São Paulo, terça-feira, 30 de agosto de 2005

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ARTES PLÁSTICAS

Artista usa técnica japonesa para jogo entre eterno e efêmero

Mitsunashi carboniza o mundo

GABRIELA LONGMAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Nabuo Mitsunashi chega ao Instituto Tomie Ohtake com a roupa cheia de manchas pretas e as mãos sujas de carvão. Não fala inglês nem português, mas, sorridente, apresenta os novos elementos que acaba de trazer para a montagem de "Hanazumi", exposição que inaugura hoje.
Desde que aterrizou no Brasil há 50 dias, o artista japonês tem trabalhado incessantemente, usando o forno de uma amiga ceramista para produzir seus inusitados "objetos" -flores, frutas e vegetais, carbonizados através da centenária técnica japonesa que dá nome à exposição (o hanazumi surgiu como modo de carbonizar flores para serem apreciadas na cerimônia do chá).
Apenas pelo cheiro e cor da fumaça, o artista sabe a hora de abrir o forno e tirar os objetos antes de que virem cinzas. Da defumação (sem entrada de oxigênio) a 400 ºC, os alimentos saem sem água, com tamanho reduzido e muito leves. O resultado deixa os espectadores confusos e fascinados: os frutos ali apresentados já não estão vivos, mas a forma está tão intacta e a cor preta lhes confere tanta beleza (uma beleza fúnebre), que é impossível dizer que estão propriamente mortos. Moram numa espécie de estágio intermediário de nossa imaginação.
Como foi "produzida" no Brasil, a exposição exibe alimentos familiares como a pimenta dedo-de-moça ou uma suntuosa jaca. Sim, todos estão empretecidos pelo processo, mas aparecem ordenados com tamanha precaução estética e delicadeza que fazem lembrar os arranjos dos jardins japoneses. Algumas das folhas carbonizadas foram arrancadas (com autorização) diretamente do jardim da artista Tomie Ohtake, de quem Mitsunashi é amigo há anos.

Mar de rosas
Mas sem dúvida o momento mais impactante da exibição é a entrada na "sala das rosas". Ali, 8.000 flores negras estão pregadas à parede, arranjadas de modo a deixar extremamente incomodados e/ou deslumbrados os espectadores. Como se não bastasse, o espanto cresce ao descobrir que tudo que está ali exposto será "destruído" (a exposição foi produzida no Brasil e por aqui fica): o artista parte para o Japão, mas deixa instruções para que os objetos sejam enterrados em jardins da redondeza. "A matéria assim, retorna à terra", diz Mitsunashi, "é a noção de ciclo". Construção/ destruição, eterno/efêmero, vida/ morte são, portanto, antagonismos postos em xeque pela mostra, que é a quarta individual do artista no Brasil.


Hanazumi - Nabuo Mitsunashi
Quando: abertura hoje, às 20h; de ter. a dom., das 11h às 20h; até 9/10
Onde: Instituto Tomie Ohtake (av. Faria Lima, 201, Pinheiros, tel. 2245-1900)
Quanto: entrada franca


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