São Paulo, sábado, 29 de julho de 2006

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Crítica/"Verdade Nua"

O poder da ilusão vira ilusionismo estiloso em "noir" de Atom Egoyan

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

No mundo do culto das aparências e das celebridades convertidas em divindades algo sempre se esconde. Na superfície lisa a perfeição encontra o espelho onde gosta de se refletir. Mas as sombras deixam de existir.
Cineasta obcecado pela duplicidade e pelos jogos ilusionistas de falsidade e veracidade, Atom Egoyan não demoraria a ser atraído por esse universo da pura aparição, que constitui o encanto das celebridades. E nele mergulha neste "Verdade Nua".
O filme acompanha as peripécias de uma dupla de humoristas entre duas épocas: a de seu apogeu, no fim dos anos 50, e a de sua desaparição, no início dos 70. Unindo as duas pontas, temos uma jovem jornalista, que se dedica a desvendar a misteriosa morte de uma garota na suíte do hotel em que Vince e Lanny estiveram hospedados em Nova Jersey.
Não se trata, para o diretor canadense, de lançar um olhar moralizante sobre o universo das celebridades, de denunciar como manipulação o encantamento que elas exercem ou de tentar derrubá-los de seus altares divinos apontando suas falsificações. O que lhe interessa é expor a intimidade que não coincide com aquela exposta nas páginas das revistas movidas a celebridades. Para isso, ele recorre à estrutura do filme noir, com a clássica investigação conduzida pela lógica "nada é o que parece". O problema é que o resultado parece ao final nada mais que um exercício de estilo. Pois o noir, por mais complexo que seja, tornou-se um gênero desgastado desde que foi usado e abusado como moda nos anos 80, em filmes como "Corpos Ardentes", "A Lua na Sarjeta" e tantos outros. O fetichismo daquelas imagens ao mesmo tempo irresistíveis e letais evoluiu definitivamente quando David Lynch rompeu os limites narrativos em "Cidade dos Sonhos". Depois disso, a simples retomada de temas e da estética em moldes estritamente clássicos, como propõe Egoyan em "Verdade Nua", alcança no máximo um duplo efeito para o espectador: os olhos se encantam, mas num simples piscar o poder da ilusão se dissolve em ilusionismo.


VERDADE NUA
  
Direção: Atom Egoyan
Produção: Canadá/Inglaterra, 2005
Com: Kevin Bacon, Alyson Lohman, Colin Firth
Quando: Em cartaz no Espaço Unibanco


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