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IMAGEM OFICIAL
Publicidade do governo federal na televisão utilizou imagens enganosas
Para especialistas, houve falta de ética em propagandas
VIRGILIO ABRANCHES
DA REDAÇÃO
As propagandas do governo federal na TV que utilizaram imagens enganosas foram feitas de
uma maneira eticamente inaceitável. Essa é a opinião de especialistas sobre o assunto ouvidos ontem pela Folha.
"O caso é gravíssimo. Não dá
margem para nenhum tipo de tergiversação. Eticamente é intolerável", diz Clóvis de Barros Filho,
professor de Filosofia da Comunicação da ESPM (Escola Superior
de Propaganda e Marketing) de
São Paulo e de Ética da Escola de
Comunicações e Artes da USP
(Universidade de São Paulo).
Na segunda-feira, reportagem
da Folha revelou que uma peça
publicitária que divulgava ações
do governo utilizou imagens enganosas. Enquanto anunciava números do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), a propaganda
mostrava imagens de uma propriedade em Cotia (SP), de 1 milhão de metros quadrados, que
nunca recebeu verba do governo.
Ontem a Folha revelou que outra propaganda oficial apresentava problemas. O comercial, que
divulgava ações do Bolsa-Família
-programa de transferência de
renda do governo-, também utilizava imagens enganosas, além
de anunciar dados incorretos. As
duas peças, que tiveram a coordenação de produção feita pelo
marqueteiro Duda Mendonça, foram tiradas do ar.
"Uma imagem usada para ilustrar um texto suscita expectativas
de correspondência entre o que
está sendo dito e a mensagem que
está sendo exibida. Ainda que o
texto contenha informações verdadeiras, se se exibe mensagens
incompatíveis, se está induzindo
ao erro", diz Barros Filho.
Já o professor Leandro Batista,
do Departamento de Relações
Públicas, Propaganda e Turismo
da USP, vai ainda mais longe. Segundo ele, além da condenação
ética, o caso também pode ser objeto de uma análise ideológica:
"Se formos analisar ideologicamente, do ponto de vista de um
partido [PT] que pregava só dizer
a verdade, é um agravante".
"Lástima"
"Esse episódio é uma lástima. A
população utiliza esses anúncios
para avaliar o governo", afirma o
cientista político Marcus Figueiredo, coordenador do Laboratório de Pesquisas em Comunicação e Política do Iuperj (Instituto
Universitário de Pesquisas do Rio
de Janeiro). "Se a propaganda é
uma fraude, o governo induz o
eleitor a fazer uma avaliação falsa", completa.
Barros Filho reforça que o fato
de, em uma das propagandas,
apenas as imagens serem enganosas (o governo sustenta que os dados são verídicos) não diminui o
problema ético. "É inaceitável separar o texto da imagem como se
fossem unidades de real sem nenhuma relação. Eticamente, não
pode ser sustentável, em nenhuma situação, esse tipo de recurso",
diz o titular da USP e da ESPM.
Os professores também afirmam que o governo é co-responsável pela propaganda enganosa.
"O próprio código do Conar
[Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária] prevê que o
anunciante e a agência têm a mesma responsabilidade", afirma
Leandro Batista.
Tanto para Figueiredo, do Iuperj, como para Barros Filho, as
propagandas enganosas afetam a
credibilidade das ações do governo. "Põe em dúvida tudo o que já
foi feito", afirma Figueiredo.
"Uma vez traída a confiança, não
se tem mais por que acreditar em
nenhuma outra mensagem que o
governo apresente. Porque quem
frauda na imagem pode fraudar
também no texto", sustenta Barros Filho.
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