São Paulo, sexta, 1 de janeiro de 1999

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Secretária quer romper clientelismo

LUIZ ANTÔNIO RYFF
da Sucursal do Rio

A geógrafa carioca Wanda Engel,54, comandará a Secretaria de Ação Social com um temor: não conseguir romper a herança fisiológica e clientelista que caracteriza essa área.
Subordinada ao ministro da Previdência Social, com um orçamento de R$ 1,4 bilhão previsto para 1999, ela assume o cargo após ter coordenado a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social nas administrações do governador Cesar Maia e do prefeito Luiz Paulo Conde, ambos do PFL.
Nos anos 80, ela dirigiu no Rio de Janeiro o primeiro Ciep (Centro Integrado de Educação Pública) -o xodó do então governador Leonel Brizola (PDT).
Ex-eleitora de Brizola, Luiz Inácio Lula da Silva, Cesar Maia e Fernando Henrique Cardoso, Wanda nunca se filiou a partido.
Ela se considera de esquerda por ter "compromissos com o social, com combate à pobreza e à exclusão". Wanda reconhece, entretanto, ser mais fácil trabalhar a área social em governos de direita.
Wanda diz que a opção pelo combate à exclusão social é fruto do histórico familiar. Quando o pai ficou tuberculoso e diabético, a mãe -que não tinha escolaridade- começou a trabalhar como servente na Prefeitura do Rio de Janeiro.
"Isso parece bobagem, mas marcou a minha vida", afirma ela, que cursou o Instituto de Educação graças a um programa que proporcionava merenda, uniforme, material escolar e passagem gratuitamente aos alunos.
"Eu estava caindo da "malha da integração', e havia uma rede de proteção que me permitiu permanecer na escola, me formar e estar hoje onde estou", diz ela. Leia a seguir trechos da entrevista concedida à Folha.
Folha - Qual a perspectiva de trabalhar em um governo criticado por não priorizar a área social?
Wanda Engel -
Área social não é só assistência social. Também é educação, saúde, trabalho, esporte, cultura e lazer. Não diria que houve fracasso nessas áreas como um todo. Mas tudo tem que ser mais articulado. Assistência social não vive sem as outras políticas.
Folha - Qual sua prioridade ao assumir a secretaria?
Wanda -
Criança e adolescente são a meta constitucional. E o idoso é a meta da realidade demográfica deste país.
Folha - Sua formação teórica e experiência são centradas em problemas urbanos. Como lidar com o interior?
Wanda -
Não tenho experiência, mas a secretaria tem uma história de ação na área rural. A secretaria foi LBA (Legião Brasileira de Assistência) e teve, como qualquer instituição, coisas ruins e boas.
Folha - O histórico é mais de clientelismo...
Wanda -
Claro, o histórico é de clientelismo. Mas há uma experiência acumulada. Mesmo que em uma direção errada.
Folha - É possível uma política comum para ser adotada tanto no campo quanto na cidade?
Wanda -
A forma de operacionalização é diferente. Por exemplo, uma diretriz: lugar de criança é na escola. No Rio, ela enfrenta o problema de meninos que vendem coisa nos sinais. Na zona rural, os meninos estão no corte de cana.
Para evitar que a criança fique sem escola, é preciso uma política que passe pelo econômico, pelo cultural. É preciso evitar a repetição do ciclo de pobreza, nem que seja punindo os pais.
Folha - Que tipo de punição?
Wanda -
Aqui trabalhamos responsabilizando os país. O primeiro passo é apoiar a família. Cesta básica, auxílio em dinheiro... Se a criança continua sendo explorada, tiramos o pátrio poder. É terrível, mas às vezes a família não é o melhor para a criança.
Folha - A sra. desenvolveu projetos sociais em governos de esquerda e de direita. Qual a diferença?
Wanda -
Nunca trabalhei de forma tão organizada quanto no governo do PFL.
Folha - A sra. parece ter sofrido com essa resposta...
Wanda -
É. Por eu ter de admitir isso. (Ri)
Folha - A sra. assume um cargo com mais visibilidade, possibilidades e cobranças. A sra. receia algo?
Wanda -
Eu receio entrar com uma lógica em um quadro em que ela é nova: uma política de assistência não-partidária e não utilizada de uma forma político-partidária é um negócio que possivelmente vai soar... (Hesita)
Folha - A sra. teme não conseguir romper com estruturas e heranças clientelistas e fisiológicas que caracterizam a ação social no país nos últimos anos.
Wanda -
Pode pôr entre aspas.



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