São Paulo, sábado, 01 de dezembro de 2007

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entrevista

TV de Lula tem Estado demais, diz professor

DA REPORTAGEM LOCAL

Celso Schröder, 54, é professor do curso de jornalismo da PUC-RS e coordenador-geral do FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), movimento nascido em 1991 para reivindicar o controle social da mídia e mudar a legislação sobre os meios de comunicação no país. O fórum foi fundado por sindicatos, pela UNE e por siglas como o PT. Schröder afirma que a TV Brasil, tal como está hoje, é "uma TV estatal com algum caráter público" e está sujeita a muitas interferências da Presidência da República. Primo de Carlos Henrique Schroder, diretor da Central Globo de Jornalismo, o professor critica ainda a opção do governo por nomear personalidades, como o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, para o conselho da TV. "Eu prefiro que fique na mão das corporações, pelo menos elas representam muito mais pessoas do que simplesmente a consciência dos indivíduos." Confira abaixo os principais trechos da entrevista. (LB)

 

FOLHA - O Brasil precisa de uma TV pública?
CELSO SCHRÖDER -
Precisa. Todos os países, de alguma maneira, possuem alguma coisa nesse sentido. A TV pública não é um capricho. Informação precisa ser tratada como bem universal, como luz e educação. O Brasil precisa mais da TV pública do que outros países porque temos uma hipertrofia do sistema comercial televisivo no país.

FOLHA - Por quê?
SCHRÖDER -
Entramos em um curto-circuito de forma e conteúdo. Isso causa um problema para o próprio sistema, para as redes hegemônicas, que acabam se pautando por elas mesmas. Isso cria, obviamente, um esgotamento de modelo.

FOLHA - Como falar em esgotamento do modelo se ele mantém as TVs lucrativas?
SCHRÖDER -
O grande problema que exige uma televisão pública é o esgotamento das linguagens. O modelo comercial, pelas próprias características de consumo que o público exige e que as empresas precisam disponibilizar para garantir e maximizar os lucros, não permite a elas grandes investimentos, grandes ousadias de criatividade, de linguagem, as fórmulas prontas são as que acabam sendo reforçadas. As audiências das televisões vêm caindo, até da Globo.

FOLHA - O sr. fala de inovação de conteúdo. As pessoas que o governo trouxe para fazer a TV pública são provenientes da grande mídia que o sr. critica, como Tereza Cruvinel e Franklin Martins, ambos da Globo. Isso não é contraditório?
SCHRÖDER -
É uma TV pública que sai pautada pelos seus paradoxos. Não temos ninguém de Marte para trazer. Nós todos faríamos isso e todos estamos pautados por essa televisão. Sou um crítico do modelo da Globo, mas não saberia fazer outra televisão a não ser que começássemos a experimentar.

FOLHA - O governo elegeu a BBC como seu modelo. A TV inglesa tem orçamento de 2,8 bilhões de libras. O orçamento da TV pública para o próximo ano é de R$ 350 milhões. Como cumprir esse objetivo com esse orçamento?
SCHRÖDER -
Esse é um dos elementos criticáveis do projeto. Nesse momento, os recursos são escassos. Por isso me parece que em vez de ser uma televisão pública, uma rede pública, como chegou a ser anunciado, o que foi feito até agora foi simplesmente a fusão de duas empresas, criou-se uma TV estatal com algum caráter público.

FOLHA - Por quê?
SCHRÖDER -
O conselho da TV não retira o Estado, ao contrário, o Estado está fortemente presente na estrutura de gestão. Por enquanto, o modelo brasileiro é absolutamente igual ao das TVs comerciais brasileiras. Nesse desenho que o governo faz, há um conselho técnico e abaixo há a direção técnica. Acima dele está a Presidência da República.
O argumento do ministro Franklin tem sido um tanto ingênuo, que não coincide com a capacidade e a inteligência dele. Ele diz que isso se justifica porque o presidente Lula tem 60 milhões de votos e que isso daria a ele autoridade democrática para escolher a direção técnica.
Bem, óbvio, 60 milhões de votos, com esse argumento, podemos fechar Congresso, fazer o que quiser, não há mediação democrática.

FOLHA - Mas há o Conselho Curador, que terá economistas, esportistas, professores...
SCHRÖDER -
Nós achamos mais democrático conselhos em que a sociedade civil fosse representada não pelos seus expoentes individuais, mas pelas suas instituições. Levamos esse argumento ao ministro, mas ele tem refutado dizendo que prefere a representação difusa, de personalidades, porque isso evitaria que o conselho ficasse na mão das corporações. Eu prefiro que fique na mão das corporações, pelo menos as corporações representam muito mais pessoas do que simplesmente a consciência dos indivíduos.

FOLHA - Muitas das corporações são ligadas ao PT.
SCHRÖDER -
Não pode ser o conselho do PT, ou de um setor. Se fizer isso, leva a TV ao fracasso. Se o Estado fez um lugar para mandar, começou do lugar errado.


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