São Paulo, segunda-feira, 02 de setembro de 2002

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GOVERNADORES

SÃO PAULO

Proposta pepebista de liberar cobrança na madrugada não agrada nem os beneficiados; na década de 80, ato gerou transtorno

Acidente e fila rondam pedágio de Maluf

JOÃO CARLOS SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao ressuscitar a proposta de liberar motoristas de pagamento de pedágio entre 23h e 6h, o candidato do PPB ao governo de São Paulo, Paulo Maluf, também libertou do passado um estoque de munição contra a medida, que não tem apoio irrestrito nem mesmo no grupo que a defende.
Essa é a conclusão a que se chega ao ouvir a opinião de concessionárias, usuários, entidades ligadas à questão e especialistas sobre a promessa malufista, uma reedição de medida idêntica que vigorou nos anos 80, quando Maluf era governador de São Paulo.
No grupo que critica a medida, os argumentos principais vêm da mesma fonte de Maluf: a experiência passada, quando a franquia dos pedágios provocou filas de caminhões em acostamentos, acidentes e engarrafamentos.
Os transtornos ocorreram porque motoristas encostavam seus veículos antes das praças de pedágio para esperar o horário de passagem livre, provocando congestionamentos. Ao saírem juntos, também ocorriam acidentes.
As ocorrências constam de um ofício do Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A.) enviado em 1981 à Secretaria dos Transportes para pedir o fim da franquia.
Entre os que apóiam a proposta, a restrição envolve o fato de que ninguém crê que a mudança seja capaz de acabar sozinha com a polêmica que ronda os pedágios.
Maluf até agora tem batido o pé para defender a importância de haver nas estradas uma "rota alternativa" à cobrança de pedágios, mas há ponderações, sugestões de medidas mais amplas e até o veto total à proposta pepebista.
A posição mais extrema é da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias. "Somos contra a proposta porque achamos que é um contra-senso induzir o aumento de tráfego na madrugada", disse Moacyr Duarte, presidente da entidade.
O argumento é baseado em pesquisa feita pelas concessionárias, segundo a qual as mortes chegam a 4,2 pessoas por acidente ocorrido à noite, quando o índice diurno seria de 1,4. A pesquisa foi feita entre 2000 e 2002 em 1.819 quilômetros de rodovias. "O número de mortes que a medida vai causar vale a pena para a sociedade?"

Falta de alternativa
"Você pode me dizer assim: "Bom, mas será que essa é a melhor alternativa?". Creio que não. Creio que não pode ser a melhor. Mas me deram outra?", argumenta a deputada estadual Mariângela Duarte (PT), autora de um projeto que também propõe a franquia dos pedágios em São Paulo.
O projeto, ainda em tramitação, atingiria 92 pedágios no Estado, 78 deles instalados ao longo de 3.500 mil quilômetros de estradas concedidas à iniciativa privada.
Pelas contas das concessionárias, essas praças de pedágios começaram a pipocar a partir de 94. O resultado é que, para fazer o trajeto de ida e volta entre São Paulo e Ribeirão Preto, por exemplo, cada carro passa por dez pedágios (R$ 45,20) em 616 quilômetros.
"O que não dá é para a gente pagar essa fortuna que estamos pagando em pedágios. O pedágio, hoje, nos asfixia, nos humilha, nos cerceia o direito de ir e vir", disse a deputada Mariângela Duarte.
Também entre os caminhoneiros, que apóiam Maluf, a medida não é encarada como solução final para a questão. "Isso vai acumular caminhão nas estradas à noite, que não é um um horário próprio para trafegar, e aumentar os assaltos", afirmou Nélio Botelho, presidente do Movimento União Brasil Caminhoneiro.
A entidade, que na semana passada comandava uma greve nacional da categoria, declarou apoio a Maluf depois que ele assinou um protocolo de intenções garantindo que, se eleito, atenderá reivindicações da categoria.
Mesmo assim, a liberação de pedágio é definida por Botelho como uma alternativa emergencial. "É uma medida totalmente paliativa e provisória", disse ele, que espera de Maluf medidas amplas, como "alteração imediata no sistema de concessão de rodovias".
O caminho do debate mais amplo também é o recomendado pelo consultor na área de transporte e professor da Escola Politécnica da USP, Jaime Waisman.
"Pedágio dói no bolso, mas precisa ver também o outro lado: o que está sendo feito, se os contratos foram bem feitos, o quanto eles estão onerando o custo dos alimentos, o custo Brasil. É um debate muito mais amplo, que tem de ser feito de forma aberta e transparente, não demagógica."
Para Waisman, a proposta de Maluf teria efeito limitado na melhora do trânsito urbano devido ao número de veículos que circulam à noite, dado que as concessionárias não têm disponível.

Melhora no trânsito
A melhora no trânsito é o item em que se apega um movimento de moradores e entidades de São Paulo contra os pedágios para defender parcialmente a proposta.
"Para locais com vias congestionadas, acho a proposta extremamente saudável", afirmou o advogado Francisco Hermano Pereira Lima, um dos integrantes do Movimento Acesso Livre.
Para conseguir a melhora no trânsito, ele acredita ser necessário mudar a proposta de Maluf. Lima defende um escalonamento nos preços do pedágio à noite até se chegar à isenção total, na madrugada. A idéia é evitar a concentração de veículos.
"Imagino que, entre 23h e 6h, deva passar pelos pedágios 5% do volume diário. Ainda que isso dobrasse, seriam 10%. É muito pouco para ter uma repercussão positiva no trânsito da cidade", afirmou Waisman.
Quanto ao argumento de que a franquia não põe fim à polêmica dos pedágios, Lima concorda. "A questão dos pedágios precisa de uma reavaliação total", disse sobre a posição do movimento surgido em 99 devido ao fechamento de acessos e cobrança de pedágio na rodovia Castelo Branco.
"Entendo que há muita gente interessada no assunto. Quando eu digo interessada, é até economicamente e financeiramente. Tem gente que está rachando de ganhar dinheiro à custa dos escravos que têm de pagar pedágio. O que eu vou oferecer é o que existe no mundo inteiro: uma rota alternativa", afirmou Maluf, na sexta-feira, sobre a sua proposta.


Colaborou RAQUEL LIMA, da Folha Campinas

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