São Paulo, domingo, 01 de julho de 2001

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TELECOMUNICAÇÕES
Nova legislação favoreceria redes nacionais de TV e aumentaria poder do Ministério das Comunicações

Projeto de lei dá superpoderes a ministro

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

O anteprojeto da lei de serviços de radiodifusão, colocado em consulta pública pelo ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, no último dia 21, dá superpoderes ao ministério e favorece as redes nacionais de televisão já instaladas no país.
O projeto é mais favorável às redes nacionais de televisão do que a versão preparada pelo Ministério das Comunicações em 1998, segundo as orientações deixadas pelo ex-ministro Sérgio Motta. Essa versão foi engavetada pelo atual ministro.
Segundo o pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB (Universidade de Brasília) Guilherme Canela Godói, o anteprojeto de Sérgio Motta previa que as concessões de TV em posse de um mesmo grupo empresarial não poderiam abranger mais de 30% das residências com aparelho de TV.
Estabelecia também limites para propriedade cruzada de meios de comunicação. Por exemplo: um grupo não poderia controlar, na mesma localidade, uma emissora de TV aberta e uma TV a cabo, ou ainda, uma TV aberta e uma TV paga com sistema de transmissão por microondas.
A limitação à propriedade cruzada, que preservava os direitos adquiridos, foi ignorada na versão atual.
O anteprojeto de Pimenta da Veiga derruba o limite para o número de concessões de TV em poder de um mesmo acionista ou empresa. O teto atual é de dez emissoras (cinco em VHF e cinco em UHF) em todo o país, com o máximo de duas em um mesmo Estado. O texto do anteprojeto permite que um acionista tenha até uma emissora por localidade, sem limite estadual ou nacional.
Guilherme Canela aponta outro dado no anteprojeto que, na avaliação dele, beneficia as grandes redes de televisão: o poder das chamadas cabeças-de-rede (geradoras da programação) sobre suas afiliadas.
Segundo o pesquisador, a versão de Pimenta da Veiga suprimiu quatro artigos do projeto de Sérgio Motta que limitavam o poder das cabeças-de-rede. Um deles dizia que os contratos não poderiam inibir as afiliadas de recusar programação que julgassem inconvenientes à sua comunidade local. Outro proibia a exclusividade de afiliação.
A versão que foi colocada em consulta pública diz que a relação entre a cabeça-de-rede e suas afiliadas deverá ser acordada entre as partes. As redes nacionais de televisão dizem que ainda estão analisando o anteprojeto e que só terão posição sobre ele a partir da próxima semana. Record, SBT, Bandeirantes e TV Cultura devem apresentar uma posição conjunta, independente da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão). Record e SBT não fazem parte da Abert, por divergências com a Globo.
As divergências, segundo executivos ouvidos pela Folha, devem-se a conflitos de interesse. O SBT possui apenas televisão aberta. Bandeirantes e Record têm TV e rádios, ao passo que a Globo tem mídia impressa (jornais e revistas), rádios, TV aberta e empreendimentos em telecomunicações, como acesso à internet em banda larga, TV a cabo, TV paga por satélite e outros.

Ministério forte
O Ministério das Comunicações ganha poder político e financeiro no anteprojeto. Seu caixa será reforçado com 25% da arrecadação das taxas do Fistel (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações). Segundo a assessoria de Pimenta da Veiga, o percentual deve corresponder a uma receita anual aproximada de R$ 100 milhões.
O fundo é controlado hoje pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Mas é no campo político que o ministério sai mais fortalecido. Ele passa a ter o poder discricionário de dispensar a aplicação de regulamentos quando considerá-la ""injusta, indevidamente onerosa ou contrária ao interesse público". Advogados ouvidos pela Folha disseram que o artigo abre espaço até para a intervenção em licitações.
Um dos pontos que aumentam o poder do ministério é o que dá a ele o controle sobre as licitações de rádio e TV, que, segundo o anteprojeto, passarão a seguir exclusivamente a nova lei da radiodifusão, sem ter que obedecer à lei de licitações públicas.
Segundo o pesquisador da UnB, o anteprojeto deixa 33 itens importantes pendentes de regulamentação futura, o que amplia ainda mais o poder do ministério.



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