São Paulo, domingo, 01 de agosto de 2004

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COMÉRCIO EXTERIOR

Os 147 países-membros definiram ontem as diretrizes para liberalização comercial da Rodada Doha

OMC destrava negociações e fecha acordo

Denis Balibouse/Reuters
O ministro das Relações Exteriores Celso Amorim dá entrevista em reunião da OMC em Genebra


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA, EM MADRI


CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os 147 países-membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) aprovaram ontem por consenso o acordo que define as diretrizes básicas para o avanço da Rodada Doha. A ronda de liberalização comercial foi lançada na capital do Qatar, em 2001, mas permanecia parada desde então.
Na tarde de ontem, antes mesmo da aprovação do documento, o Brasil já afirmava que estava "satisfeito", na medida em que "todo o texto relativo a agricultura é essencialmente do G20 [grupo de países em desenvolvimento] e muito influenciado pelo Brasil", conforme a Folha ouviu da delegação brasileira.
"Agora temos um texto equilibrado. Avançamos dezenas de quilômetros em relação a Cancún [onde ocorreu a Conferência Ministerial da OMC em 2003]", afirmou o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim a agências internacionais. "No texto, está claro que os subsídios à exportação agrícola vão desaparecer".
Pelo acordo, o grande ganho para o Brasil vai se dar na área do apoio às exportações agrícolas dos países ricos. Serão eliminados os subsídios, fornecidos essencialmente pela União Européia, e mais bem disciplinados os créditos e outros mecanismos de suporte à exportação, que os EUA usam abundantemente.
Com isso, os países ricos deixam de despejar produtos agrícolas a preços subsidiados em terceiros países, o que barra o acesso da produção brasileira, altamente competitiva, mas que não pode concorrer contra as superpotências como Europa e EUA.
O texto aprovado não fixa data para eliminação dos subsídios. "Mas pelo menos conseguimos virar uma página das negociações", diz Pedro de Camargo Neto, da Sociedade Rural Brasileira.
Já os subsídios internos sofrerão "redução bastante importante", na avaliação de Arancha González, a porta-voz para Comércio da UE. Para ela, significa que a Lei Agrícola dos EUA, bastante generosa aos produtores rurais, terá que ser alterada. Quando é outra história, para mais adiante.
De todo modo, acertou-se que haverá o que o jargão diplomático batiza de "downpayment", uma espécie de entrada, no valor de 20% dos diversos mecanismos de ajuda aos agricultores. "Eqüivale a tudo o que se obteve em seis anos de negociação da Rodada Uruguai [1994]", diz Arancha González.
O terceiro pilar da negociação agrícola (corte de tarifas de importação) parece o menos favorável ao Brasil, na medida em que permite preservar dos cortes os produtos "sensíveis", categoria vaga que abriga tudo o que os países ricos quiserem proteger.
De todo modo, o texto limitará as sensibilidades. Antes, os países ricos podiam escolher quais e quantos produtos proteger. Agora, podem escolher os produtos, mas o número deles será limitado.
Os países em desenvolvimento também poderão proteger seus "sensíveis" e ainda se cria uma categoria de produtos "especiais", hiper-sensíveis para certos países em desenvolvimento.
O acordo prevê, de todo modo, que haverá cortes nas tarifas de importação de produtos agrícolas, sensíveis ou não. Os cortes, como queria o Brasil, serão tanto maiores quanto mais altas as tarifas (as tarifas agrícolas brasileiras são, em geral, bem mais baixas que as da UE, dos EUA, para não falar das escandalosas tarifas japonesas).
Para conseguir um texto agrícola como mais ou menos queria, o Brasil teve que ceder em bens industriais.
Os negociadores brasileiros não aceitavam negociações setoriais, que funcionam assim: se é para cortar tarifas para, por exemplo, eletrônicos, todos têm que cortar. O Brasil preferia uma barganha de outra natureza: se os EUA cortassem tarifas para produtos siderúrgicos, por exemplo, o Brasil cortaria em algum outro setor que não lhe interesse proteger.
O texto deixou em aberto se a negociação setor por setor será obrigatória ou voluntária, o que significa transferir a disputa para outra fase da Rodada Doha.


Com agências internacionais



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