São Paulo, sábado, 01 de dezembro de 2007

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"Não entendo nada de TV", diz indicado ao conselho

Cavalcanti Filho diz que TV não pode ser um "instrumento de proselitismo"

Cláudio Lembo vê riscos de a TV pública se transformar em uma rede chapa-branca: "Não sou ingênuo, esse é um risco grande", declarou

DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DO RIO

Os conselheiros da TV Brasil terão duas missões. Zelar pela independência da nova emissora diante do governo federal e fiscalizar a qualidade da programação oferecida. Sabem que nenhuma delas será fácil, pelos mais variados motivos.
"Não entendo nada de TV", admite José Antonio Fernandes Martins, vice-presidente do Conselho de Administração da Marcopolo e uma das 20 pessoas nomeadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para compor, durante quatro anos, o conselho curador da nova emissora pública -e talvez até por mais tempo, já que ainda não foi definido como estes nomes serão substituídos.
Ele disse ter aceitado o convite, feito pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, porque "o Brasil é muito fraco de programas culturais, educativos, como aqueles "faça você mesmo" da TV americana. Temos que mostrar para o povão que televisão não é só filme com tiroteio e novela em que a mulher trai o marido".
Cada conselheiro receberá R$ 2 mil por mês, mais despesas de viagem e estadia.
O advogado José Paulo Cavalcanti Filho, presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso e ministro (interino) da Justiça no governo José Sarney, afirma que há cinco anos quase não lê jornal ou vê televisão porque está escrevendo uma biografia de Fernando Pessoa. Ele destaca que a nova TV não pode ser um "instrumento de proselitismo" e que, se for assim, é melhor usar o dinheiro em escolas.
O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos diz que só o tempo mostrará qual o caráter da emissora, se apoiará ou não o presidente Lula. "Uma iniciativa governamental pode ser vista por ângulos não muito favoráveis. Acho que a execução esclarecerá." Em 2005, ele acusou a oposição de usar o mensalão para aplicar um "golpe branco" contra o governo.
Já Cláudio Lembo, ex-governador de São Paulo e autor da expressão "elite branca", vê riscos de a TV pública se transformar em um órgão chapa-branca, de apoio ao Palácio do Planalto. "Não sou ingênuo, esse é um risco grande", afirma o membro do DEM. "Vou ser muito presente para que se preserve identidade e coerência."
Os conselheiros podem afastar membros da diretoria executiva da TV, até mesmo a presidente da emissora, Tereza Cruvinel, caso identifiquem problemas graves na programação. Se isso acontecer, a maioria dos conselheiros deve emitir dois votos de desconfiança, em um prazo de 12 meses, com intervalo de 30 dias. Problema: quatro membros do conselho são representantes de ministérios, mais sujeitos a pressões do governo federal.
"Ninguém no conselho vai tolerar qualquer interferência", assegura o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, que está cotado para presidir o conselho -eleitor de Lula em 2002, ele disse que votaria em José Serra se o tucano fosse candidato à Presidência da República em 2006. "Se alguém tentar fazer alguma coisa em contrário, peço demissão. Acho a manipulação uma das coisas mais ridículas, mais grotescas dos meios de comunicação."
Lembo, que diz se informar principalmente pela internet e pelos programas da TV Câmara e TV Senado, defende uma programação voltada à história do país, para divulgar as tradições brasileiras. Belluzzo gostaria de ver um programa de entrevistas como o "Hard Talk", da BBC inglesa, emissora que aprecia muito -" o entrevistador é implacável com todo mundo" .

Audiência
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que já foi o homem mais poderoso da TV Globo e hoje é dono da TV Vanguarda, diz que não será sua função se envolver com a programação do canal público. Mas, por e-mail, ele mostra que tem idéias claras sobre o papel educativo da emissora:
"Considero um bom projeto se não houver interferência do Estado. Vejo como coisa de longo prazo e uma boa oportunidade para fazer algumas múmias da rede educativa começarem a se modernizar."
A cenógrafa e carnavalesca Rosa Magalhães imagina uma emissora pública com programação variada e "de preferência, com audiência".
"Se põe títulos como "programa educativo", já fica cacete. E não tem esse negócio de que criança não pode ver TV. Pode ver sim, faz muito bem. Sempre fiz dever do colégio com TV ligada e nunca me atrapalhou."
(LEANDRO BEGUOCI, FERNANDO BARROS DE MELLO, LUIZ FERNANDO VIANNA e ITALO NOGUEIRA)


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