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STF pode frear combate a crime financeiro
Ministra Cármen Lúcia foi favorável à anulação de processo sobre lavagem de dinheiro julgado em vara especializada
Decisões tomadas sobre
Banco Santos, "valerioduto",
Banestado e nas ações
penais contra Maluf e Pitta
podem ser invalidadas
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Decisões judiciais tomadas
nos processos do "valerioduto",
Banestado, Banco Santos, Operação Farol da Colina e nas
ações penais contra Paulo Maluf e Celso Pitta, entre outros
casos, poderão ser anuladas se
o STF (Supremo Tribunal Federal) concluir que as varas especializadas para julgar crimes
financeiros e de lavagem de dinheiro ferem a Constituição.
O temor de retrocesso no
combate ao crime organizado é
admitido por juízes federais,
preocupados com o julgamento
de um habeas corpus no STF.
Ao julgar pedido em favor de
um acusado de lavagem no
Ceará, a ministra relatora Cármen Lúcia votou pela anulação
do processo desde a sua origem
e determinou a remessa para a
vara não-especializada onde
começou o inquérito. Consultada, a ministra Cármen Lúcia
não se manifestou.
"É uma decisão muito arriscada. Se prevalecer esse entendimento, o precedente servirá
para que processos relevantes
sejam anulados", diz o juiz federal Jorge Gustavo Macedo
Costa, que julgou o valerioduto
e o Banco Rural. "A decisão pode causar a nulidade de vários
processos", diz Walter Nunes
da Silva Júnior, presidente da
Ajufe (Associação dos Juízes
Federais do Brasil). Tramitam
nas 23 varas especializadas
mais de 30 mil processos.
Para a relatora, a Resolução
314 do CJF (Conselho da Justiça Federal) criando essas varas
em 2003 violou o princípio do
juiz natural (escolhido por sorteio). Segundo ela, o CJF "exorbitara de sua competência ao
definir atribuições de órgãos
judiciais". O ministro Ricardo
Lewandowski pediu vista dos
autos e o julgamento foi adiado.
"Esse voto é um erro total",
diz o ex-juiz Wálter Maierovitch, ex-titular da Secretaria
Nacional Antidrogas. "A resolução do CJF não atenta a
Constituição. Se tirarem do
CJF essa atribuição, teremos
uma Justiça sem mobilidade
para acompanhar o crime organizado", afirma.
A especialização das varas integrou o trabalho do Judiciário,
do Ministério Público, da Polícia Federal, da Receita Federal
e do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Celeridade
O juiz Macedo Costa diz que
"as operações da Polícia Federal não sairiam do papel sem as
varas de lavagem". Ele teme
que o Brasil venha a ser visto
como "país fértil à lavagem".
"Esse trabalho especializado
imprimiu uma celeridade que
não existia. Se as decisões forem anuladas, será mais um fator de impunidade", diz o procurador da República Rodrigo
de Grandis, que atuou nos processos de Maluf e Pitta.
Quando a decisão de um juiz
é anulada, o prazo para a prescrição (extinção da punibilidade do acusado) retroage à data
do crime. Teme-se que haja a
prescrição de vários crimes.
"Os processos correm o risco
de serem anulados com base
numa argumentação um pouco
abstrata", diz o juiz Sérgio Fernando Moro, que julgou os casos Banestado e a Operação Farol da Colina, da PF.
O procurador da República
Vladimir Aras, ex-integrante da
força-tarefa do CC-5, diz que a
manutenção do voto da relatora seria "uma catástrofe". "É
uma decisão gravíssima, pelo
benefício aos que praticaram
crimes de colarinho branco e
pelo volume de bens bloqueados que seriam liberados."
"O Brasil é bem avaliado pelo
Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional) graças às varas especializadas em lavagem", diz Antenor Madruga,
ex-diretor do Departamento de
Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional do Ministério da Justiça. "Sem dúvida, será um retrocesso, mas
acredito que o Supremo manterá a especialização", afirma.
"O Brasil assumiu, sem restrições, compromissos para a
apuração eficaz da lavagem de
valores. Os resultados ainda
não são os esperados e isso
ocorre no mundo inteiro. Mas
são muito melhores do que antes da especialização", diz o juiz
federal Fausto Martin de Sanctis, que julgou os processos do
Banco Santos e do doleiro Antonio Oliveira Claramunt, conhecido como o Toninho
da Barcelona.
Tramita no Supremo habeas
corpus em que um acusado de
lavagem foi processado em Foz
de Iguaçu (PR) e depois os autos foram transferidos para
uma vara especializada em Curitiba. Os ministros Eros Grau e
Carlos Britto indeferiram o pedido. Cezar Peluso pediu vista.
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