São Paulo, domingo, 04 de março de 2007 |
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ELIO GASPARI A reforma da OAB é um rodízio de carnes
É direito de todo cidadão propor o que bem entende e a Ordem pode defender aquilo que achar melhor a respeito do que quiser. Não se deve, contudo, supor que tenha representatividade para fazê-lo. Alguns bons momentos da história do Brasil tiveram advogados como protagonistas. Os piores também. A Constituição de 1937 e o preâmbulo do Ato Institucional de 1964 foram escritos pelo doutor Francisco Campos. O AI-5 foi obra do professor Gama e Silva, ex-diretor da Faculdade de Direito de São Paulo. O braço da Ordem dos Advogados é forte e respeitável quando ela se manifesta sobre a constitucionalidade de uma iniciativa, ou diante de um cafuné golpista (a miniConstituinte sugerida por Nosso Guia no ano passado). Nos anos 70, Raymundo Faoro presidiu a Ordem e liderou a campanha pelo restabelecimento do habeas-corpus, defendendo um princípio incontroverso do direito. Nessa época de ouro, a OAB confundiu-se com a restauração da liberdade. Não propôs micromudanças da simpatia de Faoro ou de seus dirigentes estaduais. Indo ao varejo, ela vira barraca de verduras. O tamanho do mandato dos senadores ou a forma de financiamento das campanhas eleitorais nada têm a ver com os grandes princípios do direito e da democracia. Muito menos a transferência para as centrais sindicais da prerrogativa dos cidadãos de requerer a convocação de um plebiscito. Se a CUT pode ter o direito de patrocinar a iniciativa em nome de 7,4 milhões de trabalhadores, por que não o Flamengo, com o grito da sua torcida, estimada em 35 milhões de pessoas? O flamenguista torce pelo time porque tomou essa decisão e pode revogá-la quando bem entender. Já os trabalhadores das carteiras da CUT ou da CGT, estão atrelados às centrais por decisão de coletivos sindicais, tomadas em assembléias que geralmente não reúnem 10% dos representados. Essa proposta da OAB chega com 73 anos de atraso. Iria bem nos debates da Constituição corporativa de 1934. Com mais de meio século de devoção e eterno respeito à Ordem, o advogado Célio Borja (50 anos de magistério do Direito, 16 de Câmara dos Deputados, ex-ministro da Justiça e ex-ministro do Supremo Tribunal Federal) argumenta: "A Ordem não representa os advogados quando faz propostas pontuais a respeito das quais podemos, ou não, estar de acordo." UMA LINDA VISITA À ABOLIÇÃO BAIANA Há um grande livro na praça. É "Encruzilhadas da liberdade" (Editora da
Unicamp), de Walter Fraga Filho, professor da Universidade do Estado da
Bahia. Conta a vida dos escravos e de
seus senhores na região do Recôncavo
antes e depois da Abolição. Fraga foi
aos inventários, registros policiais, notícias da imprensa, correspondências
de escravocratas e tradições orais. Misturou tudo com a alma de quem vivia a
época e saiu com uma obra que coloca
o leitor na cena dos interesses, sofrimentos e alegrias dos baianos de outrora. Sua descrição do 13 de maio em
Salvador parece saída de uma página
de Jorge Amado. A multidão sambando atrás das bandas, o trio elétrico da
época. Nela, estava o "Macaco Beleza",
um conhecido da polícia: "Homem cor
de bronze, de estatura hercúlea, disposto à luta corpórea, sem instrução,
porém sempre pronto a impugnar com
ousadia e inteligência as opiniões dos
contrários." Quando Salvador cantava
a Abolição, "Macaco Beleza" foi visto
calado, chorando.
COLLOR 1, PSDB 0
BEBIAM SABÃO |
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