São Paulo, sexta, 1 de janeiro de 1999

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CELSO PINTO
Como crescer em 99?

O Produto Interno Bruto, a soma das riquezas produzidas pelo país, poderá sofrer uma queda, no último trimestre de 98, que, anualizada e dessazonalizada, pode chegar de menos 6% a menos 10%. Na pior hipótese, o produto industrial regridiria aos níveis do primeiro semestre de 95, depois da crise mexicana.
Os cálculos são do economista Affonso Celso Pastore, ex- presidente do Banco Central. É bom lembrar que qualquer queda do PIB no último trimestre fará com que a economia brasileira entre, tecnicamente, em recessão em 98. Os economistas definem recessão como a queda do PIB em dois trimestres consecutivos, e o PIB já caiu no terceiro trimestre.
O valor da produção industrial é conhecido até outubro. No cenário mais otimista, Pastore imagina que não tenha havido queda adicional em novembro e dezembro. No mais pessimista, supõe que a queda persistiu, em menor escala.
Considerando a relação que tem havido entre o crescimento do setor industrial e dos outros setores econômicos, o resultado final é bastante ruim. Descontando o impacto sazonal e anualizando o resultado do PIB trimestral, a queda vai de menos 6% a menos 10%.
O desemprego também preocupa. A taxa deve cair de 8,5% em agosto para 7,5% em dezembro, na previsão do banco CSFB-Garantia, mas essa é uma péssima notícia. Pastore lembra que o número do desemprego em dezembro tende a ser 25% menor do que a média do ano, enquanto o de maio tende a ficar 12% acima.
Se ficar em 7,5% em dezembro, portanto, o desemprego estará apontando para um número, dessazonalizado, bem acima de 9%. De fato, o CSFB-Garantia prevê que, em janeiro, o desemprego deva estar batendo no nível recorde de 10%.
² Sem milagres
Na discussão sobre qual deverá ser o comportamento da economia em 99, é muito difícil ver de onde poderia vir a sustentação para manter o PIB no azul. O CSFB-Garantia, que prevê uma queda de 1,9% do PIB em 99, levanta alguns argumentos interessantes na discussão.
Como a economia, infelizmente, não cresce por geração expontânea, se há crescimento, ele tem que vir de algum lugar. A demanda agregada da economia é formada pelo consumo privado (61% do total), investimentos (20,5%), consumo do setor público (18%) e pelo setor externo (0,5%). A demanda para sustentar crescimento tem que vir de um ou vários desses fatores.
Um grande impulsionador do PIB, nos últimos anos, foi o consumo. Em 98, contudo, pela primeira vez desde o início do Plano Real, a massa salarial real, medida em 12 meses, está caindo.
O desemprego está em alta, o poder de compra dos salários está deprimido, o crédito está restrito e com custos altíssimos, a inadimplência está em níveis recordes e a confiança do consumidor está em baixa. Além disso, o ajuste fiscal, ao elevar a carta tributária, vai reduzir a renda disponível. Com tantos fatores negativos, é difícil imaginar uma recuperação do crescimento econômico puxada pelo consumo.
O segundo maior fator de demanda agregada é o investimento. Nesse caso, existem algumas boas notícias, envolvendo setores com obrigação de investir, como telecomunicações. Em outros setores que planejavam investir pesado, como automobilístico, contudo, alguns investimentos previstos já foram adiados.
De forma geral, com os juros altíssimos previstos para 99, é difícil supor uma corrida por investimentos privados que seja capaz de compensar a queda em outros lados da demanda. O governo e o banco imaginam que a recuperação, quando ocorrer, será liderada pelos investimentos privados. Isso só deverá começar a acontecer, contudo, a partir do segundo semestre de 99.
O consumo do setor público, o terceiro fator de demanda agregada, por definição estará em retração em 99 se o governo cumprir o programa de ajuste fiscal, reduzindo despesas de custeio e de capital. Finalmente o setor externo pode até funcionar a favor, mas ele pesa muito pouco na demanda agregada (0,5%) para fazer grande diferença.
A conclusão é que não há qualquer indicação de que 99 poderá surpreender favoravelmente, pelo menos nos seus primeiros meses. É claro que, se o mercado internacional melhorasse rapidamente, o Brasil talvez pudesse reduzir as taxas de juros de forma mais agressiva. Não há, contudo, indicações de que isso vá acontecer no horizonte visível.




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