São Paulo, terça-feira, 04 de abril de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

QUESTÃO AGRÁRIA
José Rainha volta a afirmar que não estava no local do crime; sem-terra mentiu sobre processo
Julgamento atrai Anistia e protestos

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
O líder sem-terra José Rainha, que está sendo julgado no ES


FERNANDA DA ESCÓSSIA
enviada especial a Vitória (ES)

Sob observação de entidades internacionais e protestos dos sem-terra, começou ontem no fórum de Vitória o julgamento do líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) José Rainha Júnior, 39.
Rainha é acusado de co-autoria pelas mortes do fazendeiro José Machado Neto e do soldado PM Sérgio Narciso, em junho de 1989, durante a ocupação da fazenda Ypuera, propriedade de Machado, em Pedro Canário, no norte capixaba.
Rainha voltou a negar ontem as acusações e disse que, à época do crime, estava no Ceará. Quatro testemunhas confirmam sua versão. A defesa fez ler em plenário uma declaração do governador do Ceará, Tasso Jereissati, atestando que esteve com Rainha no dia 31 de maio, em Fortaleza.
Em 1997, Rainha foi julgado e condenado a 26 anos e seis meses de prisão, com direito a novo júri.
Observadores da Anistia Internacional acompanharam o primeiro dia de julgamento para exigir imparcialidade. Para a Anistia, Rainha é "um preso de consciência em potencial", segundo Julia Rochester, pesquisadora da entidade no Brasil.
"Ficou claro que, no primeiro julgamento, não houve provas de sua culpa. Ele foi condenado injustamente. Se isso se repetir, Rainha será considerado um preso de consciência", disse Rochester.
Logo no início do julgamento, ao ser interrogado pelo juiz, Rainha cometeu um erro que poderá abalar a confiança dos jurados nele: disse que nunca foi processado. Rainha já havia sido processado por ocupações de terra no Pontal do Paranapanema, base do MST em São Paulo. Um dos advogados de defesa, Luiz Eduardo Greenhalgh, perguntou a ele por que dera aquela resposta. "Ele disse que não entendeu bem a pergunta", afirmou Greenhalgh.
A acusação irá explorar o fato para acusar Rainha de mentiroso. Um dos assistentes, Marco Antônio Gomes, levou um pequeno boneco Pinóquio -personagem infantil cujo nariz crescia quando dizia uma mentira- para o plenário. O julgamento foi suspenso no início da noite de ontem e deve recomeçar hoje pela manhã.
A acusação promete levar para o plenário três testemunhas que faltaram ao primeiro julgamento. A mais importante é José Jorge Guimarães, o Zé do Coco, que diz ter visto Rainha na fazenda invadida. Gomes afirmou que a testemunha tem recebido ameaças de morte e que foi incluída no programa de proteção à testemunha do Espírito Santo.
O advogado que comanda a defesa de Rainha, o ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Evandro Lins e Silva, 88, disse que considera o caso de Rainha "facílimo" e vai alegar que seu cliente não poderia estar em dois lugares -no Ceará e no Espírito Santo- ao mesmo tempo. "Ele não é Deus, não tem o dom da ubiqüidade", afirmou Lins e Silva.
O julgamento de Rainha marca a volta de Lins e Silva ao tribunal do júri. Sua última atuação foi em 1979, como advogado de Doca Street, acusado pelo assassinato da socialite Angela Diniz.


Texto Anterior: Viagem presidencial: FHC busca aproximação entre América Central e Mercosul
Próximo Texto: Memória: Maluf evitou golpe, diz ministro
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.