São Paulo, segunda-feira, 02 de abril de 2007

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Entrevista da 2ª/Marta Suplicy

Disputar o cargo de governadora em 2010 é mais adequado

Ex-prefeita afirma que candidatura à Presidência não está em questão e que não cogita deixar pasta para concorrer em 2008

Sérgio Lima/Folha Imagem
Marta, que pretende combater o turismo sexual no Brasil


KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A ministra do Turismo, Marta Suplicy, diz que não pretende disputar a Prefeitura de São Paulo no ano que vem, mas o governo do Estado em 2010. Para ela, "o cargo de governadora em 2010 é mais adequado."
Apontada no PT como potencial candidata à Presidência daqui a quatro anos, ela diz que esse projeto "não está em questão" e que se dedicará "para valer" à pasta do Turismo.
"Aprendi que política é uma montanha-russa", afirma a ex-prefeita de São Paulo. Considera cedo para saber quem será o candidato do PT à sucessão de Lula. "Nomes surgirão e poderão ser grandes surpresas."
Acha que Lula fará o sucessor por causa de políticas de inclusão social e da "intuição para se mexer na direção correta para a população mais carente".
Afirma que existe racismo no Brasil: "Não gostamos de usar a palavra racismo porque ela é muito pesada, e a gente gosta de se ver como um povo não racista". Porém, "basta um conflito, pumba!, aparece o racismo".
Diz que propagandas que associam o Carnaval e a beleza das mulheres às nossas praias funcionam como estímulo ao turismo sexual, caso não tenham dosagem de bom senso.
Exibe catálogo da coleção de biquínis da Rosa Chá que mostrou ao embaixador americano, Clifford Sobel, em que há uma modelo "linda" nos Lençóis Maranhenses. "Temos de ter a percepção de que praia é bom e mulher bonita também."
Acha que "não é positiva" a iniciativa do governo do Rio de ensinar prostitutas a falar inglês para se relacionar com turistas nos Jogos Pan-Americanos. "Tenho respeito pelas prostitutas, mas acredito que, se elas tivessem um caminho alternativo, a maioria o faria."
Julga o Ministério do Turismo "um desafio" que "combina" com a sua personalidade. Afirma que Lula determinou três prioridades: gerar emprego, turismo de baixo custo e diminuir as diferenças regionais. Revela que fechou com a Caixa Econômica Federal e a Previdência a possibilidade de aposentados fazerem prestações de 6 a 24 meses, com juros de 1,3% a 2,41% ao mês, para pacotes turísticos. Marta, 62, falou à Folha na quinta passada.  

FOLHA - Qual deve ser o modelo turístico do país? Resorts, rotas ecológicas, turismo popular?
MARTA SUPLICY
- Não podemos nos dar ao luxo de desprezar nenhum setor. Gera-se emprego com turismo de elite, de aventura e popular.

FOLHA - Dá para o turismo crescer com crise dos aeroportos, estradas ruins e violência?
MARTA
- Pesam negativamente, mas estão sendo paulatinamente solucionadas. A compra da Varig pela Gol tende a melhorar a crise dos aeroportos. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) vai melhorar nossa infra-estrutura. E o combate à violência é questão que Lula está enfrentando.

FOLHA - Quais serão as suas prioridades?
MARTA
- A orientação do presidente é gerar emprego, turismo de baixo custo e diminuir as diferenças regionais. Ao qualificar a mão-de-obra, podemos utilizar os jovens adolescentes que estão no Bolsa Família. Isso abre porta de saída do programa para uma vida melhor. A notícia de que 8 milhões de brasileiros deixaram as classes D e E e ascenderam é muito boa. Serão novos consumidores do turismo. Quero colocar o lazer turístico na cesta básica do trabalhador.

FOLHA - Haverá pacote para aposentados?
MARTA
- Em reunião ontem [quarta-feira] com a Caixa Econômica Federal e a Previdência, fechamos o crédito consignado para pacotes turísticos de aposentados. Os juros serão de 1,3% a 2,41% por mês, em parcelas de seis a 24 meses. Conversarei com a operadora para baixar o custo dos pacotes. Há programas que já existem e serão mais divulgados, como o "Cartão Turismo", da Caixa. O consumidor coloca esse cartão no crédito consignado, a um juro de 2,09% ao mês. Vamos tentar diminuir esses juros em determinados gastos. Há também a "Poupança Turismo". Poupando durante um tempo, o correntista concorre a uma viagem entre R$ 4.000 e R$ 6.000. Como ele poupa, vou propor redução na taxa de juros quando fizer as prestações para viajar. Há um programa novo para jovens que se chamará "Conheça o Brasil".

FOLHA - Qual será o formato?
MARTA
- Fazer acordos com escolas particulares e públicas de pacotes turísticos para jovens em prestações pela Caixa. Se uma escola propõe uma visita a Ouro Preto, parte da classe não pode ir. Pode haver um pacote especial para a "Semana do Saco Cheio" das escolas.

FOLHA - Nos últimos anos, o governo fez várias campanhas contra o turismo sexual. No entanto, o Carnaval e uma publicidade que associa a beleza das mulheres às nossas praias não funcionam exatamente como estímulo a esse turismo?
MARTA
- Funcionam, mas temos de ter a percepção de que praia é bom e mulher bonita também. Tem que ter uma dosagem de bom senso e de moralidade. Mulher de biquíni fazendo anúncio de carro acho inadequado. Mulher de biquíni numa praia é outra coisa. A propaganda da Rosa Chá, mostrando sua coleção de maiôs, biquínis e sungas para o verão de 2007, feita nos Lençóis Maranhenses, não é desrespeitosa [mostra o catálogo com a modelo feminina e outro menor com modelo masculino]. É uma coisa bacana. Não pode haver moralismo. Uma coisa é turismo sexual, abuso de crianças. Outra é bom gosto e respeito a mulheres e homens.

FOLHA - O que a sra. pensa a respeito da iniciativa do governo do Rio de estimular prostitutas a aprender inglês para receber melhor turistas nos Jogos Pan-Americanos?
MARTA
- Não é positiva. Positiva é uma iniciativa engenhosa para que os taxistas lidem com o estrangeiro. Como é praticamente impossível treiná-los a falar inglês, francês, italiano, alemão, criou-se uma central com as línguas do Pan. Quando o turista entra no carro, o taxista tem de saber de onde ele é. E um tradutor da central o auxilia. Não é maravilhoso?

FOLHA - A Copa de 2014 será uma de suas prioridades?
MARTA
- Ainda não cheguei lá. Estou no Pan, que precisa ser um êxito para que possamos pensar na Copa. O ministério tem participação importante no Pan. Aportou R$ 107 milhões para reforma do aeroporto Santos Dumont. Faz qualificação profissional do jovem para atendimento ao turista com a Central Única de Favelas. Investe R$ 5 milhões para aumentar oferta de hospedagem. Faz qualificação para que ambulantes da orla manipulem alimentos de acordo com normas de higiene. Uma das coisas mais importantes de um evento do porte do Pan é o legado que deixará para a cidade. No Rio, um legado será o Armazém do Samba. Construído na Cidade do Samba, é uma infra-estrutura com equipamento para lojas, informação turística, espaço multimídia, oficinas e salas de aula.

FOLHA - Como sexóloga e política identificada com bandeiras progressistas, pretende ter alguma política para as prostitutas que lidam com turistas?
MARTA
- O interessante é qualificação profissional para essas pessoas terem o seu quiosque e outras atividades e deixem a prostituição. Tenho respeito pelas prostitutas, mas acredito que, se elas tivessem um caminho alternativo, a maioria o seguiria.

FOLHA - Sua colega Matilde Ribeiro disse que acha "natural" que os negros brasileiros não gostem de brancos. Não é uma forma de incitação ao ódio racial?
MARTA
- A Matilde já se explicou. Ela é uma pessoa que não tem ódio no coração.

FOLHA - A exclusão não é mais social do que étnica?
MARTA
- Não.

FOLHA - Há racismo no Brasil?
MARTA
- Na hora em que vemos as mulheres negras ganhando metade do que as brancas para a mesma função, que nome você dá? Na hora em que vemos a escolaridade dos negros tão aquém da escolaridade dos brancos na mesma classe social, que nome você dá? No atentado em Brasília, quando queimaram portas de apartamentos de estudantes africanos, eu vi na TV uma moça dizendo que foi chamada de macaca. Que nome você dá a isso?

FOLHA - Racismo?
MARTA
- Sim. Não tem como discutir. Nós temos de combater, pois um dos atrativos do nosso país é essa convivência de etnias. Mas, nos dados estatísticos de acesso econômicos, aparecem manifestações racistas. Em situações de briga e conflito, aparecem. Basta um conflito, pumba!, aparece o racismo. Nós, brasileiros, não gostamos de usar a palavra racismo porque ela é muito pesada, e a gente gosta de se ver como um povo não-racista.

FOLHA - A sra. afasta a possibilidade de ser candidata à Prefeitura de São Paulo em 2008?
MARTA
- Com a expectativa do presidente em relação ao ministério, tenho de pensar em quatro anos.

FOLHA - Entre as suas opções, está concorrer ao Palácio dos Bandeirantes em 2010?
MARTA
- Por que não?

FOLHA - Gostaria de ser candidata a Presidência um dia?
MARTA
- É uma pergunta mais complicada. É algo que a mídia falou quando eu era deputada. Na época, era uma coisa muito divertida. Hoje não é mais. A Presidência não está em questão, porque aprendi na política que você tem de se dedicar de corpo e alma ao que está fazendo. Vou exercer esse cargo de ministra para valer. E não pretendo disputar a Presidência. O cargo de governadora em 2010 é mais adequado.

FOLHA - Reservadamente, Lula diz que deseja fazer o sucessor em 2010. Ele conseguirá?
MARTA
- Acho que sim. A próxima eleição dependerá de o governo manter a sua política bem-sucedida de inclusão social. Não estou falando só de Bolsa Família, mas de controle da inflação, de geração de emprego, aumento da renda. Lula tem a intuição para se mexer na direção correta para a população mais carente. Ele terminará seu governo melhor do que os antecessores.

FOLHA - Quais são os nomes do PT para 2010?
MARTA
- Não tenho a menor idéia. Aprendi que política é uma montanha-russa. No ano passado, o Arlindo Chinaglia estava na cama, recuperando-se de um acidente. Muitos diziam que talvez ele não pudesse se candidatar a deputado federal, porque poderia não ter condição de fazer campanha. Hoje, ele é presidente da Câmara. Nomes surgirão e poderão ser grandes surpresas. Não acho mesmo que já dê para saber quem será o candidato.

FOLHA - A aliança preferencial do PT em 2008 e em 2010 deve ser com o PMDB?
MARTA
- Seria natural em virtude da aliança em Brasília. Mas São Paulo tem as suas peculiaridades.

FOLHA - Com a sra. se colocando fora da disputa pela prefeitura, quais são os nomes do PT?
MARTA
- Muitos, e a lista pode aumentar [não citou nomes].


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