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Terras improdutivas vão para os Calheiros
Três anos depois de a desapropriação de duas fazendas ter sido declarada, processo foi revisto pelo Incra
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Duas fazendas classificadas
como improdutivas pelo Incra
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), em
processos para a inclusão na reforma agrária, foram parar nas
mãos da família Calheiros, em
Murici (AL), segundo documentos obtidos pela Folha.
O ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso chegou a
decretar a desapropriação de
uma delas, após recomendação
do então ministro Raul Jungmann (Política Fundiária)
-que, ao saber, pela Folha, do
ocorrido, disse que o caso era
"raríssimo e muito estranho".
A segunda representação
que Renan Calheiros (PMDB-AL) enfrenta no Conselho de
Ética do Senado inclui denúncias de que ele e seu irmão, o
deputado Olavo Calheiros
(PMDB-AL), teriam promovido grilagem de terras em Murici, terra natal da família. A representação trata também da
suspeita de que Renan tenha
atuado para beneficiar a fabricante de bebidas Schincariol.
Grande parte das propriedades dos Calheiros pertencia à
extinta usina Bititinga, entre as
quais a fazenda Bananeira, em
nome de Olavo, mas explorada
por Renan, segundo seu imposto de renda.
Em dezembro de 1995, técnicos do Incra concluíram que as
terras da usina, desativada,
eram improdutivas. Recomendaram a desapropriação das
áreas Alegria e Santo Aleixo.
Em 23 de abril de 1996, a Superintendência do Incra de
Alagoas enviou ofício à sede do
órgão, em Brasília, reiterando
que as fazendas eram improdutivas e recomendando sua desapropriação para que fossem
encaminhadas "para reforma
agrária por interesse social".
No mesmo ano, Jungmann
encaminhou o ofício ao ex-presidente FHC, que decretou a
desapropriação da fazenda.
A compra das duas fazendas
foi fechada por Olavo em 1997,
mas só em 1999 foram registradas em nome dos Calheiros. A
Santo Aleixo foi passada para a
mulher de Olavo, Weruska. A
Alegria foi rebatizada de Boa
Vista, segundo o Incra.
O órgão informou que os
processos de desapropriação
foram revistos, e as propriedades foram declaradas produtivas em 1999 -três anos depois
de terem sido declaradas como
improdutivas.
"Não tenho dúvida de que
houve ingerência política da família Calheiros para adquirir
as terras de forma irregular.
Denunciamos isso ao Incra na
época, mas só obtivemos o silêncio", disse o coordenador da
Comissão Pastoral da Terra em
Alagoas, Carlos Lima. Renan
era, então, ministro da Justiça.
Genival Mendes, que processa Olavo por grilagem de outras
terras, diz que a mudança de
nome da Alegria foi uma manobra para que a fazenda não fosse incluída na reforma agrária.
Ex-funcionário da Bititinga,
Genival conta que Olavo já administrava as terras desde o começo dos anos 1990, sob a forma de arrendamento. Em 1997,
antes de ter as fazendas em seu
nome, Olavo doou R$ 37 mil
para a Bititinga, já falida.
Jungmann explicou que,
mesmo após o decreto presidencial, um processo pode ser
revisto, pois o proprietário da
terra declarada como improdutiva pode recorrer. Mas disse
que isso é incomum, pois é a
equipe do próprio Incra regional que faz a revisão.
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