São Paulo, sábado, 03 de abril de 2004

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CAMPO MINADO

Após promessa do MST de "infernizar", presidente afirma que há gente que ainda não se acostumou com a democracia

Reforma agrária não será no grito, diz Lula

GABRIELA ATHIAS
ENVIADA ESPECIAL A TRÊS LAGOAS (MS)

HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BONITO (MS)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, em Três Lagoas (MS), que a reforma agrária não será feita "no grito". Afirmou que a meta de assentar 400 mil famílias será cumprida até 2006 e mandou um recado aos líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), pedindo que eles parem de falar tanto e deixem o governo fazer sua parte.
"A reforma agrária não vai ser feita no grito dos trabalhadores ou no grito dos que são contra. Ela vai ser feita respeitando a legislação vigente e no clima de harmonia que norteia o comportamento de meu governo", disse, durante inauguração de uma termelétrica.
Em Bonito (MS), onde participou da inauguração de um aeroporto, Lula foi mais explícito na referência ao líder do MST João Pedro Stedile, que, há uma semana, disse que os sem-terra vão "infernizar" com invasão de áreas.
Sem citar Stedile, o presidente disse que "palavras, mesmo tiradas de contexto, seja de trabalhador, seja de empresário, radicalizando o processo, não ajudam, porque está cheio de gente que ainda não se acostumou com democracia e com justiça social".
Na última terça-feira, pressionado pela nova onda de invasões de terra, Lula prometeu mais do que dobrar o orçamento do Ministério do Desenvolvimento Agrário. O atual, de R$ 1,4 bilhão, receberá uma suplementação, em parcelas ao longo do ano, de R$ 1,7 bilhão, segundo o governo. O MST não acredita na liberação.
Além de ameaçar com invasões neste mês, Stedile disse que a atual reforma agrária é uma vergonha e que falta coragem ao governo. Ele recuo apenas no termo infernizar, substituído, durante depoimento à CPI da Terra, por azucrinar.
Em Três Lagoas, Lula também afirmou que nenhuma fazenda produtiva será desapropriada, e que quer provar que é possível combinar agricultura empresarial com plantações familiares. "Quero aproveitar que aqui é um Estado onde há muitos empresários do setor agrícola para dizer que nenhuma terra produtiva será mexida. Queremos provar que é plenamente possível uma boa combinação entre a agricultura empresarial e a agricultura familiar. Elas não são antagônicas. O que precisa é as pessoas pararem de falar demais e permitirem que o governo cumpra aquilo que nós assumimos de compromisso."
O presidente buscou agradar também os sem-terra, aos quais prometeu assentar 60 mil famílias em 2003, mas conseguiu só pouco mais da metade disso -36,8 mil. Lula disse ter feito questão de ir a Mato Grosso do Sul para assinar um decreto de desapropriação de duas fazendas. "Fiz questão de assinar aqui porque queria fazer um gesto tanto para os trabalhadores quanto para os empresários."
O gesto, segundo o presidente, reafirma o compromisso de fazer uma reforma agrária que dê aos assentados condições de permanecer na terra, com infra-estrutura básica, acesso a linhas de crédito e à assistência técnica. A meta é assentar 115 mil famílias neste ano -a primeira etapa do novo Plano Nacional de Reforma Agrária.
"Ao final do meu mandato, pretendo não só anunciar o cumprimento [das metas de assentamento], mas mudar de forma radical o jeito que se fez reforma agrária no Brasil. O que se fazia era jogar um monte de pobres trabalhadores no meio de uma roça sem dar a eles condições de sobrevivência."
Em Bonito, Lula disse que o aeroporto não trará danos ambientais à cidade, conhecida por seus rios de águas cristalinas. Ele se referia a reportagem da Folha, sobre pendências ambientais na obra. "Tenho certeza de que, em vez de prejudicar, [o aeroporto] vai dar a possibilidade de moças e rapazes trabalharem dignamente e viverem de seus salários."
A assessoria da Presidência informou que Lula iria dormir em Bonito, onde, provavelmente, passaria o final de semana.


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