São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2004

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JANIO DE FREITAS

O paiol

É uma situação exótica, esta em que proliferam notícias com acusações ou suspeições lançadas sobre altas figuras governamentais. Em suspense, o governo Lula está sem condições de assumir algum controle sobre o manancial, e nem noção tem do que essa jazida ainda seria capaz de lhe aprontar.
A convicção mais ampla e coerente situa na documentação da CPI do Banestado, de vida mais longa que qualquer outra, os dados básicos do noticiário que, entre outros alvos, atingiu duplamente o Banco Central e, agora, o Banco do Brasil. A CPI é presidida por um peessedebista, senador Antero Paes de Barros, ex-jornalista, que não se poupa quando há ocasião de investir contra adversários reais ou possíveis. À posição de presidente, Antero Paes e Barros junta a condição de integrante mais ativo da CPI, o que lhe dá a posse simultânea e vasta de documentação e informações colhidas nos depoimentos. Daí que colunistas e notícias o apontem, com freqüência, como fonte de "denúncias" originárias da CPI do Banestado. Afirmá-lo envolve certo risco. Negá-lo, também.
Mas, se é o PSDB, com toda a evidência, o maior beneficiário e utilizador das notícias que complicam o governo, disso decorre, também, uma contradição que tem exigido malabarismos das lideranças peessedebistas. Desgastar o governo, acossá-lo com a ameaça de CPI e de recurso ao Ministério Público é o papel de quem precisa ser oposição. Como, porém, as "denúncias" recaem sobre o setor econômico do governo, os peessedebistas estão divididos entre explorá-las, como oposição, e não as fortalecer, para não criar riscos à política e às pessoas de Antonio Palocci e Henrique Meirelles, apoiados pelo PSDB.
O governo está refém da utilização de explosivos provenientes de uma CPI que é um paiol. O PSDB, que dispõe do estoque de explosivos, é refém da inconveniência de seu uso. Se de uma parte os libera, de outra os esvazia, nisso produzindo espetáculos patéticos até, como o do judoca verbal Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, dando golpes contra si mesmo para logo desdizer a força que dera a alguma das "denúncias".
Subjacente ao exotismo político, há um problema bastante sério. Remessa de dinheiro ao exterior não é necessariamente ilegal. Compra de dólares em casa de câmbio, idem. E as remessas feitas por intermédio do Banestado e do processo chamado CC5 não são todas ilegais. O mesmo se pode dizer de contas no exterior. Tais ressalvas, no entanto, não parecem prevalecer em parte das notícias emanadas da CPI desde sua criação. Disso resulta perigosa confusão de conceitos pessoais, cujo risco, muito acima da imprecisão informativa, é o de injustiças, quem sabe, irreparáveis.
O Congresso está voltando à ativa, ainda que a meia pressão. Já é tempo de uma definição sobre a CPI do Banestado, que não se encerra, nem se acelera para chegar de uma vez às esperadas provas e conclusões.


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