São Paulo, quinta, 2 de outubro de 1997.



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DIPLOMACIA
Em discurso para empresários no Chile, presidente diz que predomínio americano deve ser compartilhado
FHC rechaça hegemonia mundial dos EUA

GUSTAVO PATÚ
AUGUSTO GAZIR
enviados especiais a Santiago

O presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que a liderança mundial dos EUA deve ser algo "compartilhado", não "hegemônico", em discurso no qual atacou o protecionismo comercial americano e explicitou a pretensão brasileira de obter apoios na América do Sul para uma voz mais ativa nas relações mundiais.
"Depois da queda do Muro de Berlim, a predominância de um país é óbvia. Não se sabe se essa predominância vai ser hegemônica ou algo mais compartilhado, que é o que interessa a todos nós."
FHC, em discurso para empresários brasileiros e chilenos, no hotel Carrera, em Santiago, pediu o apoio do Chile à posição brasileira sobre a Alca (Área de Livre Comércio das Américas), que os EUA querem apressar: "Sabemos, como vocês, o que custa o protecionismo americano a nós. Vocês têm sua lista: salmão, madeira e não sei o que mais; nós também temos: aço, suco de laranja e por aí vai".
A posição do Mercosul (bloco que reúne Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) é de maior cautela nas negociações para a implementação da Alca, prevista para 2005.
O Mercosul, ao qual o Chile se associou há um ano, teme uma excessiva exposição à concorrência com produtores mais poderosos. Para FHC, não se trata de questionar os princípios da formação de um bloco continental -"com os quais estamos de acordo".
O importante, disse, é saber os efeitos práticos dessa integração. "Não vamos nos integrar simplesmente pela alegria de termos tarifas (de importação) comuns."
FHC foi aplaudido ao defender, em tom de discurso político, que "a integração tem que ser vista do ângulo do bem-estar do nosso povo". A Alca, disse, não substituirá o Mercosul (os blocos serão desenvolvidos em conjunto). A integração deve ser feita "sem exclusão de país ou segmento da sociedade". As afirmações foram feitas a 12 dias da chegada do presidente dos EUA, Bill Clinton, ao Brasil.
"Não há poder legítimo"
Para argumentar em favor da união dos países sul-americanos, FHC descreveu a atual economia globalizada como um ambiente de grande circulação de capitais sem controle. "Não há regras como depois da 2ª Guerra, quando nações unidas encontraram uma forma de organizar o mundo."
Foi uma referência ao sistema criado pela Conferência de Bretton Woods, realizada nos EUA em 1944, pelo qual a adoção de taxas de câmbio fixas entre os países servia para controlar o fluxo de investimentos. Esse sistema caducou nos anos 70 e não foi substituído.
Hoje, segundo FHC, "há uma massa enorme de capital disponível sem que se saiba o que fazer com ele, onde investi-lo". "Tudo isso é muito débil. Não há um poder legítimo a nível internacional."
O presidente disse que "este lado do mundo (a América do Sul) tem que ser mais forte a nível internacional". E, nesse contexto, o Mercosul "é uma parte pequena, mas a parte que nos corresponde nesse processo de reorganização das forças políticas do mundo".
FHC pediu o apoio chileno ao Mercosul não só com base nos interesses econômicos, mas na identidade sociocultural dos países sul-americanos: "Não para a busca de hegemonia do Brasil, que não pode sequer aspirar a tanto". "Estamos tratando de vincularmo-nos a toda a América do Sul."



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