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ARTES CÊNICAS/CRÍTICA
Mostra rememora o Balé do IV Centenário nos figurinos e cenários de 'O Mandarim Maravilhoso'
Segall revela o desastre íntimo de cada um
Divulgação
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O desenho "Estudo para Personagens - A Jovem e o Malfeitor", de Lasar Segall |
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
As cores vão dos terras aos
cinzas, dos pretos aos verdes
e ocres, dos amarelos aos vermelhos, numa densidade esmaecida,
carregada de expressão. Todos os
trabalhos de Lasar Segall (1891-1957) para a cenografia e o figurino de "O Mandarim Maravilhoso", feitos em 1954 para o Balé do
IV Centenário, estão em primorosa mostra no museu que leva o
nome do artista. O projeto expográfico é de Pedro Mendes da Rocha e a concepção de Denise
Grinspum, Pierina Camargo, Rosa Esteves e Vera d'Horta.
São Paulo não tinha uma companhia de dança profissional no
início da década de 50, quando se
resolveu incorporar uma às comemorações de 400 anos da cidade. O projeto era ambicioso: previa a contratação de um diretor
artístico europeu, grandes artistas
plásticos (Di Cavalcante, Candido
Portinari, Clóvis Graciano e
Darcy Penteado, Flávio de Carvalho, além de Segall), músicos
(Souza Lima, Camargo Guarnieri,
Francisco Mignone e Villa-Lobos) e 50 bailarinos (entre eles
Ady Addor, Lia Marques, Marika
Gidali, Edith Pudelko, Ismael
Guiser e Lia Dell'Ara). Uma grande reunião de talentos inspirada
na idéia da "obra de arte total"
-como praticada não nas óperas
de Wagner, mas sim nos Ballets
Russos de Diaghilev.
Mas sua trajetória foi conturbada. O Balé do IV Centenário não
estreou em São Paulo (exceto um
espetáculo, adaptado no Pacaembu), e, sim, no Rio, porque as
obras do Teatro Municipal não ficaram prontas. Só em 1955 São
Paulo veria alguns de seus balés
na íntegra. Apesar de sua curta
duração, o Balé foi um grande
marco da história da nossa dança
e impulsionou muitos talentos.
Segall fez apenas duas cenografias para balé: "Sonho de uma
Noite de Verão", e o "Mandarim";
fez também uma para o texto dramático "Sorte Grande", de Scholem Aleichem (1946).
Cada obra exposta é um universo. São 31 guaches, desenhos
aquarelados e a tinta preta, além
de fotos das apresentações, maquetes do cenário, o vestido da
personagem feminina, a correspondência entre Segall, os organizadores, e o coreógrafo e diretor
artístico da companhia Aurélio
Milloss, e alguns recortes de jornais da época. Durante todo tempo ouve-se a música de Bela Bartók, uma obra-prima do modernismo, bem conhecida hoje no repertório sinfônico.
Fotografias de Kazmer Richard
Sasso S. Pamplona mostram os
personagens da trama: a jovem,
os malandros e o mandarim (a vítima, que se apaixona pela moça).
O estudo dessas personagens, em
tinta preta e pena aguada, revela
com despojamento o desastre íntimo de cada um. E nos projetos
de figurino é quase possível enxergar as formas de expressão do
movimento; por exemplo, nos estudos do mandarim, o corpo se
dobra sobre si mesmo, deixando à
mostra, com um simples gesto,
certos traços de caráter.
O cenário tem uma parte fixa
nas laterais que compõem a ruela
e o quarto da prostituta. O vão
central do palco é livre, mas a seqüência de laterais, completada
pelos três painéis móveis do fundo, cria um universo de desolação
e silêncio. Lá no fundo, são três
momentos: a cidade em sépia,
ainda bem visível, um bloco no
meio da neblina, e uma sugestiva
ponte, sob o céu azul. Projetos de
cor para o cenário podem ser vistos separadamente, e as maquetes
dão uma configuração completa
do palco.
Os cenários e figurinos de Segall
foram vistos em apresentações
(de outras Companhias) em Brescia, Florença (1957) e Perugia
(1958). Hoje a dança se foi, no escuro das décadas. Mas ficaram esses desenhos e, neles, o "Mandarim" dança para sempre, cumprindo seu destino de amor no
teatro da imaginação.
O Mandarim Maravilhoso
Onde: museu Lasar Segall (r. Berta 111,
tel. 5574-7322)
Quando: de ter. a sáb., das 14h às 19h;
dom., das 14h às 18h; até 5/9.
Quanto: entrada franca
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