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Governo liga polícia a tortura de jornalistas
Equipe do jornal "O Dia", do Rio, foi seqüestrada e torturada por 7 horas e meia quando fazia reportagem em favela sobre milícia
ABI se diz "indignada" com relato da situação vivida pela equipe: "Vamos cobrar a apuração dos fatos e a prisão dos responsáveis"
DA SUCURSAL DO RIO
O secretário de Segurança
Pública do Rio, José Mariano
Beltrame, disse ontem que já
identificou que há policiais envolvidos no seqüestro e tortura
de uma equipe do jornal "O
Dia", do Rio, na favela do Batan,
na zona oeste da cidade.
O caso foi publicado na edição de ontem de "O Dia". A
equipe fazia uma reportagem
sobre a atuação no local de uma
milícia, grupo que disputa o poder com traficantes em favelas,
geralmente formado por soldados, policiais ou bombeiros da
ativa ou afastados.
O secretário afirmou não
querer dar mais detalhes para
não atrapalhar as investigações. Segundo Beltrame, é fácil
identificar as milícias, mas difícil conseguir provas contra
quem faz parte delas. Ele disse
que não adianta prender se não
houver provas suficientes para
mantê-los presos e serem expulsos da corporação. "Temos
que ter provas e dar como certa
a expulsão. Queremos enxergar
um horizonte além da prisão."
Segundo ele, o Batan é uma
das cerca de cem favelas dominadas pela milícia no Rio. O
grupo já estava sendo investigado, disse. Beltrame afirmou
que as investigações para identificar quem torturou a equipe
de reportagem começou assim
que soube do caso pelo jornal,
mas não disse quando. Também disse que os comandantes
de batalhões que tenham policiais envolvidos com a milícia
podem ser responsabilizados
se for comprovado que sabiam.
Segundo a reportagem de "O
Dia", os integrantes da equipe
foram espancados e submetidos a uma sessão de choques
elétricos e sufocamento com
saco plástico pelos milicianos
durante sete horas e meia.
Os três foram capturados em
14 de maio, diz o diário. Eles
moravam numa casa alugada
na favela desde 1º de maio. Segundo o jornal, a equipe pretendia fazer uma reportagem
sobre a vida dos moradores em
comunidades dominadas por
milícias. O diário não revelou a
identidade dos funcionários.
Repercussão
O Ministério da Justiça, associações da imprensa e a OAB
(Ordem dos Advogados do Brasil) condenaram a violência.
Luiz Paulo Teles Barreto, ministro interino, afirmou, via assessoria, que considera o episódio um "atentado contra a liberdade de imprensa" e disse
que o governo federal "vai
apoiar as investigações". Ainda
não está definido, porém, se a
PF entrará no caso. Tarso Genro está de férias e volta no dia 9.
"O governo federal já vem
apoiando o governo estadual
nas ações no Rio. Um exemplo
são as ações do Complexo do
Alemão. A Força Nacional de
Segurança tem dado apoio
constante", disse o interino.
O presidente da OAB, Cezar
Britto, considerou o episódio
um "escândalo intolerável".
"Moradores das favelas cariocas são hoje reféns de bandidos,
que disputam o poder, uns em
nome do crime, outros em nome de seu combate."
Para a OAB, a ação das milícias é "tolerada" pelo poder público. "O empenho em impedir
o trabalho da imprensa mostra
o temor de que a sociedade conheça métodos e propósitos
das milícias, toleradas pelo poder público sob o argumento de
que prestariam alguma assistência, ainda que por métodos
heterodoxos, aos moradores."
O presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa),
Maurício Azêdo, afirmou que
vai cobrar empenho na apuração: "Estamos indignados com
o relato da situação vivida pela
equipe. Estamos nos dirigindo
ao governo do Estado para pedir informações. Vamos cobrar
a apuração dos fatos e a prisão
dos responsáveis".
Em nota, a ANJ (Associação
Nacional de Jornais) classificou a atitude dos milicianos como um "bárbaro crime". "Além
de ter ocorrido uma execrável
violência contra a integridade
física dos profissionais do jornal, houve um violento atentado à liberdade de informação e
ao livre exercício da profissão",
diz a ANJ, em nota assinada por
Antonio Athayde, diretor-executivo da associação.
A entidade disse ainda que "o
caso expõe o preocupante estado da segurança pública no Rio,
sobretudo levando-se em conta
que os torturadores integram
grupo, segundo denúncia do
jornal, formado por policiais".
A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), em nota, protestou: "A
exemplo dos traficantes, esses
bandos criminosos chamados
"milícias" criam áreas de exclusão, nas quais impõem as suas
próprias leis, valendo-se da intimidação e do assassinato".
Colaborou a Sucursal de Brasília
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