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Candidata diz que vence qualquer um e anuncia suas metas
MARIO SERGIO CONTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Pelas pesquisas de opinião pública feitas pelo PT, Marta Suplicy
vence qualquer adversário no segundo turno das eleições de São
Paulo. "Nas nossas enquetes, o
adversário mais difícil seria Romeu Tuma", diz Rui Falcão, coordenador da campanha. Para a
candidata, porém, Tuma seria o
adversário que ela derrotaria com
maior facilidade. "Ele não é bom
de debate na televisão", diz Marta.
Até as 17h, quando foram divulgadas as pesquisas de boca-de-urna, Marta acreditava na hipótese
de vencer a eleição já no primeiro
turno. Ela pretende usar o segundo turno para ampliar a sua base
política. Para ela, à exceção de
malufistas e políticos ligados ao
prefeito Celso Pitta, há lugar para
todas as forças políticas no seu secretariado, caso vença a eleição. É
o que ela diz na seguinte entrevista, concedida ontem à Folha:
Folha - Maluf diz que seu maior
defeito é não ter experiência administrativa. Experiência faz falta?
Marta -A experiência dele afundou essa cidade. Eu não tenho por
que invejá-lo. Tenho as características necessárias para exercer o
cargo: uma compreensão do
mundo, uma visão política, liderança, capacidade de negociação
e um bom trânsito em todos os setores da sociedade.
Folha - Qual critério a sra. levará
mais em conta quando escolher o
seu secretariado: o da identidade
política, o da competência técnica
ou o da representatividade social?
Marta -Tenho a consciência que
não chegaria ao segundo turno se
não estivesse no Partido dos Trabalhadores. Mas sei que vou ser
eleita com muito mais votos além
dos do PT. Ouço muita gente dizer: "Nunca votei no PT, mas vou
votar em você". Ou então me falam: "Há dez anos que voto nulo,
mas agora estou acreditando em
você". Minha responsabilidade,
portanto, é muito grande. Vou ser
a prefeita de São Paulo, de todos
esses eleitores que não são do PT.
Para a prefeitura funcionar, com a
situação em que está a cidade, de
caos, de desestruturação e de desencanto, vou ter que articular todas as forças sociais.
Folha - Qual será a reação do PT
ao vê-la escolher um secretariado
suprapartidário?
Marta -Antes de conversar com
a sociedade, já conversei sobre esse assunto com o meu partido. Há
total anuência entre o que a direção do PT e eu pensamos. Na sexta, almocei com Lula e José Dirceu, e tratamos dessas questões.
Eles me deram total apoio no sentido de formar um secretariado
que tenha condições de dar amplitude à Prefeitura de São Paulo.
Folha - Quais forças políticas,
concretamente, podem vir a participar do seu secretariado?
Marta - Quem não participou da
rapinagem dos últimos oito anos
será bem-vindo. Não precisa, necessariamente, ser militante de
partido. Pode ser uma pessoa da
sociedade civil. A pessoa precisa
ter honestidade, competência técnica e habilidade política. Não
adianta colocar um bom técnico,
mas sem habilidade política, porque ele não conseguirá fazer nada.
Folha - Qual a importância que a
sra. dá à relação do prefeito com o
governador Mário Covas?
Marta - Dou uma importância
total. Vou procurar o governador
Mário Covas no meu primeiro dia
de governo, buscando uma relação institucional de respeito e de
parceria. Há muitos problemas da
cidade que não poderemos resolver se não formos parceiros do
governo estadual, como enchentes e transportes.
Folha - O que achou da gestão de
Mário Covas como prefeito?
Marta - Na época, eu não estava
muito ligada em política. Mas, pelo que me informei, ele foi um
bom prefeito. Não é um avaliação
profunda, reconheço. Sobre sua
atuação como governador, não
posso dizer a mesma coisa, tanto
que concorri contra ele.
Folha - Se eleita, também vai procurar ter uma boa relação com o
presidente Fernando Henrique?
Marta - Vale o mesmo raciocínio. Como no caso da dívida do
município para com a União, por
exemplo. Vou procurar o ministro Malan para renegociá-la. Vou
pagá-la, mas acho razoável que
parte desses pagamentos voltem
para a cidade, na forma de incentivo a projetos sociais. É isso que o
presidente Fernando Henrique
propôs aos países desenvolvidos.
Folha - Qual o balanço que faz da
gestão de Luiza Erundina?
Marta - Não participei da gestão
da Erundina. Percebi que sua comunicação com a população foi
muito falha. Muita coisa boa que
ela fez, como o trabalho na área da
Educação, só quem tinha filho em
escola pública percebeu. A Saúde
também foi bem, tanto que ela
deixou o governo com remédios
estocados para três meses de
atendimento. Fiquei impressionada, por outro lado, com a falta
de diálogo da Erundina com o PT
e com outros partidos. Lembro
que o Eduardo (Suplicy) fez uma
visita a ela logo que foi eleito presidente da Câmara. A Erundina
lhe mostrou um telefone vermelho, instalado pelo Jânio, que ligava direto ao gabinete do presidente da Câmara. Ele propôs que ela
passasse a usar o telefone. Mas a
Erundina nunca ligou. Cada vez
que o Eduardo precisava falar
com a Erundina, levava dois dias.
Folha - No seu gabinete haverá
telefone vermelho?
Marta - Uma das minhas maiores preocupações é não cair no erro de perder contato com o povo e
com os políticos, me isolando
com a meia dúzia que estará à minha volta. Pensei em receber os
vereadores, de todos os partidos,
um dia por semana, depois das 6
da tarde. Aí, eu só sairei depois de
atender o último. Pretendo visitar
uma subprefeitura por semana.
De manhã, ouvirei as associações
do bairro, comitês de camelôs, perueiros, OAB, quem vier. E à tarde
visitarei as áreas mais pobres da
região. Farei isso porque vejo que
muitas pessoas, ao chegarem no
poder, esquecem o que viram durante a vida, durante a campanha.
Folha - Como a sra. reagirá a greves, agitações de rua e protestos?
Marta - Quem não sabe lidar
com greves e protestos são a direita e o centro. O PT tem uma capacidade de diálogo muito grande
com as áreas mobilizadas da população. Tanto que, quando tem
qualquer confusão com o MST, o
governo chama o senador Suplicy. Quando há protestos dos
sem-teto, logo se convocam os vereadores do PT. Vou me esforçar
para me antecipar a qualquer
confusão. Jamais deixaria que a
situação como a da greve dos professores chegasse ao ponto que
chegou, com o acampamento na
praça da República. Agora, foi o
governo do Estado que perdeu a
cabeça, que propiciou a confusão.
Eu vou sentar e conversar com
quem estiver reivindicando.
Folha - Como a senhora encararia
uma passeata de sem-teto, acompanhada pelo senador Suplicy, que
fosse até a prefeitura?
Marta - Mas por que ele precisará fazer isso? Porque nós resolveremos o problema antes, conversando com os seus representantes. Vou sentar com as organizações, mostrar os números da prefeitura e dizer o que posso fazer.
Folha - Mas momentos de tensão
poderão ocorrer...
Marta - Sim, podem ocorrer. Aí
vou lidar com eles. Mas há alguns
princípios que me guiarão: bagunça não pode, o espaço público
tem que ser preservado e as leis
devem ser cumpridas. E sei também que nenhum problema se resolve com a polícia batendo em
manifestantes.
Folha - Como a senhora vai tratar
os bairros ricos?
Marta - Eles terão manutenção.
Suas ruas devem ser varridas, iluminadas e policiadas. Não tenho
nenhum ressentimento contra
quem mora num bairro bom, numa casa boa. Seus moradores pagam impostos e têm direitos. Eu
mesma pago R$ 1.200 de IPTU
por mês e quero ver minha rua
bem tratada. Agora o investimento irá para os bairros pobres, onde
falta quase tudo. Esse é meu compromisso. A classe média alta e os
ricos já têm essa compreensão.
Folha - Um prefeito pode ser mais
político ou mais um urbanista.
Haussmann, na Paris do séc. 19, e
La Guardia, na Nova York do séc.
20, foram mais urbanistas, enquanto no Brasil a tendência é dos
prefeitos serem mais políticos, com
a possível exceção de Jaime Lerner
em Curitiba. A sra. se vê mais como
política ou urbanista?
Marta - Não sei. Não tenho experiência prévia para poder dizer
qual talento irei mostrar mais na
prefeitura. Quando fui para o
Congresso, tinha a aspiração de
fazer lá o que já vinha realizando
na minha atividade pública sem
voto: a defesa das mulheres e das
minorias. Quando percebi, tinha
ido muito além disso. Passei a ser
considerada uma cabeça do Congresso, uma deputada com uma
posição política ouvida por todos
os partidos. Não sei para que lado
penderei mais. Sei que tenho capacidade executiva, pois onde entro sou eu quem organiza, decide
quais são as prioridades e vai fazendo. E vou ter, claro, que ter
uma visão política. Sem essa visão, o prefeito acaba como o Celso
Pitta. O que eu não souber fazer,
aprenderei. Não tenho nenhum
problema em aprender.
Folha - A sra. tem a ambição de,
ao final de seu eventual mandato,
deixar São Paulo com uma fisionomia diferente da de hoje, como fizeram Prestes Maia e Faria Lima?
Marta - É claro que tenho essa
intenção, mas a São Paulo que
vou receber está desestruturada
em todas as áreas. Ela tem uma
máquina podre e corrompida,
um déficit enorme e um comprometimento de 13% do seu orçamento. Vou ter de abrir a caixa
preta deixada pelo Pitta. O Eduardo (Suplicy) mesmo descobriu
outro dia no Ministério Público
que a Prefeitura de São Paulo
comprou 15 mil computadores, o
que fere a lei de responsabilidade
fiscal. Isso é o que se sabe. Mas a
situação financeira pode estar
muito pior. É por isso que venho
repetindo: não dá para fazer milagre. Quanto pior a situação financeira da prefeitura estiver, mais
difícil será deixar uma marca na
cidade semelhante à de Faria Lima ou Prestes Maia, pelo menos
nos primeiros dois anos.
Folha - O que será possível fazer
no começo?
Marta - Irei desmontar essa máquina corrupta, começarei a colocar a cidade nos trilhos, priorizando educação e saúde, e colocarei
em prática os projetos de solidariedade social, pois a exclusão social em São Paulo chegou a níveis
que ninguém nunca viu antes. Serei uma prefeita caixeira-viajante:
irei vender São Paulo no exterior.
Venderei o turismo, o fato de São
Paulo ser um centro de produção
de moda e vestuário e colocarei o
Anhembi para funcionar. Ele é o
maior centro de eventos do Brasil
e, no entanto, está caindo aos pedaços, virou cabide de empregos.
Folha - Qual cidade está sendo
bem administrada, aqui e lá fora?
Marta - Prefiro falar de uma do
Brasil: Santo André. O Celso Daniel, do PT, tem uma visão moderna, fantástica. Lá você tira um
alvará, em cinco dias, pela Internet. Ele enxugou a máquina prefeitura, informatizou, mudou a cidade. Ele urbaniza as favelas, leva
infra-estrutura, aplica programas
de renda mínima. E agora, veja só,
está sendo reeleito no primeiro
turno com 70% dos votos.
Folha - Faz diferença São Paulo
ter um prefeito ou uma prefeita?
Marta - Faz muita diferença. Ter
nesse país um modelo de mulher
diferente do grupo Tchan é uma
coisa fantástica para as meninas.
Acho importante dar exemplos
femininos de trabalho, dedicação,
honestidade, competência e dignidade. Quero ser uma boa prefeita até por isso. Não quero que a
Zélia seja vista como um exemplo
da atuação da mulher na política.
Folha - Para a população como
um todo, faz diferença se o prefeito
é homem ou mulher?
Marta - Não. Isso depende da
sensibilidade do político. Alguns
dos melhores projetos para mulheres foram feitos por um homem, o deputado Eduardo Jorge,
do PT. Mas há uma estória que
considero bonita. Numa cidade
pequena, com um orçamento pequeno, se há verba para fazer uma
fonte luminosa ou uma creche, se
a prefeita for mulher, é mais fácil
que ela opte pela creche. O que
não impede que um prefeito também tome a mesma decisão.
Folha - Pretende tentar fazer com
que São Paulo seja menos feia?
Marta - A beleza é fundamental.
Vou tratar dessa cidade como trato do meu jardim. A primeira coisa que farei será limpá-la, começando pelas pichações. Não
adianta fazer como Pitta fez: multar os proprietários pelas pichações, que é a mesma coisa que
multar quem foi assaltado. Aliás,
já tive reuniões com pichadores, e
descobri que são pessoas com
quem dá para conversar. São jovens de classe baixa que querem
dizer que existem, e ninguém lhes
dá atenção. São jovens que querem esporte, lazer, atenção, e é isso que farei. Vamos repensar a legislação sobre poluição visual,
que pode ser melhorada, limparemos os parques públicos e praças,
que estão imundos. Até brinco:
passarei os primeiros sábados do
meu governo pintando e limpando as ruas. A prefeita tem que estar presente, com lata de tinta e
pincel na mão, chamando a população daquele bairro para uma
ação coletiva de limpeza.
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