São Paulo, domingo, 1 de março de 1998

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JANIO DE FREITAS
Um a mais, nada mais

O desabamento na Barra da Tijuca tornou pública uma parte dos golpes e fraudulências que deram ao deputado Sérgio Naya vida de bilionário -e extinguiram não se sabe quantas vidas e desgraçam milhares de outras. Entre os escombros que Sérgio Naya vai deixando não emerge, porém, a figura de um parlamentar incomum, que escandalize agora os seus pares do Congresso como estarrece e revolta os comuns, sejam ou não vítimas suas.
Sob diferentes disfarces de nome, de partido, de Estado, são muitos os sérgios nayas do Congresso. Compõem o grande contingente dos que não se elegem em razão de idéias, de compromissos, de entusiasmo com programas políticos, mas para usar a condição de deputado. Como gazua. Como arma.
São só sérgios nayas os componentes do bando que vende votos para aprovar reformas, para aprovar a reeleição, para engolir 1.300 medidas provisórias, para trair o seu e todos os eleitorados. São os que recebem empréstimos favorecidos nos bancos oficiais, como Sérgio Naya. E fazem ou intermedeiam negócios com o governo, como Sérgio Naya. E, como Sérgio Naya, contam com a proteção do governo para falcatruas nas suas obrigações com o INSS, com os impostos, com as dívidas nos bancos, nas caixas e nos fundos. E que recebem do governo as verbas orçamentárias, hoje como antes os anões do Orçamento.
Não é propriamente por esses expedientes que os sérgios nayas se fazem parlamentares. Por trás de cada um deles há sempre negócios, empresariais ou não. Por algum modo, sempre se valendo da relação entre o mandato parlamentar e o governo. É essa regra infalível que invalida a contestação da Presidência da República à notícia, dada por Ricardo Boechat, de sua ordem para que o Banco do Brasil sustasse a cobrança judicial de uma dívida de Sérgio Naya. Pagamento (ou parte) da Presidência por voto comprado no Congresso.
Se fosse um negócio com seguradora ou corretora, como tem acontecido, a direção do BB decidiria por sua conta. Em se tratando do interesse de parlamentar, nada é feito nos terreiros governamentais, a favor ou contra, sem a orientação da Presidência da República. E mais: diz-se que a dívida noticiada, de R$ 17 milhões na agência Ipanema do BB, é uma fração muito modesta da dívida total de Sérgio Naya favorecida pelo governo.
Os que não são sérgios nayas compõem a menor porção do Congresso. Impossibilitados, por isso, de impedir que o caso revoltante de Sérgio Naya não seja apenas mais um na sucessão dos escândalos impunes do Congresso.



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