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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ O PUBLICITÁRIO
Cartório em São Desidério aponta venda de terras por R$ 200 mil; aposentada diz ter recebido R$ 500 para assinar papéis
DNA registrou fazendas fantasmas na Bahia
LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO DESIDÉRIO
(BA)
Aos 72 anos, morando em uma
casa humilde e com dificuldades
para se locomover, a aposentada
Laurita Maria da Conceição de
Araújo acredita que poderia ter
uma vida melhor se tivesse empregado os R$ 200 mil que a DNA
Propaganda alega ter pago pela
aquisição de duas propriedades
rurais em São Desidério (912 km a
oeste de Salvador), as fazendas
Bom Jesus 1 e 2. "Nunca vi esse dinheiro em minha vida. Só ganhei
R$ 500 pela venda de um pedacinho de terra que o meu marido tinha, era uma horta muito pequena", disse a aposentada.
No entanto, o Cartório de Registro de Imóveis e Hipotecas da cidade revela que, no dia 26 de setembro de 2000, as duas fazendas
[total de 7.017 hectares] foram
vendidas à DNA Propaganda por
R$ 200 mil. A agência tem como
sócio o publicitário Marcos Valério de Souza, apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como operador do suposto
"mensalão". "Meu marido [Aristóte Gomes de Araújo, já falecido]
nunca teve tanta terra. Só um pedacinho", disse a aposentada.
Pela escritura registrada no cartório de São Desidério, Laurita
Araújo e seu marido foram representados por um procurador, José
Roberto da Rocha Paixão. "O
meu marido já tinha morrido
quando ele [o procurador] pediu
para eu assinar umas folhas de papel. Eu assinei, não li nada, pois
sou analfabeta, e recebi uns trocadinhos. Gastei o dinheiro pagando parte do enterro do meu marido e em comida."
As duas fazendas que teriam sido compradas pela DNA estão
penhoradas pelo INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social) como
garantia de pagamento de uma
dívida cobrada pelo órgão junto à
agência de publicidade -R$
8.554.899,18 [valor atualizado até
a quarta-feira passada]. Outras
quatro propriedades, todas compradas no mesmo dia, 26 de setembro de 2000, também foram
penhoradas pelo INSS.
Em São Desidério, Marcos Valério é investigado sob suspeita de
falsidade ideológica e utilização
de documentos falsos. A polícia
suspeita que o publicitário deu
como garantia de pagamento de
uma dívida cobrada por outra
agência [a Scam Propaganda] fazendas que só existem no papel.
A juíza Karla Moreno Gregorutti, 30, disse que são freqüentes os
registros de propriedades numa
mesma área. "Chamamos de comércio de segundo andar."
Supervalorização
As seis fazendas que a DNA
Propaganda alega possuir em São
Desidério tiveram uma valorização impressionante nos últimos
anos. Juntas, as fazendas Barra 1,
Barra 2, Barra 3, Vereda, Bom Jesus 1 e Bom Jesus 2 somam 30 mil
hectares e custaram R$ 550 mil, de
acordo com laudo divulgado pela
tabeliã Ana Elizabete Vieira Santos. Em 2003, em avaliação feita
pelo perito Landulfo Silva, oficial
de Justiça de São Desidério, as fazendas já valiam R$ 9,1 milhões.
Coincidentemente, o valor da
última avaliação é pouco maior
do que a dívida que o INSS cobra
da DNA -R$ 8.554.899,18, em
processos que correm na 23ª Vara
da Justiça Federal de Minas Gerais. As fazendas foram penhoradas como garantia do pagamento
da dívida ativa do órgão.
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