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POLÍTICA DA IMAGEM
RENATA LO PRETE
Campanha com as estrelas
"Não levo a sério que o
apoio de um artista tenha
tanta influência na escolha das
pessoas." Assim Chico Buarque
procurou relativizar o efeito prático do encontro em que ele e outros 400 músicos, atores e intelectuais endossaram a candidatura
presidencial de Lula.
A experiência dá razão ao ceticismo de Chico, mas isso não impede que as campanhas disputem
para ver quem arrebanha mais e
melhores garotos-propaganda na
indústria do entretenimento.
Se aconteceu em eleições anteriores, por que seria diferente
quando um dos candidatos tem a
mulher atriz como principal trunfo de comunicação?
Empatado com Ciro Gomes no
segundo lugar, José Serra não dispõe de genérico que substitua Patrícia Pillar. Em compensação,
seus programas de TV estão recheados de artistas. Eles se revezam em funções como apresentar
a biografia do tucano, fazer escada para os ataques a Ciro e entoar o ex-jingle de cerveja convertido em hino pró-emprego, num
estilo "Broadway vai à fábrica".
O evento de quinta no Rio indica que Lula não teria dificuldade
em reunir elenco para algo semelhante, mas por ora seu negócio é
exibir credenciais de petistas ilustres, na tentativa de minar a resistência de parte do público à ausência de diplomas do candidato.
As estrelas de sua propaganda
são os canudos, de preferência obtidos em inglês -economista do
PT não faz doutorado na Universidade Princeton; "Princeton
University" soa melhor.
Ainda assim, Duda Mendonça
gravou com esmero cenográfico o
encontro dos 400. Entre um diploma e outro, certamente haverá
lugar para essas imagens.
Até 1989 e o clipe "Lula Lá", artistas em campanha eram reserva
de mercado do PT. Os poucos que
aderiram a Collor levaram anos
para apagar o carimbo da testa.
Em 1994, a santíssima trindade
da MPB se dividiu. Chico permaneceu com Lula. Caetano e Gil
migraram para FHC.
Ao longo da década de 90, a
participação dos artistas se disseminou pelo espectro partidário,
passando a ser, com poucas exceções, remunerada e desprovida de
identificação ideológica. Ivete
Sangalo canta para Serra como
canta para a Brahma.
Mudou também a política interna da Rede Globo, que hoje
não quer mais ver seus contratados na novela e no palanque.
Em 1988, Antônio Fagundes alternava as gravações de "Vale
Tudo" com as do programa de
Luiza Erundina. Em 2002, Raul
Cortez, protagonista de "Esperança", tem de explicar à emissora
como uma festa em sua casa foi
parar na propaganda de Serra.
Dos velhos tempos, sobraram as
reuniões em que a classe artística
cobra dos candidatos "incentivo"
à cultura. Em 1994, um grupo reivindicava que Lula incluísse em
seu programa "reserva de tela"
para filmes brasileiros no horário
nobre da TV (se adotada, tal providência derrubaria um governo
mais rapidamente do que os escândalos de Collor).
A dúvida de Chico Buarque já
foi objeto de muita discussão entre marqueteiros. Hoje se sabe
que o uso indiscriminado de artistas nem sempre resulta em comunicação eficiente.
Funciona melhor quando o artista cumpre uma função clara
-como foi o caso de Patrícia Pillar nas inserções da pré-campanha. E quando se escolhe a pessoa
certa para estabelecer o que o
candidato nem sempre consegue:
conexão com o eleitor pobre e
avesso à informação política.
Dentro desse raciocínio, Zezé di
Camargo faz mais por Lula do
que uma dúzia de globais juntos.
E Gugu Liberato serve a Serra
mais do que toda a trupe reunida
na casa de Raul Cortez.
A repórter RENATA LO PRETE escreve
às segundas-feiras nesta coluna
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