São Paulo, domingo, 03 de janeiro de 2010

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Empresários vão priorizar doações ocultas na eleição

Políticos e executivos reclamam que imprensa "criminaliza" quem doa a candidatos

Presidente do TSE afirma que mecanismo dificulta, em tese, a transparência na disputa, mas que o maior problema ainda é o caixa 2

VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Empresários e políticos têm uma avaliação praticamente unânime sobre o cenário para o financiamento de campanha deste ano. Devem ser priorizadas as doações diretas aos partidos, e não aos candidatos. É a chamada "doação oculta", em que a empresa doa direto ao partido e não é possível identificar para que candidato doou.
De acordo com políticos, empresários e dirigentes de empresas ouvidos pela Folha, essa é uma tendência para fugir do que eles chamam de "criminalização" da doação legal.
"Toda a mídia crucifica o doador", afirma o advogado e ex-ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Torquato Jardim.
A saída, diz ele, é a doação direta ao partido e não aos candidatos: "É a doação mais tranquila. Protege a empresa, o doador não aparece vinculado a um candidato".
O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) vai na mesma linha: "Quem doa dinheiro oficialmente [a um candidato] vai parar no jornal como participante de algum conluio, como se estivesse querendo fazer alguma irregularidade", afirma.
Reservadamente, alguns empresários admitem que juntamente com a doação direta ao partido segue uma "lista secreta" apontando para que candidato deve ir a contribuição.
Segundo relatos ouvidos pela Folha, isso já é uma prática.
O empresário Jorge Gerdau faz questão de destacar que suas empresas "não trabalham com caixa dois", mas diz que elas devem optar, nas eleições deste ano, "por priorizar as doações para os partidos".
Ele defende a legalidade da doação direta: "Elas evitam que a empresa, depois, fique sendo apontada de ter doado para esse ou aquele candidato".

Doação oculta
Não por outro motivo, o Congresso aprovou mudanças na legislação em 2009 facilitando a doação direta aos partidos.
"Queriam proibir, mas esse tipo de doação é legal, o partido tem de prestar contas depois. Além disso, ela fortalece o partido e reduz o poder de alguns pequenos grupos de políticos", diz o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). Se ela fosse proibida, diz, o resultado seria "estimular o caixa dois".
Futuro presidente do PT, José Eduardo Dutra tem a mesma opinião. "A doação direta para o diretório dá mais força ao partido. Eu preferia que tivéssemos aprovado também o voto em lista e o financiamento público. Como não foi possível, pelo menos temos esse tipo de doação que fortalece as legendas."
Tanto Guerra como Dutra dizem que, pelo que ouvem dos doadores de campanha, a contribuição direta aos partidos, e não aos candidatos, será a tendência na eleição deste ano.
Líder do PT na Câmara, Cândido Vaccarezza diz que a mídia vive criticando a infidelidade partidária, mas ao mesmo tempo criminaliza um instrumento que pode acabar com ela.
"Na minha opinião, deveriam proibir contribuição para deputado. Só para partido. Você criaria mais vínculo entre o candidato e seu partido." No sistema de doação aos candidatos, Vaccarezza diz que o parlamentar acaba se transformando "num lobista do setor privado, sujeito a abordagens nem sempre republicanas", diz ele.

Debaixo dos panos
Essa tendência, porém, gera preocupação na Justiça Eleitoral. Falando em tese, o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, disse que essa doação, facilitada pelas mudanças na legislação, "dificulta, à primeira vista, a transparência".
O presidente do TSE diz, no entanto, que sua maior preocupação continua sendo o caixa dois: "[O caixa dois] costuma ser o início de toda corrupção administrativa. Porque quem financia por debaixo dos panos vai cobrar o retorno do capital por baixo dos panos", afirma.
Dutra diz acreditar que isso praticamente desapareceu das grandes campanhas: "Depois dos últimos escândalos, com gravações de vídeos com gente recebendo dinheiro, quem tiver juízo vai fugir de caixa dois". Guerra afirma que a contribuição ilegal ainda existe, mas atualmente está sendo usada mais para pagamento de comissão em operações fraudulentas: "Nas campanhas majoritárias, sinceramente, se acontece, é marginal. Nas nossas não temos".


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