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ELEIÇÕES 2006 / MÁQUINA PÚBLICA
Previdência reduz mais a pobreza que Bolsa-Família
Estudo destaca importância de aposentadorias e pensões vinculadas ao salário mínimo
Sem benefícios e programas governamentais, proporção de pobres seria de 38% em 2004, e não de 31%, como apontaram dados oficiais
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Caros para os cofres públicos
e de abordagem eleitoral espinhosa, os benefícios pagos a
idosos e deficientes e as aposentadorias e pensões vinculadas ao salário mínimo contribuíram mais que o Bolsa-Família para a redução da pobreza
no país em 2004.
Sem o conjunto desses três
programas, a proporção de pobres teria alcançado 38% da população naquele ano, sete pontos percentuais acima dos 31%
registrados oficialmente, afirma estudo ainda inédito do
Ipea (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada), ao qual a
Folha teve acesso.
Desses sete pontos, cinco são
atribuídos aos benefícios ligados ao mínimo, e dois ao Bolsa-Família e ao benefício específico a idosos e deficientes.
É preciso ressalvar, contudo,
que os dados do Ipea são baseados na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios,
do IBGE) de 2004, quando o
Bolsa-Família ainda estava
sendo estruturado, ao unificar
vários programas sociais, e
atingia 6,5 milhões de famílias
-59% da população considerada pobre no país. Hoje o programa atinge 11,1 milhões de famílias.
Impacto fiscal
O estudo "Programas de
Transferência de Renda no
Brasil: Impacto sobre a Desigualdade e a Pobreza", de todo
modo, faz uma análise inédita
sobre o tema.
Os resultados poderão balizar o debate sobre cortes nos
gastos públicos a partir de 2007
porque os "heróis" da distribuição de renda no país também
são "vilões" do ponto de vista
fiscal. Em 2006, o pacote da redução da pobreza analisado pelos pesquisadores deverá custar aos cofres públicos mais de
R$ 70 bilhões.
A ação patrocinada com dinheiro público que mais ajudou
na redução da pobreza foi, segundo o trabalho de quatro
pesquisadores do Ipea, o pagamento de aposentadorias e
pensões vinculadas ao salário
mínimo, subsidiado em parte
por contribuições.
Os benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social)
vinculados ao mínimo garantiram a redução em cinco pontos
percentuais do número de pobres e indigentes. Pagos a 12,8
milhões de pessoas (dos 15,7
milhões de aposentados e pensionistas do INSS), pesam nas
contas públicas.
O último reajuste do salário
mínimo, de R$ 300 para R$
350, elevou o custo mensal da
folha para R$ 4,5 bilhões, em
abril. No ano passado, aposentadorias e pensões vinculadas
ao mínimo consumiram R$
40,3 bilhões.
Silêncio
A discussão é tão complexa
que nenhuma das duas campanhas principais à Presidência
ousa defender mudanças em
público. No atual governo, a
equipe do então ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda)
tentou debater a desvinculação, mas foi derrotada.
Os então assessores de Palocci se embasaram em outro estudo, do mesmo Ipea, realizado
em 2004. Naquele texto, os aumentos reais (acima da inflação) para o piso previdenciário
foram apontados como responsáveis pelo crescimento do déficit no INSS. A solução, segundo o estudo, seria desvincular
esses benefícios do valor do salário mínimo.
"É verdade que muitas famílias são sustentadas pelas aposentadorias, mas para a gente
não teria tanto impacto no
crescimento da pobreza", disse
na época o economista João
Luiz de Oliveira Mendonça, um
dos autores daquele estudo.
Mudanças nos programas
que, ao lado dos rendimentos
do trabalho, mais contribuíram
para reduzir a desigualdade,
"indicarão que vamos reverter
a redução da pobreza", contra-argumenta Sergei Soares, um
dos quatro pesquisadores do
Ipea que assinam o novo estudo. "Eles [os programas] são
fundamentais."
Segundo Soares, a contribuição do mercado de trabalho na
redução da desigualdade social
é grande, mas não atinge os
mais excluídos, e demora a fazer efeito.
Benefícios
Outro alvo da ofensiva para
cortar gastos públicos seria o
BPC, Benefício de Prestação
Continuada, pago há dez anos a
idosos ou pessoas deficientes
de famílias extremamente pobres, independentemente de
terem contribuído com a Previdência.
O estudo anterior do Ipea,
usado pela equipe de Palocci,
propunha reduzir o valor do benefício a 70% ou 80% do salário
mínimo, além de elevar para 70
anos a idade mínima para o pagamento aos idosos. Em 2004,
o Estatuto do Idoso baixou a
idade mínima de 67 para 65
anos.
Já o novo estudo afirma que o
BPC contribuiu tanto quanto o
Bolsa-Família para a redução
da desigualdade em 2004. Por
causa do valor mais elevado do
benefício -o salário mínimo
contra o máximo de R$ 95 pagos pelo Bolsa-Família-, o
BPC teria tido a capacidade de
tirar famílias da situação de indigência ou pobreza.
"Enquanto o BPC e as aposentadorias e pensões vinculadas ao mínimo são capazes de
tirar grande parte das famílias
beneficiárias da indigência e da
pobreza, os outros programas
de transferência atuam mais
sobre a intensidade da pobreza
do que sobre a proporção de
pobres", diz o estudo assinado
por outros três pesquisadores:
Fábio Veras, Marcelo Medeiros
e Rafael Osório.
Custos
Menos badalado que o Bolsa-Família, o BPC custa mais aos
cofres públicos. Em 2006,
quando o Bolsa-Família cumpre a meta de atingir 11,1 milhões de famílias ao custo de R$
8,3 bilhões, o BPC atenderá 2,5
milhões de pessoas por R$ 8,9
bilhões. Em 2003, quando o
Bolsa-Família custou R$ 3,6 bilhões, o BPC já pagava R$ 4,7
bilhões.
Ainda de acordo com o estudo recente do Ipea, entre 72% e
80% do dinheiro repassado pelo BPC e pelo Bolsa-Família
atinge famílias mais pobres.
Parte disso (entre 48% e 50%)
iria para famílias que seriam
consideradas indigentes sem os
programas.
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