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Cadastro de terras indica concentração na Amazônia
11% dos posseiros se dizem donos de mais de metade das áreas registradas
Coordenador do programa discorda e diz que "cadastro mostra como protagonista esse cidadão [o pequeno proprietário]" antes "invisível"
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM
MATHEUS PICHONELLI
DA AGÊNCIA FOLHA
Dados compilados pelo Terra
Legal, programa federal de regularização fundiária na Amazônia, apontaram concentração desigual de terras na região.
Lançado há mais de dois meses, o Terra Legal está cadastrando quem ocupa terras públicas e afirma ter direito de receber o título da propriedade. A
ideia é aumentar o controle estatal sobre essas áreas.
Mais da metade das áreas cadastradas (1 milhão de hectares) está nas mãos de 11% dos
mais de 6.000 posseiros que
procuraram o governo. Considerando-se os 11%, cada posseiro tem, em média, 772 hectares.
Como as regras do Terra Legal permitem que o título seja
dado na maior parte das vezes
com base apenas na declaração
de posse, a maioria deve conseguir a documentação -que
possibilitará, por exemplo,
acesso a crédito bancário.
Em julho, na época da aprovação da medida provisória 458
-apelidada de "MP da Grilagem" e que criou o arcabouço
jurídico do Terra Legal-, ambientalistas diziam que a aceleração da titulação de áreas públicas na Amazônia consolidaria a desigualdade fundiária.
"A concentração nasceu não
pelo mercado, mas pela truculência", disse Paulo Barreto, da
ONG Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da
Amazônia), que analisou os dados a pedido da Folha.
Para Roberto Smeraldi, diretor da Oscip Amigos da Terra
-Amazônia Brasileira, o programa torna "permanente" essa concentração territorial.
"Parece que não se considerou a estrutura fundiária quando se pensou na regularização.
Ou, se foi pensado, foi na linha
de ratificar, não de alterar."
Smeraldi prevê que os pequenos proprietários, maioria
dos cadastrados (88%), serão
pressionados e não terão segurança para se fixar na terra.
"Essa valorização que a titulação oferece vai permitir que a
terra seja comercializada. Em
vez de estimular a fixação, eles
vão se capitalizar e procurar
outras terras", disse ele.
Carlos Guedes, coordenador-geral do Terra Legal, vê os
dados de maneira positiva.
"Tinha senador que dizia que
80% das terras estariam nas
mãos de 10% dos cadastrados
[à época da votação da MP]. O
cadastro mostra como protagonista esse cidadão amazônico
[pequeno proprietário] que até
hoje estava invisível", disse.
"É uma falácia, um argumento ideológico, dizer que os imóveis podem ser objeto de concentração fundiária", afirmou.
Ele disse que só serão beneficiadas as terras com até 15 módulos fiscais (cerca de 1.140
hectares). Por serem consideradas pequenas e médias, elas
não poderiam ser destinadas
para a reforma agrária.
"As disputas pela posse, o
desmatamento e o uso de trabalho escravo não se concentraram nesse tipo de imóvel",
disse. Além disso, afirmou que,
com a regularização, será possível saber "quem tem um projeto produtivo e quem cumpre
com sua função social".
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