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São Paulo, quinta-feira, 03 de julho de 2003

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CONFLITO AGRÁRIO

Petista ter usado boné dos sem-terra irritou presidente da CNA

Para entidades ruralistas, Lula foi "servil" ao MST

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LONDRINA

O presidente da CNA (Confederação Nacional de Agricultura), Antônio Ernesto de Salvo, 69, disse ontem ter ficado "frustrado com a postura amistosa" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao receber lideranças do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). O que mais irritou Salvo foi o presidente ter colocado um boné do movimento.
"Colocar o boné foi uma atitude servil, não à altura de um presidente da República", disse Salvo. Segundo ele, não "se trata de discutir o mérito do que foi apresentado, mas a maneira como se desenrolou o evento, com o presidente recebendo um grupo de pessoas que está quebrando, sucessivamente, o Estado de Direito, com saques, ataques a pedágios, prédios públicos e invasões".
O presidente da CNA, que declara ter 1 milhão de associados no país, disse que o setor "produtivo" entregará aos três Poderes documento que mostra "os perigos do agravamento dos conflitos no setor agrário". Para Salvo, será "impossível impedir" que grupos ruralistas mais radicais usem armas para defender suas terras.
Segundo Salvo, Lula, ao receber o MST sem "cobrar o respeito ao Estado de Direito", teve uma atitude que "talvez encoraje novas ações do movimento".
"Não se trata de discutir o mérito da reunião, pois isso é assunto para o ministro Palocci [Fazenda], já que para assentar 1 milhão de sem-terra serão necessários mais de US$ 20 bilhões", afirmou.
No início da noite, a CNA e sete entidades de produtores rurais que representam 80% do PIB agrícola e formam o grupo "Brasil Rural" divulgaram uma nota, redigida antes do encontro no Planalto, pela qual pretenderam "denunciar a perigosa quebra dos valores constitucionais".
Segundo a nota, "a ofensiva de radicalização" de grupos como o MST "está colocando em xeque a política de conciliação nacional defendida" pelo presidente Lula.
Luiz Antonio Nabhan Garcia, 45, presidente da UDR (União Democrática Ruralista), segue no mesmo tom de crítica a Lula. "Ele [Lula] parecia bem intencionado ao falar de reforma agrária pacífica, mas cede ao conversar com quem está afrontando os poderes constitucionais e a ordem estabelecida. Parece que Lula diz uma coisa e faz outra", afirmou.
O presidente da Sociedade Rural do Paraná, Edson Neme Ruiz, 51, disse que desde abril, quando o presidente esteve em Londrina (PR) para prestigiar evento promovido pela entidade, tem procurado deixar claro que a mais influente organização ruralista do Paraná quer participar das discussões sobre a reforma agrária. "Não recebemos nenhum convite como o que foi feito ao MST, mas não abriremos mão de participar dessa discussão", disse Ruiz.
Ao contrário de outras lideranças, Ruiz disse que, ao antecipar a reunião com o MST, Lula deu sinais "de que está preocupado com a gravidade do problema e procurando uma solução". "Lula está enxergando o problema, mas nós, ruralistas, devemos deixar claro que não fomos nós que criamos o caos social no país e não podemos pagar a conta disso."
"O Lula está sempre conversando com o [Miguel] Rossetto [ministro do Desenvolvimento Agrário]. Só mudaram os nomes do MST hoje", disse Marcos Prochet, presidente da UDR Noroeste do Paraná ao comentar a reunião. Ele disse não ser surpresa "Lula receber outros integrantes do movimento, além do Rossetto, pois o Lula sempre foi nosso inimigo".
Na avaliação do presidente da Sociedade Rural Brasileira, João Sampaio, o resultado da reunião foi "frustrante". Ele disse que a meta de assentar 1 milhão de famílias é "maluquice" e pode causar uma "revolução" no campo.
Sampaio afirmou ainda que Lula tem de ser mais equânime nas suas relações e receber os ruralistas, que esperam uma audiência com ele. "Ele tem de ter coragem de dizer não e parar de querer agradar todo mundo."


Colaborou a Reportagem Local


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