São Paulo, Quarta-feira, 01 de Setembro de 1999
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ELIO GASPARI
FFH ganhou uma, a do Enem

O governo de FHH acaba de conseguir um de seus maiores êxitos. É o Exame Nacional do Ensino Médio, Enem. Ele vai acabar com a praga do vestibular, que mutilou o aprendizado de diversas gerações de brasileiros. Mais de 300 mil estudantes de 162 cidades fizeram a prova de qualificação. Foi um teste sem pegadinhas ou perguntas cretinas.
Segundo o ministro da Educação, professor Paulo Renato Souza, o Enem poderá significar o fim do vestibular num prazo de quatro ou cinco anos. Como esse é o terceiro prazo que ele oferece, pode ser que a praga sobreviva por mais algum tempo, mas garantiu o essencial: o suplício do vestibular está com os dias contados.
Os jovens poderão usar suas notas no Enem como um dos ingredientes no acesso às universidades. Algumas das melhores instituições do país já decidiram aceitar as notas do exame federal como um dos parâmetros para a seleção de seus estudantes. Algum dia elas servirão também para uma avaliação dos colégios, sobretudo os particulares, que cobram os olhos da cara e, escondidos atrás da irracionalidade das provas do vestibular, oferecem um ensino viciado.
Há uma corrente crítica do Enem. Ela sustenta que o exame federal acabará dando melhores notas para os alunos de colégios caros, que são melhor preparados. Trata-se de falsa polêmica, pois se um garoto está numa escola pública que lhe dá mau ensino é preferível descobrir isso no exame federal do que depois de se submeter à ansiedade do vestibular. Condenar um exame porque ele revela que há escolas ruins (e que essas escolas se concentram nas regiões mais pobres do país) seria a melhor maneira de varrer para baixo do tapete as deficiências pedagógicas da rede pública. Além disso, é possível que se tenha boas surpresas, tais como escolas públicas com bons resultados e colégios privados com notas desastrosas.
Cinco anos depois da entrada do professor Paulo Renato no Ministério da Educação, o tabu do vestibular está quebrado. Há ainda muito chão pela frente. A inscrição de 340 mil alunos é um belo resultado, mas equivale a uma parcela ainda pequena dos jovens que cursam o ensino médio. É o caso de pensar se o exame não deveria ser aplicado também às outras séries. Dada no último ano, a prova tem o peso de uma sentença. Dada no início do curso, teria o valor de uma advertência.
Essas ressalvas são meros detalhes diante da mudança que o Enem poderá provocar no processo pedagógico. Com uma prova mais racional, ele fere o centro da malignidade do vestibular, pois o que ele tem de mais perverso é a estupidez dos exames. Os colégios deixaram de ensinar física e passaram a ensinar truques para resolver problemas que podem cair nas provas de seleção.
Se fossem problemas que exigissem raciocínio, tudo bem, mas o que mais se via nas provas eram pequenas charadas. Com o Enem, as grandes universidades podem se dar ao luxo de organizar exames mais reflexivos. Um estudante que conseguiu boas notas no exame federal pode ir para o vestibular mais seguro de si, certo de que uma pegadinha não lhe custará um ano de vida e de expectativas familiares.
Noves fora a demora, o Enem é uma lição para o governo. Conseguiu um êxito sem gastar dinheiro, sem tentar reordenar o mundo. Bastou-lhe pegar uma idéia banal, trabalhar com a velocidade que lhe foi possível e, sem polêmicas, introduziu na vida nacional uma novidade com a qual todos ganham e ninguém perde.


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