UOL


São Paulo, sábado, 28 de junho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DANÇA/CRÍTICA

Virtuosismo e mistura de estilos e nacionalidades marcam criação de Maurice Béjart para a Compagnie M.

Palavras de Madre Teresa percorrem a noite

INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA

Uma mensagem de amor e esperança... pela arte de Maurice Béjart. Com participação especial da estrela brasileira Márcia Haydée, a Compagnie M. iniciou nesta semana sua turnê pelo Brasil, com o espetáculo "Madre Teresa e as Crianças do Mundo".
Movimentos clássicos, acrobacias, ioga; músicas que vão de cantos folclóricos do Rajastão a composições de Hugues le Bars, passando por Bach, Mozart e música pop. O espetáculo evoca as reflexões de madre Teresa, sem situá-la especificamente na Índia. Em cena, bailarinos de várias nacionalidades escutam e ecoam as lições da madre e clamam por ela.
"Madre Teresa", no caso, é Marcia Haydée. Aos 66 anos, com seus longos cabelos pretos, ela está sempre presente no palco. De maneira sóbria, dá a cada quadro seu sentido, em citações faladas: "Minha casa é a casa dos pobres"; "arranje um tempo para brincar, ... para viver..., para amar"; "a dança é uma religião na Índia; a dança é uma prece", "a plenitude de nossos corações é expressa por uma infinidade de meios". Cada uma é quase como a "moral", nessa grande antologia de fábulas.
Há de tudo um pouco no palco. A coreografia não segue uma composição muito complexa: são diversos passos de diversos estilos, um ao lado do outro, em desenhos geométricos. O espetáculo vai de exercícios de ioga a movimentos que remetem aos musicais hollywoodianos, passando pela dança clássica. Os bailarinos dançam, falam, cantam e fazem percussão com os bastões que lhes servem de apoio para saltos e exercícios diários de aula.
Bailarinos de técnica impecável. Quinta passada, no Municipal, o brasileiro William Pedro fez giros perfeitos, equilíbrios de tirar o ar, saltos suaves, muito molejo. Outro destaque foi Yannis François, de Guadalupe, com sua bela voz de barítono, além de dançar muito bem, com movimentos fluidos e precisos.
Entre as mulheres, destaque para a argentina Luciana Croatto, com técnica de linhas extremas na dança clássica. Em outro plano, Haydée faz um virtuosístico solo de movimentos corriqueiros.
Exemplo de cena construída: cinco grupos de três bailarinos, onde dois suspendem e abaixam várias vezes um terceiro, "morto"; depois vê-se a ascensão de Márcia Haydée, sustentada pelos bailarinos e recoberta por um imenso véu azul da Virgem.
Exemplo de pergunta possível: será que só a soma de virtuosismos compõe uma coreografia? Será possível transpor para o palco "lições de vida", sem cair no vazio das "mensagens"?
Outra: será que a alegria buscada pela coreografia, apostando na juventude dos bailarinos, não fica por vezes gratuita? Rico como é, o espetáculo não encontra, afinal, seu eixo -nem na leveza dos gestos, nem no portento das idéias. Transpostas para a dança, as lições de Madre Teresa correm o risco de se tornar, paradoxalmente, apenas palavras no ar.


Avaliação:   


Texto Anterior: "Otelo": Montagem estréia com medo de ser feliz
Próximo Texto: Visuais: Elegância e kitsch convivem em galeria
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.