São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2005

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SALÁRIO MÁXIMO

Senador barrou tentativa de reajuste sem votação nas Casas

Após derrota, Severino acusa Renan de tentar se promover

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um dia depois de sofrer sua primeira grande derrota no comando da Câmara, o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) e seus aliados mais próximos dispararam críticas contra o Senado e o seu presidente, Renan Calheiros (PMDB-AL), que foi acusado de tentar se promover politicamente em cima do episódio.
"Ele pode precisar disso [imagem de "bonzinho'], eu não preciso", disse Severino, em tom irritado, referindo-se ao naufrágio do seu grande projeto após 17 dias como presidente: reajustar o salário de parlamentares.
Pressionado pelos líderes partidários no Senado, Renan se recusou a assinar o ato administrativo defendido por Severino que elevaria com uma canetada o salário dos 594 congressistas em 48,8%, de R$ 12.847 para R$ 19.115.
Publicamente, aliados de Severino afirmam que a relação será recomposta, "para o bem do país", mas reservadamente dizem que o clima é de revanche.
Severino, ontem, se mostrou decepcionado. "Cada um tem sua maneira de agir. Eu respeito os outros, eu não agiria assim como ele fez", afirmou o presidente da Câmara, que se encontrou ainda na noite de anteontem com Renan em um jantar da bancada alagoana, em Brasília.
O senador se defendeu ontem: "Qualquer solução tem que ser encaminhada de comum acordo. Não dá para o Senado empurrar nada goela abaixo da Câmara nem vice-versa", disse, negando tentativa de autopromoção.
"Esse é um assunto encerrado porque parece de difícil aprovação, inclusive na Câmara", afirmou, ressalvando que pretende buscar uma convivência harmoniosa com a Câmara.
A maior irritação dos deputados se dá porque, segundo eles, a notícia de que o Senado não avalizaria o acordo se deu em entrevista de Renan, que não teria alertado com antecedência Severino. "Trataram a Câmara como o esgoto da política", disse o líder do PP, José Janene (PR).
Horas antes da entrevista de Renan, ele havia sido procurado em sua casa por Severino e o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim. Os dois queriam assegurar o apoio do Senado para selar o reajuste, mas Renan disse que só daria resposta após consultar senadores.
"Foi uma surpresa para a Casa a forma como ele [Renan] reagiu. Ele acabou saindo como o "bonzinho" da história", afirmou Ciro Nogueira (PP-PI), 2º vice-presidente da Câmara.
A insatisfação levou os deputados ligados a Severino a cobrar "isonomia" com os senadores, que teriam privilégios em número superior aos da Câmara.
"Os deputados vivem em desvantagem enorme. Tudo aqui na Câmara é limitado, vivemos na pindaíba; no Senado, tudo é ilimitado", disse João Caldas (PL-AL), 4º secretário da Câmara.
O argumento de Caldas e de outros deputados é que os orçamentos da Câmara e do Senado são quase iguais, apesar de a Câmara ter 513 parlamentares enquanto o Senado tem 81. Por esse raciocínio (orçamento dividido por parlamentar), o custo do congressista para os cofres públicos ficaria cinco vezes mais caro no Senado (R$ 29,9 milhões/ano) do que na Câmara (R$ 4,83 milhões/ ano).
Severino buscou o apoio de Renan para o aumento de 48% depois de não conseguir apoio entre os partidos, na Câmara, para bancar um projeto que elevaria em 67% os salários dos congressistas.
Ontem, ele confirmou o que já havia anunciado publicamente na véspera. "Está encerrado, não vou mais abordar esse assunto."
Não descartou, no entanto, retomar a idéia futuramente: "Não sei, não posso prever o que vai acontecer daqui a um ano, tenho que agir com ponderação. Não posso satisfazer meu ímpeto".
"O momento não é de aumentar salário nem verba de gabinete. Respeitamos o servidor público, que teve um reajuste de 0,1%, que não é simbólico, é cínico. Talvez seja cinicamente simbólico", afirmou o senador Arthur Virgílio (AM), líder do PSDB.

Lista triturada
A misteriosa lista de deputados federais que assinaram o pedido de regime de urgência para o aumento dos salários dos parlamentares foi triturada, para assegurar que jamais venha a público. "Jogar no lixo era muito arriscado, então foi para o triturador de papel, para garantir que o assunto morreu", disse Ciro Nogueira, responsável por coletar as 257 assinaturas necessárias.
Anteontem à noite, após Severino ter desistido do assunto, Ciro começou a receber chamados de parlamentares preocupados pois haviam colocado o nome na lista. Havia então 175 assinaturas.
Na presença de três parlamentares, que ele não nomeou, a lista foi colocada em um triturador de papel em seu gabinete.
No passado, já houve problemas com listas no Congresso. A mais célebre foi a da cassação do senador Luiz Estevão, em 2000, quando uma lista com os votos dos senadores no painel eletrônico foi feita ilegalmente. Apesar de a lista nunca ter aparecido, houve a suspeita de que a senadora Heloisa Helena, então no PT, teria votado contra a cassação, o que ela sempre negou.
(FÁBIO ZANINI, FERNANDA KRAKOVICS E RANIER BRAGON)

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