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CRISE NO GOVERNO/CERCO AO EX-MINISTRO
Assessor de Márcio Thomaz Bastos estava na casa de Palocci quando extrato foi entregue
Palocci ordenou a Mattoso violação do sigilo do caseiro
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Antonio Palocci Filho, ministro
da Fazenda em 16 de março, ordenou diretamente ao então presidente da Caixa, Jorge Mattoso,
que violasse o sigilo bancário do
caseiro Francenildo Costa. Pressionou o colega Márcio Thomaz
Bastos a pedir que a Polícia Federal acobertasse sua conduta,
ameaçando revelar a presença de
um auxiliar direto do ministro da
Justiça em sua casa na noite daquela quinta, quando Mattoso lhe
entregou o extrato do caseiro.
Segundo relatos obtidos pela
Folha, Palocci fez pressões até a
última hora para permanecer no
cargo. Discutiu com Mattoso e
Thomaz Bastos duramente na segunda-feira passada, dia de sua
queda. Mattoso rejeitou assumir
sozinho a culpa.
Por telefone, Palocci chegou a
pedir ao presidente Luiz Inácio
Lula da Silva que não fosse demitido, mas afastado temporariamente. Lula, porém, respondeu
secamente que não dava. Havia
acabado de ser informado de que
não havia mais dúvida de que Palocci ordenara a violação do sigilo
do caseiro, apesar de o então ministro ter negado isso várias vezes
no decorrer do imbróglio.
Palocci deu a ordem para Mattoso quebrar o sigilo na tarde de
16 de março, quando lhe disse que
tinha a informação de que o caseiro recebera soma de dinheiro e
que suspeitava que havia sido
comprado pela oposição para atacá-lo. De noite, Palocci convidou
o secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg, para ir à sua casa.
Lá, encontrou também Mattoso.
A membros do governo, Goldberg disse que não presenciou a
entrega do extrato.
Na sua versão, Palocci e Mattoso teriam se reunido a sós no escritório, e o então ministro da Fazenda teria pedido que a PF investigasse Francenildo por falso testemunho e suborno para mentir
sobre uma autoridade.
Palocci, que estava acompanhado por seu assessor Marcelo Netto, disse que "a imprensa" divulgaria que o caseiro havia recebido
recursos incompatíveis com sua
renda de R$ 700 mensais. Segundo seu relato, ele não viu o extrato,
mas ouviu pedido de Palocci para
acionar a PF.
No dia seguinte, o chefe-de-gabinete de Thomaz Bastos, Cláudio
Alencar, relatou ao ministro que
Palocci havia pedido a Goldberg
para a PF investigar Francenildo.
No mesmo dia, o extrato vazou
por meio do blog da revista "Época".
Oficialmente, a PF começou a
investigar o caseiro na quinta-feira seguinte, dia 23, e o colocou sob
suspeita de lavagem de dinheiro
devido a um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras encaminhado no dia
20. Antes, o contato de Francenildo com a PF havia ocorrido entre
a quinta, 16, e a sexta, 17, quando
entrou e saiu do programa de
proteção a testemunhas do órgão.
Últimos dias
Uma semana depois, no domingo passado, Lula e Palocci tiveram
uma conversa pessoal. O então
ministro da Fazenda continuava a
negar as evidências de sua participação no caso. Mas Lula já havia
recebido informações de Thomaz
Bastos de que a PF tinha convicção da participação de Palocci.
O ministro da Justiça disse que o
depoimento de Mattoso no dia seguinte não lhe deixaria saída. Lula
informou a Palocci que a situação
era insustentável e que ele deveria
se preparar para sair.
Antes de viajar para Curitiba,
ainda no domingo, dia 26, Lula se
reuniu com auxiliares na Base Aérea de Brasília, atrasando seu vôo
em mais de uma hora. Pediu que
fizessem uma apuração final durante a manhã de segunda e que
lhe apresentassem um resultado
definitivo em reunião à tarde.
Solicitou ainda que o presidente
do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e
Social), Guido Mantega, fosse a
Brasília no dia seguinte. Já queria
demitir Palocci, contrariado com
as negativas do ministro, que só
admitira que sua assessoria poderia ter vazado o extrato.
Na manhã de segunda, em conversa tensa com Mattoso, Palocci
disse ao presidente da Caixa que
ele não diminuiria sua culpa em
nada se o responsabilizasse. Depois de soltar um palavrão, Mattoso afirmou que Palocci acabara
com sua vida e que ele não pagaria
o pato sozinho.
Com a recusa de Mattoso, Palocci ficou nervoso e trocou ofensas com Thomaz Bastos. Disse
que contrataria um detetive particular para investigar Francenildo
porque a Polícia Federal trabalharia só a favor da oposição e contra
o governo.
Palocci disse que o caseiro teria
viajado para o Piauí com passagem paga por um senador e que
nem isso a PF conseguia apurar.
Palocci fez pressão em forma de
ameaça. Disse que Thomaz Bastos poderia se complicar porque
Goldberg estivera na sua casa na
quinta em que Mattoso lhe entregara o extrato de Francenildo.
Thomaz Bastos respondeu com
um palavrão. Disse que Palocci
chamara o secretário sem seu conhecimento, que ele estava em
Rondônia e que não permitiria
que a PF fosse usada politicamente ou forçada a acobertar eventual
prática criminosa de membros da
cúpula do governo. Em público, o
ministro não informou que seu
assessor havia presenciado o encontro entre Mattoso e Palocci.
Quando Lula chegou de Curitiba, foi informado por auxiliares
de que Mattoso estava na PF naquele momento e que diria que
entregou os extratos a Palocci. Lula agradeceu o relato, pediu que
deixassem a sala e solicitou um telefonema para o ministro da Fazenda. Não chamou Palocci para
seu gabinete e afirmou que seria
uma conversa rápida.
O presidente disse a Palocci que,
diante das circunstâncias, ele deveria deixar o governo. O auxiliar
pediu que não fosse demitido,
mas afastado, a fim de tentar provar sua eventual inocência e retornar ao posto. Lula não aceitou.
A auxiliares, Lula se queixou de
Palocci ter insistido em negar participação na violação do sigilo.
Outros membros da cúpula do
governo também se mostraram
surpresos. Ciro Gomes, que chegou a chamar de "golpista" setores da imprensa, disse que ia escrever uma carta para um jornal
pedindo desculpa por sua crítica.
Oferta de R$ 1 milhão
Segundo a edição desta semana
da revista "Veja", em conversa de
Palocci com Mattoso e o advogado criminalista Arnaldo Malheiros, amigo de Thomaz Bastos, foi
aventada a idéia de oferecer R$ 1
milhão "a algum funcionário da
Caixa que se dispusesse a assumir
a culpa pela quebra do sigilo".
Segundo a revista, "não se sabe
se a proposta teve andamento
prático". Ainda segundo a "Veja",
o empresário Eurípedes Soares da
Silva, o suposto pai biológico de
Francenildo, também teria tido
sigilos fiscal e bancário violados.
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