São Paulo, quinta-feira, 30 de setembro de 2004

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Percussionista escocesa surda faz solo brasileiro

DA REPORTAGEM LOCAL

A percussionista escocesa Evelyn Glennie, 39, surda desde os 12 anos, apresenta-se hoje e sábado com a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo) como solista de "Radiância", peça contemporânea do compositor brasileiro Paulo Chagas, e "Veni, Veni, Emmanuel", do também contemporâneo escocês James MacMillan.
As duas récitas, sob a regência de John Neschling, também trarão "O Beijo da Fada", música para balé em quatro cenas, escrita em 1928 por Igor Stravinski.
Glennie é uma personalidade de perfil raro entre os grandes nomes mundiais da música erudita.
Sua forte presença em cena e sua agitada agenda pessoal -em média uma apresentação a cada três dias e mais atividades filantrópicas e didáticas- deram a ela uma projeção que normalmente beneficia apenas violinistas, pianistas ou intérpretes de instrumentos com capacidade de harmonização mais reconhecida pelo grande público.
Na peça de Paulo Chagas seus instrumentos são sinos tubulares, tam-tans, pratos, caixas, tamborins, agogôs, triângulo, bongôs, bateria e bombo.
Na de MacMillan, interpreta tam-tans, vibrafone, caixas, congas, tom-tons, gongos, sinos de templo, blocos de madeira, sinos de vaca, sinos tubulares, marimba, pratos e tambor com pedal.

Vibrações sonoras
A deficiência auditiva da solista é um "simples detalhe" que implica algumas providências insólitas. Ela se apresenta descalça para captar as vibrações do chão e, muitas vezes, justapõe o instrumento ao ventre para senti-lo de forma mais íntima. E precisa, para concentrar-se de modo excepcional nas indicações de andamento dadas pelo regente.
Apesar de carreira relativamente recente, iniciada em meados dos anos 80, Evelyn Glennie traz um currículo com episódios de invejável intensidade.
Interpreta cerca de 60 instrumentos de percussão. Já gravou 18 CDs, dois deles premiados com o Grammy, e já se apresentou em 42 países. Publicou aos 30 anos uma autobiografia, "Good Vibrations", consumida pelo mercado como uma espécie de guia para o exercício da força de vontade de uma deficiente auditiva.
Compositores dedicaram-lhe 129 peças para o repertório de percussão. Sua biblioteca pessoal tem 2.600 partituras para os múltiplos instrumentos que domina.
Há alguns meses, uma entrevista que deu à BBC World mostrou dela um perfil extrovertido e fascinante. Seu sonho infantil era ser cabeleireira.
Ela gosta de andar de motocicleta e de brincar de videogame. Entre seus hobbies está colecionar instrumentos (diz ter 1.800 em casa) e ler. As livrarias são os locais que ela afirma mais gostar de freqüentar.
Já se apresentou como solista de praticamente todas as grandes orquestras mundiais -entre as exceções, a Filarmônica de Berlim e de São Petesburgo. Foi regida por maestros como Georg Solti, Vladimir Ashkenazy, Luciano Berio e Christoph von Dohnanyi.
Possui, por fim, 13 títulos honorários dados por importantes universidades européias.
Se currículo do principal intérprete é um indício de grandes espetáculos, a Osesp está diante de duas récitas verdadeiramente excepcionais. (JBN)


ORQUESTRA SINFÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Com John Neschling (regente) e Evelyn Glennie (percussionista). Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes, s/nš, região central, tel. 3337-5414). Quando: hoje, às 21h, e sáb., às 16h30. Quanto: de R$ 22 a R$ 70.


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