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QUESTÃO INDÍGENA
Desnutrição atinge 23% de 860 crianças em aldeia do MS
Mutirão tenta salvar 198 crianças índias desnutridas
HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM JAPORÃ (MS)
Uma equipe da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) começou
ontem um mutirão na aldeia de
Porto Lindo, no município de Japorã (464 km de Campo Grande),
para socorrer 198 crianças índias
desnutridas menores de cinco
anos de idade.
Segundo a Funasa, 23% de 860
crianças estão desnutridas, sendo
que 98 delas apresentam desnutrição grave e cem apresentam a
do tipo moderada. A média nas
aldeias de Mato Grosso do Sul é
de 12%. Diante da situação, foi
montada uma operação de emergência pela equipe local da Funasa em Japorã.
Neste ano, seis crianças morreram na aldeia e uma nasceu morta. Nos atestados de óbito arquivados no posto da Funai (Fundação Nacional do Índio), dentro da
aldeia, constam como causas da
morte doenças com pneumonia,
desidratação e diarréia.
O médico da Funasa, Luiz Fernando Ribeiro, 57, disse que a
desnutrição pode ser entendida
como um dos principais fatores
que causaram as mortes, pois diminuiu a defesa de crianças contra doenças.
A assessoria da Funasa em Brasília disse ontem que apenas duas
mortes de crianças em Japorã foram realmente causadas pela desnutrição. Anteontem, os prefeitos
de Japorã, Rubens Marinho (PT),
e de Iguatemi (cidade vizinha), Lídio Ledesma (PDT), disseram ter
recebido informação de técnicos
da Funasa local de que as seis
crianças morreram desnutridas.
Ribeiro, acompanhado de uma
enfermeira, uma auxiliar e agentes de saúde, pesava ontem crianças menores na casa de reza em
uma área dentro da aldeia.
Na estrutura coberta de sapé, a
equipe usava um saco para levantar cada criança, pesá-la, depois
medir a altura e comparar os dados com a idade.
A índia guarani Cássia Ramires,
de um ano e um mês de idade, foi
encaminhada após a pesagem direto ao hospital de Iguatemi. Ela
pesava apenas 6,5 kg, mas deveria
ter, segundo Ribeiro, ao menos
9,5 kg.
O pai, o índio guarani Bonifácio
Ramires, 66, disse que a criança
teve diarréia e vômito há uma semana. "Ela não quer comer de jeito nenhum", disse Ramires. Em
uma semana, a criança perdeu
500 gramas. Foi o segundo caso
grave encaminhado para internação durante o mutirão.
Ramires nega que a criança passe fome. "Eu tenho minha aposentadoria. Graças a Deus, tem o
que comer", afirmou o índio.
"Na minha opinião, a desnutrição é a falta de atenção do governo com o índio", afirma o capitão
(líder máximo) da aldeia Porto
Lindo, o guarani Vanderlei Pedro
Gonçalves, 30.
Segundo ele, o principal problema na aldeia é a falta de terra para
plantar. São cerca de 4.300 índios
"das etnias guaranis e caiuás", como define o capitão, em apenas
1.700 hectares
Em dois anos, a população quase dobrou na aldeia. Vieram índios do Paraguai, afirmou Gonçalves. Segundo o agente de saúde
da Funasa, o guarani Agripino
Lopes, 32, os índios paraguaios
não têm assistência médica e atravessam a fronteira.
"A gente não tem como cobrar
do nosso povo plantação, se não
tem terra", disse Lopes.
"É preciso estrutura nos órgãos
[públicos]. Esse Fome Zero [Indígena] disse que vinham pintinhos
em outubro. Chegaram no dia 27
passado. Mandaram 150 para
3.400 índios, mas a metade morreu", afirmou Gonçalves.
Gonçalves e Lopes afirmam ainda que as sementes do Fome Zero
para agricultura chegam atrasadas, fora da época de plantio, à aldeia. O governo de Mato Grosso
do Sul, responsável pelo programa com uma verba de R$ 5 milhões do MDS (Ministério de Desenvolvimento Social), diz que as
licitações atrasam a compra e entrega de sementes.
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