrizes principiantes.
Quando se manifesta enfim Ricardo Blat, este sim com uma técnica capaz de promover a empatia
com a platéia, já é tarde demais.
Reduzido seu Ludwig a um alter
ego do diretor, que "denuncia" à
platéia a mediocridade do espetáculo que encena, procura convencer que é sofisticação o cinismo
autodepreciativo, mas acaba descambando na auto-indulgência.
Uma leitura inteligente das entrelinhas do texto é neutralizada
por sua explicitação por vezes
grosseira, em todo caso esvaziadora, de alusões sexuais e políticas. Sem ter sequer o pretexto de
uma ideologia política reconhecível sob a qual varrer as imperfeições de sua montagem, o diretor,
roubando a cena do autor e dos
atores, parece querer denunciar
de modo geral a mediocridade
que impera na arte. Comprova
sua tese fazendo um espetáculo
medíocre e tedioso.
Ludwig e as Irmãs
Texto: Thomas Bernhard
Onde: Centro Cultural São Paulo - sala
Jardel Filho (r. Vergueiro, 1.000, Paraíso,
região sul, tel. 3277-3611, r. 250)
Quando: hoje, às 21h, e amanhã, às 20h
Quanto: R$ 12
Texto Anterior: Teatro: Mostra sobre Plínio Marcos começa hoje Índice
|