São Paulo, terça-feira, 03 de setembro de 2002

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PRESIDENTE

Caçadoras de votos


Ao contrário de campanhas anteriores, mulheres dos candidatos entram em peso no corpo-a-corpo eleitoral


ANDRÉA MICHAEL
EM SÃO PAULO

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

As mulheres dos presidenciáveis, "candidatas" a primeira-dama, assumiram nesta campanha um papel que nunca havia sido visto antes em eleições brasileiras: trocaram seus antigos afazeres pelo contato direto com os eleitores. Nas ruas e na TV, uma ex-operária, uma atriz, uma ativista social e uma radialista tentam angariam votos para seus maridos -e passam a ser alvo das críticas que visam, ao final, os candidatos.
Caso mais emblemático desta eleição, a atriz Patrícia Pillar, 38, mulher de Ciro Gomes, reclama, por exemplo, de quem diz que, enquanto fazia quimioterapia, apareceu careca ao lado do marido para favorecê-lo eleitoralmente. "As pessoas queriam que eu me escondesse só porque estava careca?", pergunta ela.
Já a radialista Rosinha Garotinho, 39, rebate os que apontam que os filhos que adotou com seu marido sejam ingredientes de marketing político. "Eu não saí de casa para adotar ninguém", diz.
Ao contrário do marido, a ativista Monica Serra, 58, fica à vontade no contato com os eleitores, quando sai pelas ruas de São Paulo distribuindo panfletos. Chegou a gastar dez minutos tentando ganhar o voto de um único eleitor.
A ex-operária Marisa Lula da Silva, 52, aparece ao lado do marido muito mais do que nas três campanhas anteriores, mas ainda evita a imprensa e os holofotes. No dia 28 passado, por exemplo, foi a um cabeleireiro para cortar e pintar os cabelos -e só se identificou como mulher do candidato na hora de ir embora.
As quatro dizem não se assustar com as agruras da vida política e com a ausência do marido.
No caso de Rosinha, a situação é um pouco mais radical, já que ela também é candidata -ao governo do Rio. Na tumultuada agenda, seu almoço acaba espremido entre gravações e eventos públicos. O menu, que chega em uma quentinha, segue a dieta da proteína. Com oito quilos a menos, enfrenta até bife frio e duro.
Para a mulher de Serra, o desafio do mundo da política é acompanhar o hábito de seu marido de trabalhar até altas horas. "Eu sempre me espantei ao ver ele ligar para as pessoas duas, três horas da madrugada", diz. São os "amigos zumbis do Zé", como ela mesma define o marido e os amigos.
Na casa de Lula, as mudanças da vida pública não alteraram certos hábitos domésticos. No sítio da família, onde Marisa se diverte reunindo os amigos aos domingos, a TV é em preto e branco. Preocupação, para ela, é atender o telefone e filtrar as solicitações ao marido, especialmente quando ele está com os filhos.
Já Patrícia Pillar diz ter ficado reticente quando Ciro quis disputar esta eleição. "Sabia que seria um sacrifício pessoal muito grande, mas ele nasceu para isso e vive a política de forma inteira", diz.
Mas é no convívio dentro de casa que as diferenças entre os quatro candidatos emergem.
Na casa de Serra, quando o telefone toca e avisa que "o Zé" vai chegar, a primeira reação de Monica é checar o mais importante: "Será que tem iogurte, cereais e mamão?". É o momento de interromper a rotina à frente da ONG Arte Sem Fronteiras e partir para as compras, tarefa que a iguala a aspirante a primeira-dama a qualquer outra dona-de-casa. Não que ela goste de tarefas domésticas -o que mais aprecia é cuidar do jardim de sua casa.
Monica se levanta cedo, ao contrário do marido e, como ele, gosta de esticar a noite. "Mas para sair, ir ao teatro e depois jantar, eu dou uma dormidinha antes."
Se Serra gosta de mamão, Ciro "não pede nada", segundo Patrícia. Come o que tiver na geladeira e arruma a própria mala. Quando ele se aventura na cozinha, faz macarrão à bolonhesa ou ovo com arroz. "Ele é um gentleman, um cavalheiro", afirma ela.
Já na casa de Lula o prato muda de acordo com o cozinheiro. Se for Marisa, serve-se feijão tropeiro ou outro prato brasileiro. Se o "chef" for Lula, pode ser massa à carbonara, coelho ou churrasco.
Já dentro da família de Garotinho, o duelo fica fora da cozinha. Radialistas experientes, Rosinha e Garotinho são parecidos até no gosto pela fala. "É páreo duro." Mas, no temperamento, ela mesma assume: "Sou mais brava".

Admiração
É Frei Betto, amigo da família de Lula há décadas, que explica a importância da mulher para o candidato. Para isso recorre a uma fábula, que conta a história de um homem que, ao ser coroado rei, nomeou para sua corte um amigo de infância, que era um lenhador iletrado. Precisava de alguém que sempre lhe dissesse a verdade. "Marisa é o eixo do Lula", diz ele.
Monica Serra, doutora em psicologia, rebate uma característica conferida ao candidato por amigos e inimigos. Metódico? "Em casa, quando ele vai para o banho, você pode segui-lo pela fila de roupas que deixa", afirma. Ela também não concorda que o marido tome muitos remédios. "Só para azia, porque ele teve hérnia de hiato. E por isso não come nada com cebola nem alho. Não é chatice. Faz mal para ele."
Há cinco anos com Ciro, Patrícia aposta no apoio que pode dar para ele na TV. "Tenho intimidade com as câmeras e só falo o que acredito". Difícil é discursar no palanque: "Fico vermelha".
Quem não tem a menor vergonha de discursar diante dos eleitores é Rosinha. Nos comícios, relembrando os tempos de namoro com Garotinho, entoa estrofes da música "Pôxa", incentivada por Elymar Santos, contratado para sua campanha. Capricha no trecho que o então namorado cantava para ela quando reatavam depois de algum rompimento: "Eu te falei/ Que você não ficava nem uma semana/ Longe desse poeta que tanto te ama/ Longe da batucada e do meu amor".



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