São Paulo, domingo, 02 de dezembro de 2001

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RUMO A 2002

Pesquisa de cientista político revela militante mais escolarizado e redução do apoio ao socialismo e à estatização

Petista está mais velho, rico e moderado

PLÍNIO FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O petista está mais velho, mais bem remunerado, mais instruído e menos radical. Mais da metade aceita que a contradição entre a burguesia e o proletariado (a "luta de classes") não é central na luta pelo socialismo. Quase 70% concordam ao menos parcialmente que a extinção do mercado não deve ser uma meta para o PT.
A evolução do perfil e do pensamento do militante e/ou dirigente petista foi traçada e acompanhada por pesquisas durante dois congressos nacionais do partido, distantes nove anos um do outro.
Comandados por Benedito Tadeu César, 48, também petista, doutor em ciências sociais pela Unicamp e professor de ciência política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, os levantamentos, feitos em 1991 e 1999, farão parte do livro "PT - A Contemporaneidade Possível".
Os dados mostram que uma palavra cara aos tempos globalizados parece ter atingido os petistas. "Mais do que desradicalização, que está presente, sem dúvida, o que fica evidenciado na pesquisa é uma flexibilização, que não nega os princípios socialistas, mas torna o partido mais contemporâneo à sociedade", avalia Tadeu César.
Durante os dois congressos do PT foram distribuídos 2.150 questionários aos participantes, respeitando-se a composição dos delegados -por região e por sexo.
Entre um congresso e outro, caiu 10,7 pontos percentuais o apoio do militante à manutenção do PT como um partido socialista. Era de 96,7% e passou para 86%. Houve uma queda de 9,4 pontos (de 62,6% para 53,2%) no percentual daqueles que concordavam total ou parcialmente que um dos objetivos do PT é a coletivização e a estatização dos meios de produção. O apoio parcial ou total à estatização das indústrias estratégicas e dos grandes monopólios também perdeu quase sete pontos (de 77% foi para 71,1%).
"É uma tendência já provada. Mesmo os partidos anti-sistema, quando entram na disputa eleitoral, tendem a perder radicalidade. O PT não vai contra a tese", diz.
Não é possível negar que os petistas amadureceram. A faixa etária predominante entre os congressistas era de 31 a 35 anos, o que abarcava 27,5% dos participantes. Passou a ser a dos petistas de 36 a 40 anos, com 25% dos delegados. A idade média dos participantes dos congressos subiu de 35,3 anos para 42,3.
O rendimento familiar se concentrava na faixa de dois a cinco salários mínimos (de R$ 361 a R$ 900). Subiu para a faixa de mais de dez a 20 salários mínimos (de R$ 1.801 a R$ 3.600). A média salarial familiar, que era de 2,6 mínimos (R$ 468 hoje), atingiu 7,1 mínimos (R$ 1.278). O percentual dos que se declararam assalariados na iniciativa privada caiu 6,5 pontos (de 28,5% para 22%). E cresceu 5,3 pontos o índice dos que se disseram funcionários públicos (de 42,1% para 47,4%).
O PT virou um partido de classe média? "Se quisermos colocar nesse padrão econômico, sim. O perfil social do partido é de contemporaneidadade ao da sociedade", afirma Tadeu César.
Ele lembra que, no próprio PT, é confusa a definição de quem é o trabalhador: "Em documentos resultantes dos encontros petistas, é possível achar desde a definição clássica (a classe trabalhadora como vanguarda da revolução) até a que diz que todos os assalariados são trabalhadores e ponto".
Dos participantes do congresso de 1999, 64,7 % declararam-se como trabalhador não-manual, de nível médio ou universitário. Resumem-se a 5,7% os que têm baixa qualificação profissional e a 7,5% os que fazem trabalho manual especializado. Se continuasse exercendo a profissão de torneiro mecânico, era nessa última categoria que deveria constar Lula, pré-candidato à Presidência.
O percentual dos que chegaram à universidade aumentou 7,7 pontos, subindo de 56,4% para 64%. Na mão inversa, foi reduzido em 6,8 pontos o percentual dos que não frequentaram a escola ou cursaram apenas até o primeiro grau completo (de 11,8% para 5%). "Os números mostram um processo de mobilidade social bastante acentuado, ocorrido em apenas uma geração", diz Tadeu César.
Em 1991, 73,6% dos pais dos participantes nunca tinham frequentado a escola ou tinham cursado apenas até o primeiro grau. São apenas 5% na mesma situação em 1999. No primeiro congresso, só 8% dos pais dos participantes tinham atingido ou ultrapassado o nível universitário, número que salta para 57% em 1999.
As pesquisas mostram um processo de desradicalização política: "Há uma não-aceitação plena das teses tradicionais, seja social-democrata, seja marxista-leninista. Elas não são reafirmadas".
O índice dos que definiram o partido como socialista caiu de 79,5% para 71,9%. Não houve nenhuma afirmação do partido como comunista, definição que já era reduzida em 1991 -só 0,6% na época. Cresceu 4,5 pontos o número dos que classificaram como social-democrata ou democrata radical.
A variação ideológica pode ser acompanhada nas teses aprovadas nos encontros. "Fica claro a existência de um movimento pendular entre a moderação e a radicalidade. Há uma tensão interna forte. Existe um setor minoritário, que é insurrecional e barulhento, e um majoritário, que é mais flexível e moderno. Num mesmo documento, aparecem definições contraditórias que refletem essa tensão", observa o professor.
Tadeu César criou dois índices para expressar a evolução do pensamento do PT. Numa questão sobre estatização, as respostas foram divididas em quatro linhas: social-democrata, socialista tradicional, socialista renovado e socialista democrático. Com base nisso, elaborou um Índice de Polarização Ideológica: 49,7% (10,3 pontos a mais que em 91) são definidos como socialistas democráticos; 41,9% (8,1 pontos a menos) como socialistas renovados; 5,4% (0,8 a menos) como socialistas tradicionais; e 3,0% (0,9 ponto a menos) como social-democratas.
Ele também elaborou o Índice de Polarização Econômico-Ideológica. Os "estatistas moderados" são maioria no partido (46,1%), seguidos pelos "distributivistas moderados" (31,4%), "estatistas" (17,7%) e "distributivistas" (4,8%). Nesse grupo, na comparação entre o congresso partidário de 1991 e o de 1999, houve uma redução de cinco pontos entre os "estatistas moderados" e aumento de 4,3 pontos entre os "distributivistas moderados" e de 3,5 pontos entre os "estatistas".


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