São Paulo, segunda-feira, 01 de novembro de 2004

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ENTREVISTA DA 2ª

MARIA HERMÍNIA TAVARES DE ALMEIDA e RENATO LESSA

POSITIVO

Segundo Maria Hermínia Tavares de Almeida, disputa em São Paulo reproduz melhora do cenário político nacional

Campanhas ficaram mais racionais, diz cientista política

RAFAEL CARIELLO
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU

Para a cientista política Maria Hermínia Tavares de Almeida, a vitória do tucano José Serra fortalece o governador Geraldo Alckmin na disputa interna do PSDB para a escolha do candidato à Presidência, em 2006, por dar força à legenda em São Paulo.
Mesmo que não ganhasse, disse a professora da USP para a Folha em Caxambu (MG), onde participou do 28º Encontro Anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), ainda antes da eleição de ontem, não seria de todo mal -ela votou no tucano-, já que também Marta Suplicy (PT) era uma boa candidata.
"Essa eleição reproduz no plano do município o que já aconteceu no plano nacional. A competição melhorou muito de qualidade", declara, reconhecendo convergência ideológica entre os partidos -o que a seu ver também contribui para a melhoria do debate, que se torna mais "racional". "Houve um amadurecimento do eleitorado, por meio da própria competição política."
 

Folha - O resultado da eleição em São Paulo pode influenciar o pleito presidencial de 2006?
Maria Hermínia Tavares de Almeida -
É uma derrota importante para o PT -porque é uma cidade importante e, Marta, uma liderança do partido. Equilibra um pouco mais a distribuição das forças nacionais. Não creio que seja algo que altere fundamentalmente a disputa em 2006, que ainda não está muito clara. Do lado do PSDB, é provável que seja o Alckmin [o candidato]. Mas o PSDB tem três pré-candidatos: Tasso, Aécio e Alckmin.

Folha - A disputa entre os três é para escapar do confronto com Lula e empurrar os outros?
Maria Hermínia -
Em geral, o candidato no posto tem muita chance de se reeleger, em qualquer circunstância. Se bem que concorrer, mesmo perdendo, não é mal. Nenhum dos candidatos do PSDB tem reconhecimento nacional ainda. Para construir essa imagem nacionalmente, participar de uma eleição, mesmo perdendo, não é mal. É sempre melhor ganhar, mas não enfraquece o candidato.

Folha - Ganhando em São Paulo, Serra fortalece o Alckmin?
Maria Hermínia -
Claramente. O PSDB fortalece sua posição em São Paulo, mas tem um problema complicado para 2006, que é a eleição para governador. Não tem candidato e usou o seu candidato possível, o Serra, na disputa municipal. Já passou a época em que aparecia um candidato do nada e ganhava. Não há candidato, nem entre os secretários do Alckmin nem entre os deputados mais votados. O PT tem nomes já consagrados -[José] Genoino, [Aloizio] Mercadante, [José] Dirceu e a própria Marta.

Folha - Houve de fato polarização entre PSDB e PT nessas eleições?
Maria Hermínia -
Não. É verdade que o PSDB e o PT surgem como os partidos nacionais mais importantes, mas o sistema continua muito plural. O PMDB é o que tem o maior número de prefeituras. Vai enxugar o sistema partidário? Acho que não. PT e PSDB serão os pivôs de coalizões. O PFL não tem candidato [presidencial], o PTB também não, PP, PSB.

Folha - Esses dois pivôs podem se diferenciar numa disputa eleitoral em que termos?
Maria Hermínia -
De um lado, é claro que o centro da disputa é entre eles. Por outro, houve convergência de políticas e percepções sobre o Brasil. Os dois estão no centro e convergiram para o reconhecimento de que, de alguma forma, o destino econômico do país está associado a uma forma de integração na economia mundial. Talvez o debate seja acirrado em relação a quem é capaz de fazer com maior competência uma agenda que será muito parecida.
A situação é um pouco parecida com a das democracias antigas. Não que os partidos não tenham diferenças, mas o debate se dá no interior de um terreno comum. Isso se deu entre o fim da Segunda Guerra e a década dos 70 nos países industrializados. Vai ficar um debate talvez até mais racional.

Folha - Às vezes não dá a impressão de que vai para o outro lado? Uma disputa em torno de imagens?
Maria Hermínia -
Nesta campanha, se discutiu muita coisa. No caso de São Paulo, visões diferentes sobre como é que se faz política social. Em cima disso vem se é bonito ou feio. Lógico que tem propaganda negativa, disputa de imagens. A sensação que tenho é que a Marta optou por coisas de grande visibilidade. Equacionou bem o transporte, o trânsito. O Passa Rápido é muito bom. Para os pobres. Nós não conseguimos andar na rua, mas o ônibus vai. O CEU não. É um brizolão. Muito caro e não há evidências de resultados pedagógicos razoáveis.
Essa eleição reproduz no plano do município o que já aconteceu no plano nacional. A competição melhorou muito de qualidade. O grande ganho é não termos que resolver em quem votar para não eleger o [Paulo] Maluf. Posso achar que São Paulo estará melhor com o Serra, mas não estaria péssimo com a Marta. É diferente do [Celso] Pitta, do Maluf, do Jânio Quadros. Houve amadurecimento do eleitorado, por meio da própria competição política.


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