São Paulo, segunda-feira, 01 de novembro de 2004

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ANÁLISE

PT foi empurrado para os grotões do país

RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL

O PT tentará invocar algumas vitórias importantes de primeiro turno, como as obtidas em Belo Horizonte e Recife, para escapar à conclusão maior das eleições municipais deste ano: o partido, que iniciou sua escalada rumo ao poder federal em médias e grandes cidades das regiões mais desenvolvidas, está sendo empurrado para os grotões do país.
Não significa que tenha ficado restrito aos grotões. Mas o sentido do movimento realizado pela sigla de Lula foi esse, o que fica claro quando se tomam não apenas os resultados das capitais mas também os do interior "que importa".
Olhando o mapa a partir do sul, o cenário de terra arrasada só começa a melhorar em Minas.
No Rio Grande do Sul, há quase duas décadas uma espécie de república autônoma petista, o partido perdeu Porto Alegre, Caxias do Sul e Pelotas. Teve vitórias, como em Santa Maria. No geral, regrediu ao porte de sigla média.
No Paraná, a derrota em Curitiba foi acompanhada de outras nas principais cidades do Estado. A exceção foi Londrina, onde o PT enfrentou uma espécie de Paulo Maluf local. Em Santa Catarina, derrotas em Joinville e Blumenau.
Em São Paulo, nem o revés maior na capital consegue eclipsar as dimensões do estrago no interior. A "Califórnia vermelha" de 2000 foi tingida pelo azul dos tucanos. À derrota em Campinas no primeiro turno somou-se a de Santos no segundo. E por aí vai.
De Minas para cima, há resultados melhores e piores para o PT, mas o padrão de desempenho se mantém mais ou menos inalterado: aumento no número de prefeituras combinado com diminuição de "qualidade" no cartel de municípios administrados.
Não é preciso muita ciência para perceber que o movimento petista em direção aos grotões corresponde a um recuo na sustentação do partido entre as classes médias que durante duas décadas sustentaram-lhe a expansão.
Por ora, não há elementos para afirmar que o eleitor tenha julgado o governo Lula. A própria oposição se encarregou de deixar o presidente, ainda bastante sólido nas pesquisas, fora do debate.
Por outro lado, a safra de indicadores positivos na economia não ajudou os candidatos petistas, ao contrário do que dirigentes chegaram a prever. Ou bem o eleitor não sentiu a recuperação, ou não a levou em conta na hora de votar.
De todo modo, o tamanho do desastre sugere que mesmo na capital paulista pode ter ocorrido algo maior do que aquilo que José Genoino se apressou em classificar como "rejeição pessoal" a Marta. Se Lula não foi julgado, é provável que o PT tenha sido.
O efeito mais imediato se dará em Brasília, onde a indocilidade da base aliada já se fazia sentir no pós-primeiro turno. Cedo o governo concluirá que o namoro com o PTB será insuficiente para lhe dar solo firme no Congresso.
O PMDB, que tem cinco de seus seis governadores defendendo o rompimento com o Planalto, terá de ser alimentado (na mesma hora em que petistas derrotados buscarão emprego na capital).
De cara, tal realidade se choca com o sonho de João Paulo e José Sarney. Para aprovar a reeleição no Congresso, o Planalto precisaria, na prática, implodir o PMDB.
Quanto à outra reeleição, a de Lula, é prematuro dizer que esteja ameaçada. Vide FHC em 1996 etc. Mas talvez seja necessário atualizar a equação. Até ontem se dizia que o presidente, com algo como 4% de crescimento em 2005, chegaria imbatível a 2006.
Agora é mais realista sugerir que, se Lula tiver apenas o crescimento, sem costura política resistente, poderá enfrentar segundo turno trabalhoso. Se não tiver nem os 4%, a história será outra.


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