São Paulo, segunda-feira, 01 de outubro de 2007

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Terras improdutivas vão para os Calheiros

Três anos depois de a desapropriação de duas fazendas ter sido declarada, processo foi revisto pelo Incra

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Duas fazendas classificadas como improdutivas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), em processos para a inclusão na reforma agrária, foram parar nas mãos da família Calheiros, em Murici (AL), segundo documentos obtidos pela Folha.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a decretar a desapropriação de uma delas, após recomendação do então ministro Raul Jungmann (Política Fundiária) -que, ao saber, pela Folha, do ocorrido, disse que o caso era "raríssimo e muito estranho".
A segunda representação que Renan Calheiros (PMDB-AL) enfrenta no Conselho de Ética do Senado inclui denúncias de que ele e seu irmão, o deputado Olavo Calheiros (PMDB-AL), teriam promovido grilagem de terras em Murici, terra natal da família. A representação trata também da suspeita de que Renan tenha atuado para beneficiar a fabricante de bebidas Schincariol.
Grande parte das propriedades dos Calheiros pertencia à extinta usina Bititinga, entre as quais a fazenda Bananeira, em nome de Olavo, mas explorada por Renan, segundo seu imposto de renda.
Em dezembro de 1995, técnicos do Incra concluíram que as terras da usina, desativada, eram improdutivas. Recomendaram a desapropriação das áreas Alegria e Santo Aleixo.
Em 23 de abril de 1996, a Superintendência do Incra de Alagoas enviou ofício à sede do órgão, em Brasília, reiterando que as fazendas eram improdutivas e recomendando sua desapropriação para que fossem encaminhadas "para reforma agrária por interesse social".
No mesmo ano, Jungmann encaminhou o ofício ao ex-presidente FHC, que decretou a desapropriação da fazenda.
A compra das duas fazendas foi fechada por Olavo em 1997, mas só em 1999 foram registradas em nome dos Calheiros. A Santo Aleixo foi passada para a mulher de Olavo, Weruska. A Alegria foi rebatizada de Boa Vista, segundo o Incra.
O órgão informou que os processos de desapropriação foram revistos, e as propriedades foram declaradas produtivas em 1999 -três anos depois de terem sido declaradas como improdutivas.
"Não tenho dúvida de que houve ingerência política da família Calheiros para adquirir as terras de forma irregular. Denunciamos isso ao Incra na época, mas só obtivemos o silêncio", disse o coordenador da Comissão Pastoral da Terra em Alagoas, Carlos Lima. Renan era, então, ministro da Justiça.
Genival Mendes, que processa Olavo por grilagem de outras terras, diz que a mudança de nome da Alegria foi uma manobra para que a fazenda não fosse incluída na reforma agrária.
Ex-funcionário da Bititinga, Genival conta que Olavo já administrava as terras desde o começo dos anos 1990, sob a forma de arrendamento. Em 1997, antes de ter as fazendas em seu nome, Olavo doou R$ 37 mil para a Bititinga, já falida.
Jungmann explicou que, mesmo após o decreto presidencial, um processo pode ser revisto, pois o proprietário da terra declarada como improdutiva pode recorrer. Mas disse que isso é incomum, pois é a equipe do próprio Incra regional que faz a revisão.


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