São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

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POLÍTICOS PROFISSIONAIS

Pesquisa de Leôncio Martins Rodrigues mostra ascensão de classes mais pobres; fenômeno influenciaria corrupção

"Popularização" explica voracidade no poder

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

As eleições legislativas de 2002 e a ascensão do PT ao poder levaram a uma "popularização" da política brasileira, tanto na Câmara dos Deputados quanto na administração direta federal.
No Congresso, deputados-empresários e outros oriundos das classes médias altas perderam terreno para políticos que vieram mais de baixo: técnicos, funcionários públicos, bancários, professores da rede pública e outras categorias de assalariados.
Na administração pública federal, deu-se fenômeno semelhante após a vitória petista, com a ascensão de uma classe média mais pobre e de sindicalistas ao poder.
As conclusões fazem parte do trabalho "Mudanças na Classe Política Brasileira", realizado pelo cientista político Leôncio Martins Rodrigues com o apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
A investigação visou analisar as transformações sociais ocorridas na Câmara resultantes das eleições gerais de 1998 e 2002 (51ª e 52ª legislaturas). Ela dá seqüência a outra pesquisa de Rodrigues sobre os deputados federais eleitos em 1998 e publicada pela Edusp (Editora da Universidade de São Paulo) sob o título "Partidos, Ideologia e Composição Social".
Uma das conclusões centrais é que, favorecidos pelo crescimento eleitoral da candidatura Lula e pela perda de prestígio do governo anterior, todos os partidos de esquerda, e não apenas o PT, aumentaram seu espaço na Câmara.
Entre as duas legislaturas, as siglas de esquerda avançaram 45,2%. As de centro perderam 19,7%, e as de direita, 5,4% entre as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados (ver quadro abaixo).
O PT cresceu 54,2% (de 59 para 91 deputados). As perdas da direita só não foram maiores pelo fato de estar incluído neste bloco ideológico o PL, que dobrou o número de seus deputados .
O próprio PL e seu desempenho serviu de porta de entrada para políticos vindos das camadas populares, como os pastores das igrejas pentecostais.
Segundo Rodrigues, além da "popularização", a massificação do processo político brasileiro leva à formação de "uma classe de pessoas que fazem da política a sua profissão". Os membros dessa classe vêm principalmente de quatro meios sócio-ocupacionais: o setor empresarial, as profissões liberais, o magistério e o funcionalismo público.
Na eleição de 2002, a "popularização" da política brasileira vem especialmente da forte redução de deputados que, antes de entrar para a chamada vida pública, eram (ou ainda são) empresários, entendendo esse termo num sentido amplo que engloba setores urbanos e rurais e todos os ramos de atividades, não importando a dimensão do empreendimento.
Foi o setor que mais perdeu terreno na Câmara. Passou de 44,8% do total de deputados para 37%.
Ao mesmo tempo, os parlamentares vindos do setor público aumentaram seu peso de 20,1% para 23,6%, e os professores, de 15,8% para 16,8%. Os profissionais liberais mantiveram sua participação estável em cerca de 28%.
Em entrevista à Folha, Rodrigues analisa as implicações dessa "popularização" da política. Ela explicaria, em boa medida, a voracidade com que alguns grupos políticos e personagens avançaram sobre a chamada "coisa pública" como parte de um projeto pessoal de ascensão social.


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