São Paulo, quinta-feira, 01 de novembro de 2007

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JANIO DE FREITAS

Os fins do comando

Pintou improbidade no horizonte, já se sabe como agirá a tropa de elite do governo na Câmara e no Senado

A ASSOCIAÇÃO DO governo Lula com a corrupção já sugere algo como um princípio, ainda que paradoxalmente formado por falta de princípio. Não se trata só da série incessante de episódios no governo, que ao menos em boa parte poderiam decorrer de más atitudes individuais, embora não seja esse o caso. Mas, além dos fatos em âmbito administrativo ou, senão diretamente, envolvendo verbas federais, as ordens do governo aos seus parlamentares comprovam a associação deliberada com atos e autores de improbidades e coisas piores. Só ontem, houve mais duas demonstrações desse gênero.
A CPI do Apagão Aéreo criada pelo Senado foi muito mais eficiente do que sua congênere da Câmara, deformada por exibicionismos liderados pelo neófito Vic Pires, paraense do DEM, e reduzida à inutilidade pelo relatório fugidio do petista gaúcho Marco Maia, em coerência com a orientação do governo. O relatório da CPI do Senado teve a rigidez sempre esperável do seu relator, senador Demóstenes Torres. Os negócios da Infraero, sobretudo os de obras à brasileira nos aeroportos, com nomes e indicações factuais, lá entraram como uma novidade que parecia inalcançável.
No Senado o governo não consegue resolver tudo com sua tropa de elite, como pode fazer na Câmara. Na ocasião de votar o relatório, a ordem foi usar os recursos possíveis para adiá-la. Até que, ontem, lá estava um relatório alternativo, tão amoldado quanto possível às orientações do governo. Não é preciso mais do que uma particularidade para definir o teor do relatório alternativo apresentado pelo senador amazonense João Pedro: da relação de indiciados proposta por Demóstenes Torres foram retirados até mesmo três que o governo já demitira.
João Pedro diz que retirou nove da lista "para fazer justiça", mas o indiciamento era exatamente para submeter suspeitos e implicados aos procedimentos corretos de justiça, porém justiça sem vício. O governo, com a sempre valiosa (em todos os sentidos) cumplicidade do PMDB, evitou que o relatório de Demóstenes Torres ficasse como conclusão oficial da CPI, mas não que seja encaminhado à Polícia Federal e ao Ministério Público.
A novata CPI das ONGs, com um tema tão importante para os cofres públicos e para as ONGs sérias, fez mais uma sessão para exibir, na simples relação dos que convém convocar, que os obedientes governistas estão ali para proteger aliados do governo, não importa o que tenham feito ou não. Ou melhor, o que importa é não expor o que certos companheiros e aliados têm feito, com altas verbas públicas, sob a denominação de ONG.
Assim tem sido nas CPIs, mas não só. Pintou improbidade no horizonte, já se sabe como agirá a tropa de elite do governo na Câmara e no Senado. O PMDB ofereceu à TV o papel de comediante dado ao senador (suplente) e financiador Wellington Salgado e, como coadjuvantes, o também suplente Gilvan Borges e um ou outro mais, mas o grande operador de cobertura de Renan Calheiros foi o governo. E Lula em pessoa. O caso só tomou o caminho absurdo pelo ocorrido já nas duas primeiras sessões do Conselho de Ética, por orientação do governo à sua tropa de elite. Naquele mau começo e desde então até hoje.
Tamanha coerência e sem-cerimônia não é sem significado, nem se mantém ao acaso.


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