|
Texto Anterior | Índice
Crítica/"Verdade Nua"
O poder da ilusão vira ilusionismo estiloso em "noir" de Atom Egoyan
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
No mundo do culto das
aparências e das celebridades convertidas
em divindades algo sempre se
esconde. Na superfície lisa a
perfeição encontra o espelho
onde gosta de se refletir. Mas as
sombras deixam de existir.
Cineasta obcecado pela duplicidade e pelos jogos ilusionistas de falsidade e veracidade, Atom Egoyan não demoraria a ser atraído por esse universo da pura aparição, que
constitui o encanto das celebridades. E nele mergulha neste
"Verdade Nua".
O filme acompanha as peripécias de uma dupla de humoristas entre duas épocas: a de
seu apogeu, no fim dos anos 50,
e a de sua desaparição, no início
dos 70.
Unindo as duas pontas, temos uma jovem jornalista, que
se dedica a desvendar a misteriosa morte de uma garota na
suíte do hotel em que Vince e
Lanny estiveram hospedados
em Nova Jersey.
Não se trata, para o diretor
canadense, de lançar um olhar
moralizante sobre o universo
das celebridades, de denunciar
como manipulação o encantamento que elas exercem ou de
tentar derrubá-los de seus altares divinos apontando suas falsificações.
O que lhe interessa é expor a
intimidade que não coincide
com aquela exposta nas páginas das revistas movidas a celebridades. Para isso, ele recorre
à estrutura do filme noir, com a
clássica investigação conduzida pela lógica "nada é o que parece".
O problema é que o resultado
parece ao final nada mais que
um exercício de estilo. Pois o
noir, por mais complexo que
seja, tornou-se um gênero desgastado desde que foi usado e
abusado como moda nos anos
80, em filmes como "Corpos
Ardentes", "A Lua na Sarjeta" e
tantos outros.
O fetichismo daquelas imagens ao mesmo tempo irresistíveis e letais evoluiu definitivamente quando David Lynch
rompeu os limites narrativos
em "Cidade dos Sonhos". Depois disso, a simples retomada
de temas e da estética em moldes estritamente clássicos, como propõe Egoyan em "Verdade Nua", alcança no máximo
um duplo efeito para o espectador: os olhos se encantam, mas
num simples piscar o poder da
ilusão se dissolve em ilusionismo.
VERDADE NUA
Direção: Atom Egoyan
Produção: Canadá/Inglaterra, 2005
Com: Kevin Bacon, Alyson Lohman,
Colin Firth
Quando: Em cartaz no Espaço Unibanco
Texto Anterior: Filme traz rapidez e crueza do Minutemen Índice
|