São Paulo, sexta-feira, 01 de setembro de 2006

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Renata Lo Prete

O fator Lembo

NUMA CAMPANHA carente de atrativos, Cláudio Lembo faz sozinho a alegria dos mancheteiros. Desde a entrevista à Folha em maio, na qual responsabilizou a insensibilidade da "elite branca" pelo levante do crime organizado em São Paulo, o governador não parou mais.
Na semana passada, previu a derrota de Geraldo Alckmin no primeiro turno presidencial. Anteontem, repreendeu FHC por criticar Lula.
Quem procura Lembo à cata de uma declaração de impacto, em especial contra os tucanos, não sai de mãos abanando.
Lembo goza do privilégio de falar o que quer sem risco de ouvir o que não quer. Quando reclama do governo federal, Lula e Márcio Thomaz Bastos preferem contemporizar, de olho na preservação dessa fonte de constrangimento para Alckmin. Este, por sua vez, tem de engolir seja o que for, sob pena de potencializar o desgaste.
Há quem interprete a metralhadora de Lembo como reação típica de alguém que passou a vida na condição de número dois -de Olavo Setúbal no Banco Itaú, de Marco Maciel no PFL, de Alckmin no Palácio dos Bandeirantes- e de repente se viu no centro da cena.
Sua atitude é oposta à do também pefelista Gilberto Kassab, que herdou de José Serra a prefeitura da capital. Para além do estilo de cada um, o contraste tem explicação simples: Kassab persegue um futuro na política, a começar pela reeleição em 2008, enquanto Lembo, aos 71 anos, dá sinais de que não pretende concorrer a mais nada.
Seria ingênuo, porém, considerá-lo o Chapeleiro Louco da aliança tucano-pefelista. Ainda que o comando do PFL faça cara de preocupação, é evidente que Lembo vocaliza, além de seu contencioso pessoal com Alckmin, a contrariedade original do partido com essa candidatura -não por acaso, Serra é o tucano mais poupado da língua ferina do governador.
Lembo é um fenômeno de mídia, não de público. Os números do Datafolha mostram que a avaliação do governo paulista despencou em seu período. Talvez esse seja um dos componentes do estreitamento da vantagem de Alckmin sobre Lula no Estado, mas é improvável que o palpite de Lembo sobre o placar da eleição tenha conseguido, sozinho, piorar de maneira significativa um quadro já bastante ruim.
O estrago se dá mais no plano simbólico, a partir de um raciocínio singelo: o fato de Alckmin não ter conseguido "fidelizar" nem mesmo o vice para quem deixou a cadeira de governador lança dúvidas sérias sobre sua capacidade de agregar quem quer que seja.
Se o prognóstico de Lembo se confirmar, o PFL não veria problema em devolver Alckmin a Pindamonhangaba.


RENATA LO PRETE é editora do Painel

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