São Paulo, Quinta-feira, 03 de Junho de 1999
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JANIO DE FREITAS
A hora do teste

Até que enfim a CPI do Judiciário chegou a um assunto interessante, que não se prende à escandalização de fatos já investigados, sobriamente, pelo Ministério Público Federal em São Paulo, como a corrupção na obra do TRT-SP, nem a um ou outro caso mais individual do que institucional. Agora a CPI está sujeita a mostrar se o seu objetivo contra o corporativismo visa só ao Judiciário ou se atinge o espírito corporativo do próprio Senado.
A situação problemática foi criada pelo senador de primeira viagem Luiz Estevão, eleito pelo PMDB do Distrito Federal. Empreiteiro, incorporador, cheio de outros negócios, Luiz Estevão vem batendo na trave há muito tempo. Pelo menos desde que, integrante do grupo Collor/PC Farias, esteve envolvido em situações estranhas como o alegado empréstimo uruguaio.
De lá para cá, foi acusado de assumir propriedade irregular de grande área, loteamento ou incorporação ilegal, sonegação de impostos, manter em Brasília a ilegal Rádio OK, em resumo. Muito rico, adepto do estilo pesado e irado, de um jeito e de outro foi sempre escapando, pelas frestas entre as acusações, dos desdobramentos piores.
O mais recente destaque do agora senador Luiz Estevão é a descoberta de envolvimento com o juiz contratante da obra para o TRT-SP, o bom pagador Nicolau dos Santos Neto, e com o bom recebedor Fábio Monteiro de Barros, dado como empreiteiro da construção. Mais de 500 telefonemas ligando Estevão aos dois já seriam comprometedores. Mas há também pelo menos US$ 2 milhões por ora descobertos, em pagamentos de Monteiro de Barros a Estevão.
Nas alegações que tem lançado, a cada lote de constatações da pasma CPI, o senador não demonstrou o pudor nem de envolver a filha, por ele dada como motivo das ligações que seriam com a filha de Monteiro de Barros. A cada nova constatação, quase todas apenas ocasionais, Luiz Estevão vem modificando as versões anteriores e já admite que teve sociedade com Monteiro de Barros e a existência de outros negócios entre ambos.
A CPI está com os cuidados de quem pisa em cacos de vidro. Trata-se de um senador, ora essa. O que parece mais estranho à gentileza senatorial é que Luiz Estevão tenha participado da concorrência para construção do TRT-SP, perdido para a Incal de Monteiro de Barros e não pedisse a anulação da disputa por evidentes ilegalidades. Cuidados de amigos, presumem certos senadores. Como são os cuidados corporativistas e os motivados por outros benefícios, de contribuições de campanha a outras assim.
A esta altura a CPI já deveria estar investigando a fundo a participação de Estevão e sua empreiteira na concorrência. No mínimo, para examinar a ocorrência, ou não, da chamada cobertura, o truque pelo qual o resultado e o preço espoliador já estão combinados, entre contratante e concorrentes, e uma ou mais empresas concorrem só para dar proposta ainda pior que a do escolhido. E cada uma tem o seu preço para isso.
A CPI está perplexa à toa. Apenas caiu em um caso no qual não tropeça no Judiciário de suas iras, mas em sua própria casa.


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